/ Apr 13, 2025

O papel do dólar e o erro de diagnóstico de Trump – 12/04/2025 – Samuel Pessôa

Um dos pilares do diagnóstico que sustenta a trumpnomics é que o papel dos EUA na emissão dos títulos de dívida soberana, que são vistos pelos investidores internacionais como porto seguro, tem sido muito custoso para a indústria manufatureira americana.

Em razão da demanda cativa pelos títulos da dívida soberana americana, o câmbio, em equilíbrio, seria anormalmente valorizado. A consequência seria uma dificuldade na competitividade da indústria manufatureira.

De fato, nos últimos 15 anos a média dos déficits da balança comercial de bens foi de 4,3% do PIB. Somente em bens duráveis, o déficit, para a média dos últimos 15 anos, foi de 2,9% do PIB. Poderia parecer que o consultor de Trump para Comércio e Indústria, Peter Navarro, tem razão. Não é o caso.

A balança de comércio de serviços é superavitária em 1,2% do PIB, e a balança de rendas, que consolida juros e dividendos, é superavitária em 1,1% do PIB. Quando consolidamos o resultado das transações entre residentes e não residentes, temos um déficit de 2,7% do PIB. Sempre considerando a média do saldo anual para os últimos 15 anos.

Mas o que sustenta um déficit permanente na casa de 2,7% do PIB? Por que as forças de mercado não fazem com que o déficit desapareça? Segundo os membros da equipe econômica de Trump, esse desequilíbrio deve-se ao papel especial dos EUA de emitir o título de dívida soberana mais seguro do mundo. Como vimos no segundo parágrafo, a indústria de transformação seria a grande perdedora.

A análise da equipe econômica não está correta. Nas últimas décadas, os EUA têm perdido esse papel especial. Basta observar que os juros nos EUA são superiores aos da Europa, do Reino Unido, do Japão e da China.

Adicionalmente, se um investidor comprar um título de dívida do Tesouro francês, por exemplo, e no vencimento do contrato converter em dólares nos EUA, não ganhará mais do que investir em títulos do Tesouro americano.

Entre os países do G10, é satisfeita a paridade coberta da taxa de juros. Não há nada muito especial com os títulos do Tesouro americano, que hoje já se financia com juros maiores do que a Grécia.

Por que motivo a economia americana apresenta juros elevados em comparação aos demais países do G10? Simplesmente porque a taxa de crescimento da produtividade do trabalho é maior. E, adicionalmente, os EUA apresentam a melhor demografia entre os países ricos.

O maior crescimento justifica o déficit de 2,7% do PIB. A Austrália é um caso análogo com déficits externos médios, nas últimas quatro décadas, ainda maiores.

Os déficits de 4,3% do PIB na balança comercial de bens são um lado da moeda cujo outro lado tem: o maior crescimento, que justifica um déficit externo de 2,7% do PIB; o saldo positivo na balança comercial de serviços; e o saldo positivo da balança de rendas.

Ou seja, os elevados déficits na balança comercial de bens são a contrapartida do elevado crescimento da produtividade, da demografia favorável, das vantagens comparativas nos serviços de elevada tecnologia, consequência do Vale do Silício, e, finalmente, da vantagem comparativa de Wall Street na intermediação financeira do mundo, que gera o balanço de rendas superavitário.

Talvez as desastradas medidas de Trump consigam fazer dos EUA uma região de baixo crescimento, como é o caso da União Europeia e do Reino Unido, e, com isso, reduzir o déficit da balança de mercadorias.


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