A economia dos Estados Unidos contraiu nos três primeiros meses de 2025, no primeiro recuo desde 2022, como resultado do impacto da guerra comercial de Donald Trump em empresas e consumidores americanos.
Segundo dados divulgados pelo BEA (sigla em inglês para Escritório de Análise Econômica) nesta quarta-feira (30), o PIB dos EUA teve uma queda de 0,3% em termos anuais durante o primeiro trimestre do ano.
A queda contrasta com o crescimento de 2,4% registrado no último trimestre de 2024. A última vez em que houve recuo havia sido no primeiro trimestre de 2022.
O PIB mede o valor de todos os bens e serviços produzidos na economia. A contração no indicador teve a ver com o aumento nas importações, provocada pela corrida das empresas americanas para acumular estoques antes das tarifas de Trump, e pela contenção do consumidor.
Dados do Censo dos EUA desta terça-feira (29) mostram que o déficit comercial de mercadorias atingiu um recorde histórico em março, antes do anúncio do tarifaço do presidente dos EUA em 2 de abril, data que ele apelidou de “Dia da Libertação”.
As importações cresceram 41,3%, enquanto as exportações aumentaram em ritmo mais devagar, de 1,8%, no primeiro trimestre do ano.
A diferença entre importações e exportações é um fator importante no cálculo do PIB, que também mede o consumo doméstico, investimento e gastos governamentais.
A diminuição no PIB foi pior do que algumas previsões. Economistas ouvidos pelo The Wall Street Journal, por exemplo, esperavam um crescimento de 0,4%.
Segundo o New York Times, o modelo de crescimento econômico do Federal Reserve Bank of Atlanta previa uma contração de 1,5% no primeiro trimestre, enquanto a versão do Fed de Nova York previa um crescimento de 2,6%.
Reflexo do turbulento novo governo, o mercado acionário americano viveu os piores cem dias primeiros de um mandato presencial desde 1974 —quando Gerald R. Ford assumiu a Casa Branca após a renúncia de Richard Nixon em razão do escândalo Watergate.
De 20 de janeiro, quando o republicano tomou posse, a 29 de abril, o índice S&P 500 caiu 7%. Os maiores impactos vieram após o anúncio de uma nova política tarifária no início de abril, que levou a uma semelhante aos patamares vistos na pandemia e na crise financeira global de 2008.
A guerra comercial iniciada por Trump foi um balde de água fria para investidores, que viam no presidente alguém que avançaria na agenda de cortes de impostos e desregulamentação.
Nesta quarta, o republicano eximiu-se de culpa e atrelou ao antecessor Joe Biden a responsabilidade pelo resultado.
“Este é o mercado de ações de Biden, não o de Trump. Eu só assumi em 20 de janeiro. As tarifas em breve começarão a entrar em vigor, e as empresas estão começando a se mudar para os EUA em números recordes”, afirmou o presidente na sua rede social, Truth Social.
“Nosso país vai decolar, mas precisamos nos livrar da ‘sombra’ deixada por Biden. Isso vai levar um tempo, NÃO TEM NADA A VER COM AS TARIFAS, apenas que ele nos deixou com números ruins. Mas quando o crescimento começar, será como nunca antes. TENHAM PACIÊNCIA!!! (sic)”, disse Trump após a divulgação do resultado do PIB.
Depois, ao abrir uma reunião de gabinete, Trump afirmou: “Vocês provavelmente viram alguns números hoje. E eu tenho que começar dizendo: isso é Biden, não é Trump”. Ele então disse que os mercados subiram quando ele foi eleito e que “herdou uma bagunça”, pedindo um desconto ao primeiro trimestre na administração.
Ainda assim, reconheceu que pode haver um problema na oferta com sua política tarifária. “Talvez as crianças tenham duas bonecas em vez de 30 bonecas. Talvez as duas bonecas custem alguns dólares a mais do que normalmente custariam”, avaliou.
Mais tarde, em encontro com investidores, Trump novamente apontou o dedo ao presidente do Fed (o banco central americano), reclamando das taxas de juros. “Os preços de energia estão em queda em todo o país. As taxas de hipoteca estão, na verdade, ligeiramente mais baixas, mesmo que eu tenha um cara no Fed de que não sou um grande fã”, disse. O presidente, então, defendeu novamente a queda nas taxas de juros para aliviar o preço das compras.
Os dados desta quarta, porém, não mudaram significativamente as expectativas de corte nas taxas de juros, com operadores no mercado futuro ainda prevendo aproximadamente quatro cortes este ano. Vários economistas de Wall Street revisaram suas estimativas de crescimento do primeiro trimestre para baixo após a publicação dos números do comércio de mercadorias na terça-feira.
O Escritório de Análise Econômica, que divulgou os números do PIB, acrescentou que a queda na produção do primeiro trimestre também refletiu uma diminuição nos gastos governamentais. Afirmou que tais mudanças foram parcialmente, mas não totalmente, compensadas por aumentos em investimentos, gastos do consumidor e exportações.
Ao The Wall Street Journal, Shannon Grein, economista do Wells Fargo, afirmou que o relatório é sólido. “O declínio do título principal superestima a fraqueza porque muito disso foi uma antecipação induzida por tarifas. No geral, acho que foi um relatório subjacente relativamente sólido quando se trata de demanda”, disse Grein.
Chris Rupkey, economista-chefe da Fwdbonds, uma empresa de pesquisa financeira, escreveu aos clientes que “o crescimento simplesmente desapareceu”. “Talvez parte desse pessimismo se deva a uma corrida para importar antes que as tarifas aumentem, mas simplesmente não há como os conselheiros de política adoçarem isso”, diz o comunicado reportado pelo The Washington Post.
Espera-se que a guerra comercial de Trump leve a um crescimento mais lento durante o segundo semestre deste ano, com preços mais altos pesando sobre o consumo.
O FMI disse na semana passada que o PIB dos EUA expandiria 1,8% este ano —abaixo de sua estimativa de janeiro de 2,7%. Muitos analistas do setor privado não preveem crescimento algum.
Com Financial Times.