Criador do software que permitiu às grandes redes de ensino superior ingressar na oferta de graduação à distância (EAD), Luiz Barison, 59, trava uma batalha judicial para receber royalties devidos pelo uso indevido de sua plataforma por faculdades hoje controladas pela Ânima, Unisul, Unimonte, Unitri, entre outras. “Fizeram pirataria e desviaram patrimônio para não pagarem”, disse o empresário em entrevista. Hoje, quatro das cinco redes depositam valores em juízo e a Ânima questiona os cálculos.
Quanto tem para receber?
A primeira decisão judicial estipulou o valor da dívida em R$ 1 bilhão, valor que, após recurso das empresas, foi reduzido para R$ 200 milhões pelo STJ. Deste total, cerca de R$ 80 milhões foram pagos e o restante está em fase de execução.
Quais são os grupos envolvidos?
Três universidades pertencem à Ânima (Unimonte, Unisul e UVA). Há ainda a Universidade Potiguar, do Rio Grande do Norte, e a última, talvez a pior de todas, a Unitri, que pertence à família do ex-senador Wellington Salgado.
Por que ela é a pior de todas?
Hoje estamos com um processo de penhora de faturamento nessas redes que varia de 5% a 10% das receitas. Para isso, as empresas têm de entregar documentos ao administrador judicial. A Unitri não apresentava os registros e foi preciso determinação judicial para busca e apreensão. A medida ainda não se efetivou, contudo.
Por que tanto tempo se passou para acertarem essa conta?
As empresas tentaram demonstrar na Justiça que o software não era meu. Quando provei ter criado o programa, obtive uma ata [de reuniões das empresas] em que discutiram a dilapidação de patrimônio para que essa rede [de 10 escolas que usavam o software] não tivesse nada. Combinavam ali uma fraude de execução da dívida. O juiz concedeu a desconfiguração da personalidade jurídica da empresa [que formava a rede de escolas] e eu tive que ir para cima de dez universidades [para receber o pagamento]. Independente disso, há agora um processo criminal em curso.
Mas hoje essas empresas não são mais familiares.
Exatamente. Já naquele momento, as famílias começaram a vender as redes para grandes conglomerados. E isso repercutiu no processo, porque, em alguns momentos, esse grupos sucedem as famílias e, em outros, elas ainda continuam no negócio. Alguns procuraram para fazer acordo. Foi o caso da Anhanguera, no ato da venda da Anhembi-Morumbi, em 2017, e da Unespa, do empresário Janguiê Diniz.
Essas redes foram condenadas com base em quê?
Na lei de pirataria.
Copiaram seu software?!
Ampliaram o uso sem pagar. De acordo com a legislação, quando você não sabe o número de licenças [em uso], estabelece-se um limite de três mil [como parâmetro do que é uso indevido]. Eu tinha um rastreador que dizia exatamente não só quantos softwares estavam instalados e em uso, mas também onde [em que máquina, via IP]. Quando eles desligaram esse mecanismo [de proteção] passou a valer o artigo da lei da cota de três mil. Eles fizeram isso 3 mil vezes. Por isso, o valor chegou a R$ 1 bilhão, valor depois reduzido pelo STJ.
Esse software continua em uso atualmente?
Foi esse software que possibilitou às redes conseguirem a primeira autorização do MEC para o EAD [ensino à distância]. Quando entrei com a ação e a primeira sentença favorável saiu, em 2003, começaram a desligá-lo.
O senhor fala em desvio de patrimônio para escaparem da execução. Como conseguiu provar isso?
Toda hora que a gente ia executar, não achava dinheiro. Aí me inscrevi em todas as universidades. Isso gerou um boleto e o pagamento era feito para um CNPJ diferente. A propaganda da escola era feita por um CNPJ (o do site) e o pagamento, por outro.
Consultada, a Ânima afirma ter adquirido as faculdades após o início da disputa. O grupo nega qualquer fraude à execução apontada pelo empresário e informa que os valores pendentes estão sendo discutidos judicialmente. A Unitri não respondeu até a publicação desta entrevista.
Raio-X
1966, São Paulo – Com mais 30 anos de carreira nos setores de tecnologia e telecomunicações, desenvolveu sistemas para digitalização do setor bancário, por meio de solução desenvolvida em convênio com 52 bancos, a Visanet, Bovespa e a Caixa Econômica Federal. Criou o primeiro software para ensino à distância, que serviu a universidade virtual brasileira reconhecida pelo Ministério da Educação, em 1995. Hoje comanda a CEO (Centro de Estratégias Operacionais).
Com Stéfanie Rigamonti