/ Apr 20, 2025

Os EUA são perdedores no comércio global, como afirma Trump? – 10/04/2025 – Bráulio Borges

A política tarifária que vem sendo praticada pelo atual governo dos EUA, liderado por Donald Trump, tem gerado muita volatilidade dos preços dos ativos financeiros e impulsionou a incerteza política/econômica para níveis superiores àqueles observados no começo da pandemia, como explorei em artigo anterior neste espaço.

Embora não seja exatamente uma surpresa —Trump vinha anunciando isso desde a campanha eleitoral—, há alguns aspectos que têm chocado os analistas. Entre eles estão a ideia sem sentido de que os EUA teriam que zerar os déficits comerciais com cada um dos seus parceiros comerciais (e não atuar para reduzir o déficit agregado) e a proposição de tarifas amparadas em uma fórmula “maluca”. Esta ideia é bem distante da que vinha sendo aventada, de tarifas recíprocas (isto é, os EUA praticarem tarifas efetivas de importação, levando em conta alíquotas médias ponderadas e também barreiras não tarifárias, semelhantes àquelas praticadas pelos demais países nas relações bilaterais).

Entretanto, é preciso dar um passo atrás e questionar a própria motivação para essa guerra tarifária. Trump e sua equipe afirmam categoricamente que os EUA, ao registrarem déficits comerciais com o resto do mundo, são perdedores e foram explorados pelos demais países nas relações de trocas comerciais de bens (curiosamente, estão silentes sobre os serviços, onde os EUA registram um superávit comercial expressivo). Contudo, o diagnóstico da equipe de Trump não encontra respaldo nos estudos.

Considerando alguns trabalhos relativamente recentes (Costinot & Rodrguez-Clare 2018 e Hufbauer & Hogan 2023), estima-se que os ganhos líquidos dos EUA com o comércio internacional equivalham a algo entre 2% e 10% do PIB atual —ou seja, entre US$ 600 bilhões e US$ 3 trilhões. São vários os canais de transmissão, como acesso a produtos mais baratos, aumento da concorrência nos mercados locais (gerando impulso à inovação) e acesso a novas tecnologias, entre outros.

Isso não quer dizer que não tenha havido efeitos colaterais negativos, já que nem todos os norte-americanos ganharam com a chamada “globalização”: aqueles que trabalhavam em empregos na manufatura acabaram sofrendo com o deslocamento de diversas fábricas para outros países. A miopia quanto a esses efeitos negativos, aliás, reflete o fato de que, durante bastante tempo, a economia “mainstream” (incluindo o Reagonomics) ignorou solenemente questões de ordem distributiva.

Embora algumas “novas” preocupações sejam pertinentes (como segurança nacional e energética), a forma de lidar com os efeitos negativos e com essas preocupações não é revertendo totalmente os ganhos de comércio (liquidamente positivos), mas sim introduzindo novas políticas, como medidas compensatórias para lidar com os efeitos colaterais negativos.

Um bom exemplo vem dos países europeus nórdicos: além de terem uma rede de seguridade social bastante abrangente (nos EUA ela é mínima), eles investem volumes expressivos de recursos na requalificação da mão de obra. Enquanto a Dinamarca investe todos os anos cerca de 2% do PIB nesse tipo de ação (conhecidas como “Active Labor Market Policies”, em contraponto às políticas passivas, como seguro-desemprego), os EUA aplicam apenas 0,1%.

O modelo de “flexicuridade” (combinação de flexibilidade com seguridade) dos nórdicos, aliás, deveria inspirar o mundo todo nesse contexto de rápidas mudanças nas relações de trabalho (com aumento da chamada gig economy) e de ameaças crescentes geradas pela automação e pela inteligência artificial em vários segmentos.


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