A avenida 9 de Julho, uma das principais ligações entre o centro e a zona sul de São Paulo, vive uma transformação no perfil urbano. Antigos edifícios corporativos, muitos deles com histórico de abrigar grandes empresas, estão sendo substituídos por empreendimentos residenciais de altíssimo padrão, voltados à elite paulistana.
A Benx Incorporadora é uma das protagonistas desse processo. Especializada em desenvolvimento imobiliário, a empresa lançou dois projetos na região na altura do Itaim Bibi e Jardins. Ambos os empreendimentos têm como foco o público de alta renda.
O primeiro projeto da Benx é o Art Boulevard, com unidades que chegam a R$ 40 milhões. Localizado entre a avenida 9 de Julho e a avenida Cidade Jardim, o empreendimento ocupa um terreno de quase 28 mil metros quadrados. O segundo lançamento é o Arbórea Vista Jardim Europa, situado entre a rua da Mata e a 9 de Julho, com 100 metros de frente para a via.
Segundo o CEO da Benx, Luciano Amaral, a escassez de terrenos disponíveis nas áreas mais valorizadas da cidade tem impulsionado a conversão de prédios antigos.
“No altíssimo padrão, há pouca oferta para uma demanda muito aquecida. Muitos desses edifícios comerciais já não atendem mais às exigências das grandes companhias”, afirma.
Com uma quadra inteira e acesso por três ruas, o Arbórea Vista Jardim Europa tem diferenciais como uma quadra de tênis oficial —item incomum na região. O projeto é assinado pelo escritório Jacobsen Arquitetura, conhecido por obras de alto padrão na Fazenda Boa Vista e em Laranjeiras.
Já o Art Boulevard, que ainda será lançado, é tratado como um dos projetos mais ambiciosos da incorporadora. A proposta é combinar sofisticação e zelo estético, desde um concurso para escolher a escultura da entrada até a contratação de curador de arte e projetistas dos Estados Unidos. A meta da Benx é que o edifício figure entre os principais empreendimentos de alto padrão da cidade.
A concorrência pelo terreno do Art Boulevard envolveu mais de 60 empresas, segundo Amaral. “Os valores negociados superaram patamares nunca antes vistos no mercado imobiliário paulistano”, diz.
Mais de 80% dos compradores dos projetos da Benx são moradores finais. “Não é uma bolha especulativa, mas uma reconfiguração concreta do uso urbano”, afirma Amaral.
Todo esse movimento marca uma inflexão no perfil da avenida. Apesar do passado comercial, a 9 de Julho começa a consolidar uma nova identidade como endereço residencial de luxo. No trecho entre o Itaim Bibi e o Jardim Europa, pelo menos quatro empreendimentos de alto padrão foram lançados nos últimos anos, acelerando a reconfiguração da paisagem.
Um dos trunfos dessa nova fase é a vista. Por estar ao lado dos bairros Jardim Europa, América e Paulistano —tombados pelo patrimônio histórico— os novos prédios na 9 de Julho garantem a seus moradores uma paisagem sem obstruções e protegida da verticalização. “É uma vista eterna”, diz Amaral. “O comprador sabe que não vai acordar um dia com um prédio de 30 andares na frente da janela.”
Dados do Grupo OLX obtidos pela Folha mostram que o preço médio do metro quadrado na avenida 9 de Julho subiu 20,7% entre 2024 e 2025, passando de R$ 11.330 para R$ 13.671. No mesmo período, a valorização média na cidade de São Paulo foi de 6,4%, segundo o FipeZAP —com o metro quadrado passando de R$ 10.801 para R$ 11.497.
No entanto, o movimento de substituição de prédios comerciais por residenciais foge da tendência observada no restante do mercado. Para a diretora de pesquisa da Newmark, Mariana Hanania, a transformação na 9 de Julho é um caso pontual.
“Desde o ano passado, o mercado [corporativo] começou a se recuperar. A taxa de vacância vem caindo e esperamos uma demanda ainda mais aquecida em 2025. Não há expectativa de mudança de uso em outras regiões consolidadas”, afirma.
9 DE JULHO CENTRO
Ao contrário do trecho sul, a porção central da avenida 9 de Julho ainda não atrai empreendimentos de altíssimo padrão. Apesar de o centro de São Paulo estar no radar do setor imobiliário, projetos semelhantes enfrentam um obstáculo decisivo: a insegurança. A região concentra marcos culturais, infraestrutura de transporte e potencial de valorização, mas a percepção de violência ainda afasta investidores e compradores.
“O centro tem tudo para ser comparado ao de grandes cidades do mundo, mas a sensação de insegurança é muito grande. Isso dificulta a permanência de serviços, hotéis e atrativos que poderiam valorizar a região”, afirma Luciano Amaral, CEO da Benx.
A sede do governo paulista deve ser transferida para o centro até 2026, como parte de um programa de requalificação urbana. Ainda assim, a mudança não tem influenciado os planos das incorporadoras que atuam no eixo Itaim-Jardins. “O que estamos fazendo é na parte baixa da 9 de Julho, não no trecho central”, completa Amaral.
Para Hanania, da Newmark, o Plano Diretor e a Lei de Zoneamento criam incentivos para construções na altura central da avenida. A expectativa, segundo ela, é que a via repita o movimento observado na avenida Rebouças. “Prédios antigos, com pouca atratividade para grandes empresas, tendem a ser convertidos. São edifícios que não acompanharam a modernização do mercado”, explica.
Aprovado em 2014, o Plano Diretor estimula a criação de fachadas ativas (com comércio no térreo) e o uso misto do solo (residencial, comercial e institucional), com o objetivo de reduzir deslocamentos e promover uma ocupação urbana mais integrada.
Na avaliação de Amaral, se a requalificação do centro for bem-sucedida, ela pode impulsionar a segurança e valorizar o entorno. “Vai trazer vitalidade para uma área que hoje tem um enorme potencial subutilizado”.