/ Apr 15, 2025

Brasil pode se tornar alvo colateral da guerra EUA-China – 11/04/2025 – Igor Patrick

Com a escalada tarifária imposta por Donald Trump —que elevou as barreiras sobre produtos chineses a patamares superiores a 145%— o governo dos Estados Unidos parece mirar um alvo externo, mas acerta, com força e imprevisibilidade, o coração do sistema comercial global. Isso porque para a China, o impacto mais imediato não será inflação, mas sim o aprofundamento de uma tendência já crônica: a deflação industrial.

E é justamente essa deflação, alimentada por sobrecapacidade produtiva e retração da demanda interna, que pode resultar em um efeito colateral inquietante para países como o Brasil. Uma avalanche de produtos a preços irrecusáveis, mas com efeitos devastadores para a indústria local pode estar prestes a inundar mercados emergentes.

O cenário interno da China é revelador. Em 2024, enquanto o PIB cresceu 5%, o índice de preços ao produtor caiu 2,2%, e o índice de preços ao consumidor teve alta de apenas 0,2%, sinal de um mercado doméstico desaquecido. O país ainda lida com uma crise imobiliária persistente, desemprego elevado entre jovens e uma população que consome menos.

Para manter o motor econômico em rotação, Pequim voltou-se à sua vocação exportadora —agora impulsionada por pesados investimentos industriais. Foram US$ 1,9 trilhão em crédito estatal para modernizar fábricas, robotizar linhas de produção e expandir ainda mais sua já monumental capacidade manufatureira.

Mas com o mercado americano praticamente fechado (e barreiras comerciais também na União Europeia), essa produção excedente precisa de novos destinos. E eles estão sendo encontrados em mercados com menos defesas estruturais, como no Brasil.

Como reportou a Folha nesta semana, antes mesmo da plena vigência das novas tarifas, as importações brasileiras de calçados chineses cresceram 51,7% em março na comparação com o ano anterior. Entidades industriais falam abertamente em invasão e temem um colapso silencioso de setores inteiros, incapazes de competir com produtos que chegam a preços artificialmente deprimidos.

O risco é estrutural. A China já responde por cerca de 32% da produção industrial global —mais do que a soma de Estados Unidos, Alemanha, Japão, Coreia do Sul e Reino Unido. Com esse volume sendo redirecionado para mercados alternativos, o Brasil pode se tornar o próximo grande campo de pressão de uma guerra que não iniciou, mas da qual dificilmente escapará ileso.

A resposta brasileira, no entanto, exige mais que indignação pontual. Medidas antidumping são lentas e litigiosas. Cotas de importação são eficazes, mas politicamente sensíveis. O desafio é construir um equilíbrio delicado entre a necessidade de proteger setores vulneráveis e a urgência de não recair no isolacionismo. Como já alertam economistas, há risco real de que um protecionismo mal calibrado comprometa a já frágil inserção internacional do Brasil.

O país precisa de agilidade regulatória, diplomacia econômica assertiva e um sistema de defesa comercial modernizado. Mais do que isso, precisa de visão estratégica. A desova de manufaturados chineses não é um evento episódico, mas sim um desdobramento lógico de uma reorganização estrutural da economia global. Ignorá-la seria um erro histórico.


LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

Notícias Recentes

Travel News

Lifestyle News

Fashion News

Copyright 2025 Expressa Noticias – Todos os direitos reservados.