/ Apr 19, 2025

A ousadia de Milei: normalizar a economia argentina – 16/04/2025 – Mercado

“Em vez de falar em crescimento ao ritmo chinês, o mundo em breve estará falando em crescimento ao ritmo argentino”, disse o presidente argentino Javier Milei na televisão, na última sexta-feira (11). Seu ministro da Economia havia acabado de delinear um programa de US$ 20 bilhões (R$ 117,8 bilhões) com o FMI (Fundo Monetário Internacional), uma redução nos controles de capital e uma mudança para uma taxa de câmbio mais flexível.

No entanto, nem todos na Argentina estão felizes. Na quinta-feira (10), logo após a notícia do acordo com o FMI, uma greve geral contra os cortes de gastos de Milei paralisou o país. O Aeroporto Jorge Newbery, em Buenos Aires, ficou vazio. Trens e metrôs estavam silenciosos. Lixo não coletado apodrecia nas ruas.

Muitos dos 22 programas anteriores do FMI para a Argentina terminaram em desastre. O histórico de Milei dá alguma credibilidade à sua insistência de que desta vez será diferente. Em dezembro de 2023, ele herdou gastos excessivos desenfreados do governo, inflação crescente e diversos controles de capital e taxas de câmbio.

Ele cortou os gastos de imediato, puxando a inflação para baixo drasticamente. Uma recessão profunda está dando lugar a um forte crescimento. A taxa de pobreza, que subiu para 53% no início de 2024, caiu para 38%, menor do que era quando Milei assumiu o cargo.

Agora ele está lidando com a fragilidade de seu programa de reformas: controles de capital e o peso supervalorizado. Milei nunca esteve tão perto de transformar a Argentina em uma economia normal. Mas o caos econômico global põe em risco suas reformas, e a política ainda pode derrubá-lo.

Até segunda-feira (14), o presidente argentino manteve os controles de capital e a taxa de câmbio em uma “escala móvel”, o que inicialmente desvalorizou o peso em 2% em relação ao dólar a cada mês. Isso reduziu a inflação, mas, embora ela ainda estivesse acima de 2% ao mês, o peso se sobrevalorizou.

Os controles de capital dissuadem os investidores estrangeiros, e o “superpeso” tornou as exportações caras em relação aos produtos locais e levou os mercados a apostar que seu valor cairia. Isso ameaçou uma crise. Desde meados de março, o banco central gastou cerca de US$ 2,5 bilhões para sustentar a taxa de câmbio. Na sexta-feira (11), suas reservas cambiais estavam cerca de US$ 7 bilhões no vermelho.

Agora, pressionado e apoiado pelo fundo, Milei agiu. Uma grande injeção de recursos do FMI —US$ 12 bilhões imediatamente e outros US$ 3 bilhões ao longo deste ano— ajudará o banco central a defender um regime cambial mais flexível. As reservas são ainda reforçadas por US$ 6,1 bilhões que devem ser emprestados por bancos multilaterais e por uma linha de swap de US$ 5 bilhões com a China.

A taxa de câmbio oficial agora flutuará entre 1.000 e 1.400 pesos por dólar. O banco central só venderá dólares para defender o peso se ele se aproximar do limite de 1.400. Caso os argentinos pareçam estar trocando pesos demais por dólares, o banco central oferecerá altas taxas de juros em pesos.

Essa estratégia é corajosa, porque é arriscada. No meio da tarde de segunda-feira (14), o peso havia despencado 12%, para 1.230 por dólar. No entanto, a consultoria Capital Economics avalia que isso ainda supervaloriza o peso.

“Em algum momento, o mercado vai testar a faixa superior”, disse Martín Redrado, ex-presidente do banco central, agora na consultoria Fundación Capital. A “força da resposta do banco central será crucial”.

O governo também reduziu os controles de capital para facilitar a retirada de dinheiro da Argentina. Isso ajudará a atrair investimentos estrangeiros, mas aumenta o risco de saídas repentinas. Por esse motivo, alguns controles importantes permanecem, incluindo bilhões em dividendos estrangeiros passados que estão há muito tempo estagnados no país.

