/ Apr 13, 2025

Guerra tarifária reduz produtividade e crescimento – 12/04/2025 – Marcos Lisboa

A guerra de tarifas iniciada pelo governo Trump será prejudicial para a economia global e, em particular, para os próprios Estados Unidos.

O governo defende que as tarifas irão aumentar a arrecadação, reduzindo o imenso déficit fiscal norte-americano. Além disso, elas incentivariam o retorno de atividades industriais para os EUA, na expectativa de recuperação do emprego fabril.

A reação imediata nos mercados foi uma significativa desvalorização das empresas, prejudicando a sua capacidade de investimento. Além disso, as tarifas significam preços mais altos dos insumos utilizados na produção, assim como de bens de consumo.

No seu mandato anterior, Trump já havia realizado uma guerra tarifária, ainda que numa escala bem menor. Foram diversos anúncios, em particular com relação à China, aos quais se seguiram retaliações.

Em estudo recente, “Trade Protection, Stock-Market Returns, and Walfare”, Amiti, Gomez, Kong e Weinstein propõem uma abordagem inovadora, e tecnicamente cuidadosa, para avaliar alguns desdobramentos da primeira guerra tarifária de Trump. Eles analisam o impacto dos anúncios das medidas sobre o valor de mercado e a geração de fluxo de caixa das empresas.

O resultado é uma queda no valor das empresas de 6,7% na sequência imediata dos anúncios, sendo 3,1% decorrentes de maior prêmio de risco requerido pelos investidores.

O estudo avalia o impacto na sociedade com base em um índice de consumo. Os dados indicam uma queda de 3% no bem-estar nos EUA em decorrência da guerra tarifária no primeiro mandato de Trump.

Frequentemente, minimiza-se o impacto do aumento de tarifas, ou de outras intervenções setoriais, pois seu efeito direto não costuma ter valor elevado. Por essa razão, durante muito tempo, esse tema não era usual na pesquisa sobre produtividade e crescimento econômico.

O problema é que o impacto dessas distorções vai além dos seus efeitos diretos. Aumentos de tarifas têm efeitos defasados nos mercados. Eles afetam o custo relativo dos diversos insumos, bens e serviços. Como consequência, as empresas reavaliam suas decisões de produção.

Nas últimas décadas, modelos tecnicamente mais sofisticados e novas bases de dados têm permitido estimar esses impactos indiretos. E o quadro que surge é bem diferente.

A razão é intuitiva. Uma distorção no setor de energia, por exemplo, afeta os demais setores. Uma tarifa maior na importação de insumos afeta as atividades à frente na cadeia produtiva. Proteger o setor de aço ou alumínio penaliza diversas outras atividades.

Baqaee e Farhi mostram, por exemplo, que o choque do petróleo teve um impacto três vezes maior do que se estimava anteriormente, em artigo publicado na Econometrica, “The Macroeconomic Impact of Microeconomic Shocks”.

Os autores também estimam que a expansão relativa de setores pouco eficientes resultou em uma queda de 20% da produtividade total da economia americana entre 1948 e 2014.

Não deveria surpreender. Nas últimas duas décadas, seguidas pesquisas com dados desagregados têm apontado a redução do crescimento econômico decorrente de distorções que protegem empresas pouco produtivas, em detrimento das mais eficientes.

As pesquisas identificam a relevância dessas distorções para explicar a diferença da produtividade entre países pobres e ricos.

Os resultados tornam surpreendente a opção americana. A evidência tem sido de pouca valia.

Desde o começo do século passado, houve uma mudança geográfica significativa em diversos processos de produção. A impressionante queda do custo de transporte e de comunicação, aliada ao aumento do preço da terra urbana, levou ao fatiamento de estruturas produtivas até então concentradas em uma mesma localidade.

Atividades de inovação e gestão estratégica permaneceram nas regiões com mão de obra mais qualificada. Etapas mais mecânicas, fabris, se deslocaram para regiões com menores custos de produção, como salários ou tributos.

A expansão do comércio mundial permitiu que as empresas adquirissem componentes onde a tecnologia fosse mais eficiente. Pedro Doria ilustrou esse fenômeno descrevendo aspectos da produção do iPhone na sua coluna em O Globo do dia 8.

Esse processo contribuiu para o notável crescimento das últimas décadas nos Estados Unidos, na Europa e no Sudeste da Ásia. Boa parte das atividades inovadoras, com maior valor adicionado, está no setor de serviços, área que os EUA lideram no comércio mundial.

Esse crescimento, porém, não foi uniforme nos EUA. Entre os anos 1980 e a década passada, as novas tecnologias beneficiaram desproporcionalmente os adultos com curso superior, em detrimento dos grupos com ensino médio. O país cresce, mas uma parcela expressiva da mão de obra, menos educada, ficou para trás.

Mesmo com a volta das fábricas, a geração de emprego será muito inferior ao de décadas atrás em razão da automação. O problema é de outra natureza, e outras deveriam ser as respostas da política pública.

A proposta de tarifas retaliatórias dos EUA surpreendeu pelo descuido da técnica. Déficit comercial em uma relação bilateral não significa existência de distorções. Eu tenho déficit com os restaurantes que frequento, e tenho superávit com quem contrata meus serviços.

As idas e vindas do governo Trump prejudicam a economia. A insegurança sobre as regras de tarifas e a possível desorganização das cadeias globais de produção desestimulam o investimento, reduzem a produtividade e comprometem o crescimento.

O aumento das tarifas significa que os EUA optam por incentivar o que produzem com menos eficiência do que outros países, em detrimento do que os norte-americanos fazem de melhor.

O risco de desaceleração severa da economia dos EUA não caiu de paraquedas, como na Covid, nem foi o resultado de uma sequência inesperada de problemas acumulados, como na crise de 2008.

A estroinice da política norte-americana pode levar muitos países a escolher outro centro de gravidade para organizar as regras do comércio multilateral.

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