Vitória e João estudaram juntos durante o ensino fundamental 2 e o ensino médio em uma escola do interior de São Paulo. Ambos eram excelentes alunos e, no ensino médio, revezavam entre si as maiores notas da classe. No último ano, decidiram prestar a Fuvest para cursos ligados à matemática. João alcançou a nota mínima para a segunda fase com folga, o que não aconteceu com Vitória. Depois da decepção, Vitória optou por estudar em uma faculdade no interior e desistiu do sonho de ser aluna da USP (Universidade de São Paulo), enquanto João conseguiu passar para a segunda fase e se formou economista.
Esse é um caso anedótico, mas que ilustra uma situação que pode ocorrer com diversas meninas. São excelentes alunas, mas, em competições que têm grande peso, como vestibulares ou olimpíadas de matemática, acabam apresentando um desempenho inferior ao observado durante o período escolar ou são mais propensas a desistir diante de frustrações. Alguns estudos mostram que essa diferença de atitudes entre meninos e meninas tende a ser maior quanto maior for o peso (importância) da avaliação.
No caso das olimpíadas de matemática, a participação feminina é menor do que a masculina e, conforme as etapas avançam, essa proporção se reduz ainda mais. As meninas vão desistindo à medida que a competição se torna mais acirrada. O que acontece que poderia explicar essas diferenças?
Muitos cientistas investigam se essas diferenças seriam explicadas pela criação (experiências e socialização) ou por características biológicas inatas. Alguns autores sugerem que avaliações de matemática, que tipicamente exigem respostas “certo ou errado”, aliadas a fatores como o peso da prova e o tipo de competição, podem ter impactos mais negativos sobre a performance feminina. Há estudos que mostram que as meninas apresentam melhor desempenho quando competem entre si do que quando competem em grupos mistos, especialmente quando a proporção de meninas é muito menor do que a de meninos. Esses resultados sugerem que tais diferenças estão mais ligadas à criação do que à natureza.
Ellison e Swanson (2023), no artigo “Dynamics of the Gender Gap in High Math Achievement”, investigam as razões pelas quais há um aumento da diferença de desempenho entre meninos e meninas ao longo da vida escolar, entre alunos que estão entre os melhores em matemática, bem como o aumento da desistência das meninas em olimpíadas de matemática nos Estados Unidos. Os resultados sugerem que a diferença existente entre eles no 9º ano contribui para explicar o aumento dessa diferença durante o ensino médio.
Essa diferença também é observada no Brasil: segundo dados do PISA (2022), a diferença de gênero entre os melhores alunos brasileiros na prova de matemática é de 22 pontos. Outro ponto levantado pelos autores é que, quando os alunos obtêm uma nota muito próxima da nota mínima, mas insuficiente para avançar à fase seguinte da competição, há um aumento na probabilidade de desistência em competições futuras, sendo essa tendência mais acentuada entre as meninas.
Toda essa dinâmica, segundo os autores, pode ajudar a explicar a menor representatividade feminina nas áreas de STEM (Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática). Nesse contexto, é preciso atuar sobre as diferenças de atitude em relação à competição, os padrões de desistência e as respostas à frustração, principalmente entre as meninas.
Uma possível forma de reduzir essa disparidade seria separar as olimpíadas de matemática por gênero, método que parece ser eficaz para melhorar o desempenho das meninas nas competições, reduzir a desistência e empoderá-las ao figurarem no topo da distribuição, contribuindo, assim, para o aumento futuro de sua participação nas áreas de STEM.