Domingo é Dia das Mães. As redes vão se encher de homenagens, flores e discursos sobre sacrifício e dedicação. Muitos celebram o amor incondicional, mas poucos param para perguntar até que ponto ele também é moldado por expectativas sociais pouco discutidas. Entre as mães que deixam o mercado de trabalho para se dedicar exclusivamente à casa, há histórias de realização. Mas também há histórias de arrependimento. A diferença entre uma e outra, muitas vezes, está na consciência da escolha.
Um estudo de Cortés, Koşar, Pan e Zafar ajuda a jogar luz sobre esse tema. Os autores investigam como as normas sociais, ou melhor, como a percepção que temos sobre o que os outros pensam, influenciam nossas atitudes sobre o trabalho de mães com filhos pequenos.
A pesquisa foi feita nos Estados Unidos com uma amostra nacional. Os participantes leram dois cenários. No primeiro, uma mãe com filho de quatro anos recebe uma boa oferta de trabalho e tem acesso a uma creche pública e gratuita de qualidade. No segundo, tanto a mãe quanto o pai estão empregados, mas a creche não funciona bem, e um dos dois precisa reduzir a carga de trabalho. Em cada caso, os participantes eram convidados a responder o que recomendariam à mãe e o que achavam que outras pessoas parecidas com elas recomendariam.
Metade da amostra recebeu, antes de dar sua própria resposta, dados reais sobre o que pessoas semelhantes haviam dito em pesquisas anteriores. A outra metade não teve acesso à informação. E aí está o ponto central: a maioria acredita que os outros são mais conservadores do que realmente são. Ou seja, mesmo quem apoiaria que a mãe voltasse ao trabalho imagina que a comunidade ao redor não veria isso com bons olhos. Esse descompasso entre a percepção e a realidade, o “perception gap”, afeta diretamente as recomendações.
Quando recebem dados reais sobre o que os pares pensam, as pessoas mudam de opinião. Descobrir que os outros são menos rígidos do que se imaginava leva os participantes a apoiar mais abertamente a decisão da mãe de trabalhar fora. Entre homens, esse efeito foi ainda mais forte: não só mudaram de opinião como também aumentaram doações reais a uma ONG que defende a participação feminina no mercado de trabalho.
O que o estudo mostra é que normas sociais não se mantêm só por crença, mas também por receio de julgamento. E esse medo, muitas vezes, é infundado. Não se trata aqui de desautorizar quem opta por uma vida mais centrada no lar. O problema é quando essa escolha não é feita de forma deliberada, mas por inércia. Quando parece o caminho natural, ou pior, o único. Porque o custo emocional tende a recair sobre quem abriu mão de algo sem saber que havia alternativas e também sobre quem, no futuro, pode acabar sendo lembrado como a razão de uma vida interrompida.
Quantas mães dizem aos filhos, mesmo com afeto: “abri mão de tudo por você”? Quantas fizeram isso com plena autonomia e quantas apenas seguiram o que se esperava delas, sem saber que podiam negociar, dividir ou adiar decisões? Idealizações repetidas e pressões sutis criam um terreno fértil para ressentimentos. O que começa como cuidado pode virar cobrança. O que deveria ser amor se transforma em dívida emocional. Assim, precisamos falar sobre normas sociais e sobre como a percepção do olhar alheio molda nossas escolhas. Corrigir essa percepção, mesmo com uma informação pontual e objetiva, pode ser capaz de mudar atitudes.
Neste Dia das Mães, mais do que celebrar a dedicação, vale perguntar se houve espaço real para escolha. Se ela quis, se ela pôde. Não se trata de defender um único caminho, mas de garantir que nenhuma mãe precise justificar sua trajetória como sacrifício inevitável. Amor de verdade, afinal, só floresce quando nasce da liberdade.