As altas taxas de juros para os financiamentos agrícolas no Brasil e a possibilidade de que a Selic subirá mais têm feito com que o mercado de consórcios apresente crescimento, assim como a busca de produtores rurais por compra ou locação de máquinas agrícolas usadas.
Oferecida pelos bancos tradicionais e também por agentes financeiros de fabricantes de máquinas, a modalidade registrou crescimento de até 35% nos primeiros meses de 2025, num mercado, incluindo todas as modalidades, que tem projeção de crescer 8% no ano, segundo a Abac (Associação Brasileira das Administradoras de Consórcios).
Em março, o Copom (Comitê de Política Monetária) elevou a taxa básica de juros (Selic) em um ponto percentual, a 14,25% ao ano. O colegiado do Banco Central antecipou que a escalada de juros deve continuar na reunião do mês que vem, mas com um movimento de menor intensidade. O encontro está previsto para os dias 6 e 7 de maio.
Essa possibilidade e a eventual manutenção em patamares elevados nos meses seguintes motivaram bancos a levarem para a Agrishow (Feira Internacional de Tecnologia Agrícola em Ação), em Ribeirão Preto (a 313 km de São Paulo), linhas para atender produtores rurais que queiram fugir dos juros elevados. Até sexta-feira (2), a previsão é que as intenções de negócios na feira cheguem a R$ 15 bilhões.
Na CNH Industrial, detentora de marcas como Case e New Holland, a comercialização de novas cotas de consórcios de máquinas teve aumento de 35% no primeiro trimestre deste ano, em comparação com o período de janeiro a março de 2024.
“Especialmente em períodos de restrição de crédito e alta das taxas de juros, como o que vivemos, esse produto se torna uma alternativa estratégica para impulsionar as vendas no setor”, afirmou Heberson Goes, head de serviços financeiros para a CNH na América Latina. Todos os modelos vendidos pelas marcas são elegíveis ao consórcio.
Segundo ele, o crescimento das unidades de máquinas faturadas por meio de consórcios tem ocorrido de forma gradual nos últimos anos e as administradoras de consórcio parceiras das marcas fazem a venda exclusivamente por meio da rede de concessionárias e garantem a entrega das máquinas.
“Nesse contexto, o consórcio torna-se também uma alternativa atrativa, dependendo do perfil do cliente, especialmente para aqueles que podem planejar a compra e não têm a necessidade imediata do bem”, disse.
O crescimento também foi verificado no banco Komatsu, cujo consórcio é administrado pela Rodobens.
Lançado em novembro de 2023, quando a Selic estava em 12,25%, o consórcio alcançou R$ 27 milhões em vendas no país no ano passado e iniciou este ano com 18% de crescimento no primeiro trimestre de 2025, em relação ao mesmo período do ano passado.
Dados da Abac apontam que no país o segmento de veículos pesados teve queda no primeiro bimestre em relação a 2024, mas com forte recuperação já em fevereiro, mês que apresentou alta de 28,4% nas cotas vendidas.
Diretor de consórcios do Santander, Marcelo Aleixo afirmou que o banco levou para a Agrishow a oferta completa oferecida, com veículos leves e pesados, imóveis e todos os equipamentos agrícolas.
“O consórcio Santander é um dos pilares estratégicos de crescimento no Brasil. Nós estamos investindo em tecnologia e em pessoas. Ele é relevante, importante, não só pelo momento econômico, o consórcio tem tido condições favoráveis, mas também o que os clientes procuram. Tem cliente que procura consórcio, tem cliente que procura financiamento e nós temos as duas possibilidades que vão determinar a necessidade do cliente. O que determina o fator preponderante é a decisão do cliente, a necessidade”, disse.
Contabilizando todas as linhas de crédito oferecidas, o Santander espera gerar R$ 2 bilhões em negócios em cinco dias em Ribeirão Preto.
No Banco do Brasil, o BB Consórcios está oferecendo 30% de desconto na taxa de administração com o objetivo de captar clientes interessados em veículos pesados, com taxa de 0,17% ao mês.
O Sicredi comercializou R$ 14,8 bilhões em consórcios (para máquinas, veículos e imóveis) em 2024, 31,9% de crescimento em comparação com o ano anterior, elevando sua carteira para R$ 50 bilhões.
Na Valtra, o crescimento nos últimos cinco anos foi superior a 30% e a modalidade já representa cerca de 10% das vendas da marca. Segundo a fabricante de máquinas, as parcelas são a partir de R$ 2.073,16. O setor cafeeiro é um dos destaques.
MÁQUINA PARA QUEM NÃO QUER FINANCIAR NEM CONSÓRCIO
Também devido às elevadas taxas de juros, há produtores rurais que têm optado pela locação de equipamentos e venda de seminovos para a abertura e manutenção de vias e estradas rurais, sistematização do solo ou movimentação de biomassa nas usinas sucroenergéticas, entre outras atividades.
De olho nesse segmento, a Armac, empresa com 30 anos e sediada em Vargem Grande Paulista, possui mais de 11 mil ativos de chamada linha amarela –máquinas como retroescavadeiras, escavadeiras, pás-carregadeiras, motoniveladoras e tratores– para atender setores como a agroindústria.
Nos últimos dez anos, a participação de equipamentos da linha amarela no agronegócio saltou de 5% para quase 30% da frota, segundo a empresa. Isso fez com que o faturamento da Armac no ano passado com serviços e locação para o agro e o setor florestal fosse de R$ 212 milhões, ou 12,6% do faturamento da companhia com locação. Em 2024, a receita total da Armac foi de R$ 1,9 bilhão, 30,5% mais que no ano anterior.
Um levantamento feito pela Superbid Exchange em sua base entre janeiro e dezembro do ano passado mostrou que mais de 8.500 equipamentos e veículos usados foram comercializados, o que representou um crescimento de 15% em comparação com o ano anterior.
Máquinas e implementos agrícolas como roçadeiras e pulverizadores representaram 42,3% dos lotes. O preço médio foi de R$ 250 mil, 11,4% mais que em 2024.
Além das máquinas, o mercado de locação de equipamentos de irrigação também tem sido buscado por produtores rurais brasileiros. Segundo a Valley, com sede em Uberaba (MG), o investimento pode ser feito mesmo que o consumidor esteja com restrição ao financiamento convencional. Por isso, a modalidade tem sido buscada por produtores em situação de recuperação judicial.
“No setor sucroalcooleiro, em estados que tradicionalmente não investem em irrigação como São Paulo, Minas e Mato Grosso do Sul, a demanda por irrigação aumentou de 20% a 30% no último ano”, diz a empresa.
Questionado sobre a atual taxa de juros após sua participação na abertura da Agrishow, neste domingo (27), o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB), disse que a possibilidade de elevação da Selic para 15% é uma visão “pessimista” e disse esperar que não haja alteração. Afirmou ainda ser importante que a taxa de juros elevada seja transitória.