As reformas devem facilitar a acumulação de reservas próprias pelo banco central, não apenas as que lhe são emprestadas pelo fundo. A Argentina precisa dessas reservas para ter alguma chance de obter empréstimos nos mercados de capitais globais, o que pretende começar a fazer no início do próximo ano para ajudar a rolar dívidas. Cerca de US$ 19 bilhões devem ser pagos em 2026. Os primeiros sinais são positivos. Os títulos internacionais argentinos subiram cerca de 3% no início do pregão, sugerindo que os mercados aprovam o plano.

O caos econômico global dificulta a execução. O presidente argentino ama o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, mas a guerra comercial de Trump causou uma queda acentuada no preço do petróleo e ameaça o preço das commodities agrícolas. Isso enfraquece os lucros de duas grandes exportações argentinas e dificulta a formação de reservas.

O caos também cria investidores avessos ao risco, já cautelosos com a Argentina, uma caloteira em série. Talvez para compensar, na segunda (14), Scott Bessent, secretário do Tesouro dos Estados Unidos, afastou-se do combate a incêndios e foi à Argentina para se encontrar com Milei. Isso é um símbolo de apoio, embora, até a publicação deste texto, nada de concreto tivesse sido anunciado.

O risco para Milei é que essas reformas abrangentes levem à inflação, e isso a uma política arriscada. A desvalorização do peso quase certamente aumentará a inflação. Ela já subiu para 3,7% ao mês em março, ante 2,4% em fevereiro. Uma nova alta para cerca de 5% ao mês é provável, afirma a FMyA, uma consultoria econômica. A esperança de Milei é que qualquer alta dure apenas alguns meses e termine antes das eleições de meio de mandato em outubro.

A queda da inflação é a base da popularidade de Milei. Os argentinos podem ficar furiosos se ela aumentar ainda mais, especialmente porque, em seu discurso triunfante de sexta (11), Milei declarou que “a inflação vai desabar”.

O perigo é um círculo vicioso em que a inflação sobe e a popularidade de Milei cai, os mercados se assustam, os problemas econômicos se agravam, a popularidade de Milei cai ainda mais, e assim por diante. Na tentativa de evitar o susto, o governo prometeu cortes de gastos ainda mais agressivos. Isso irritará muitos argentinos que já estão sofrendo —e em greve.

O presidente argentino já está sob pressão política. Em 3 de abril, o Senado rejeitou duas de suas indicações para a Suprema Corte, que ele havia tentado aprovar por decreto, de forma controversa. Logo depois, a Câmara dos Deputados votou pela abertura de uma investigação sobre a promoção, por parte de Milei, de uma criptomoeda duvidosa, em meados de fevereiro, cujo valor despencou horas depois de ele divulgá-la nas redes sociais. O escândalo das criptomoedas mina sua narrativa sobre o combate à “casta” corrupta.

Com 45%, seu índice de aprovação permanece forte, mas caiu desde o início do ano. Os mercados estarão atentos às próximas eleições regionais, seguidas pelas de meio de mandato, em busca de qualquer sinal de que os peronistas perdulários possam estar prestes a retornar. Nenhuma reforma estrutural é mais importante para a Argentina do que acabar com a política econômica peronista radical, afirma Alejandro Werner, do Instituto Peterson, um think tank em Washington.

O problema é que o presidente argentino não tem aliados. Ele está mais claramente alinhado ao partido do ex-presidente de centro-direita Mauricio Macri. Mas, embora se fale de uma frente única, também há muitas reclamações. Isso poderia abrir caminho para os peronistas nas eleições tanto na cidade quanto na província de Buenos Aires. Uma grande vitória peronista nesta última poderia assustar os mercados, alerta Ignacio Labaqui, da Medley Advisors, uma empresa de pesquisa.

Mesmo que as eleições de meio de mandato corram bem, elas não darão a Milei tanto poder quanto ele gostaria. Embora seu partido, que detém apenas 15% das cadeiras na Câmara e menos ainda no Senado, espere obter grandes ganhos, a estrutura da eleição está contra eles. Apenas metade da Câmara e um terço do Senado estão em disputa.

Ele tem a sorte de a oposição peronista estar envolvida em disputas internas por sua liderança. O caminho a seguir continua difícil, mas, por enquanto, surpreendentemente, Milei parece mais propenso do que nunca a concretizar sua transformação da economia argentina.

Notícias Recentes

Travel News

Lifestyle News

Fashion News

Copyright 2025 Expressa Noticias – Todos os direitos reservados.