Aposentados e pensionistas que foram vítimas de descontos indevidos de associações e buscaram ajuda em uma agência do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) nesta quarta-feira (14) não conseguiram abrir o pedido de devolução pessoalmente, pois o órgão restringiu a consulta e as solicitações de reembolso a seus canais digitais. A orientação é que os segurados façam a contestação via aplicativo ou site Meu INSS e pela Central telefônica 135.
A reportagem da Folha visitou seis agências da capital paulista nesta quarta, no primeiro dia em que aposentados puderam fazer os pedidos de reembolso, e constatou que, embora alguns servidores auxiliem beneficiários a acessar extratos para verificar se há débitos indevidos, não há, até o momento, estrutura presencial montada nas agências para registrar formalmente os pedidos de restituição.
A reportagem encontrou filas, demora no atendimento e dificuldade de acesso a informações, especialmente entre idosos que buscavam apoio após tentativas frustradas de contato com a Central 135.
Na entrada da unidade da Consolação e Vila Mariana, idosos chegavam por volta das 7h e havia segurados que esperaram até quatro horas. As agências apresentavam fluxo intenso, mas sem organização específica para pedidos relacionados aos descontos indevidos. A exceção foi a agência da Consolação, que tinha uma fila para emissão de senhas de acesso ao Meu INSS.
“A gente descobre o problema [de que houve o desconto indevido] aqui, mas mandam resolver pelo celular. E se a pessoa não tem celular? Ou não sabe mexer?”, disse a prestadora de serviços Daniela Semerano, 48, que estava na Vila Mariana.
“Vim para me informar sobre o caso da minha mãe, que é falecida, mas não tem informação em lugar nenhum. Estou aqui há três horas, porque qualquer dúvida nos colocam na mesma fila de triagem. E, como você pode ver, só tem um funcionário para a agência inteira. Já tentei ligar no 135 várias vezes, mas ninguém atendeu.”
Nas redes sociais, havia queixas sobre instabilidade no aplicativo e também críticas por não haver canal de atendimento presencial nas agências. Houve até quem relatou ter apertado errado o botão dizendo que autorizou o desconto.
Em entrevista coletiva nesta quarta, o presidente do INSS, Gilberto Waller Junior, afirmou que houve instabilidade no Meu INSS durante a manhã, normalizada à tarde. Segundo o representante, não foram identificadas filas nas agências e o tempo médio de atendimento no 135 foi de sete minutos.
“Toda vez que a gente fala que pode ir presencial, estamos trazendo um custo a mais para o segurado, que tem que se deslocar”, declarou.
Segundo Waller Junior, o órgão vai monitorar o atendimento para verificar se será preciso abrir outros canais do próprio INSS e fazer parcerias com outros órgãos. Há estudos, por exemplo, de parcerias com órgãos como Correios e Caixa, mas sem definição.
Em todas as agências visitadas pela reportagem —em bairros como Consolação, Vila Mariana, Santana, Mooca, Vila Gomes Cardim e Água Rasa— funcionários imprimiam extratos de pagamento mensais dos benefícios. Na Água Rasa e Vila Gomes Cardim, os atendentes mostravam apenas os extratos recentes —do último ano, na primeira, e do último mês na segunda, respectivamente.
Já o sistema de consultas que o INSS liberou nesta quarta no aplicativo, site e central telefônica informa o nome da entidade que aplicou desconto nos últimos cinco anos. O INSS vai devolver valores descontados indevidamente desde março de 2020.
Por enquanto, mesmo o aposentado que faz a consulta nos canais digitais não consegue saber o valor total que foi descontado e quanto poderá receber de restituição se ficar comprovado que o desconto foi mesmo irregular.
Servidores de agências visitadas afirmaram não ter autorização ou acesso para abrir formalmente um pedido de reembolso. Apenas na Mooca uma funcionária da triagem disse que o pedido de devolução poderia ser registrado presencialmente.
Um atendente na unidade da rua Coronel Xavier de Toledo, região central da capital paulista, afirmou que, se tiver um desconto, o segurado precisa levar o extrato à associação para solicitar o reembolso, mas a indicação, porém, contraria a orientação do INSS de não entrar em contato com as associações e também não fornecer dados em nenhum canal que não seja os oficiais do órgão, pois já há tentativas de golpes.
Os servidores também entregavam uma procuração para que familiares pudessem acessar os dados dos aposentados.
Jose Carlos Horas, 65, aposentado e advogado que estava na unidade Água Rasa, afirmou que a confusão nas agências é reflexo da falta de uma política de comunicação clara e inclusiva. “Tem idoso que vive em área rural, que não tem estudo, que nem sabem se teve descontos. Como essa pessoa vai conseguir usar aplicativo?”
Na Vila Mariana, a gerente se recusou a falar com a reportagem ou com o público, orientando servidores a dizerem que ela “não estava” a depender da demanda, incluindo dúvidas de aposentados sobre os descontos indevidos do INSS.
Gilberto Waller Júnior afirmou que 473 mil pessoas informaram não reconhecer os descontos em seus benefícios até as 16h desta quarta-feira. O número corresponde a 98,6% de pedidos feitos no sistema no primeiro dia de funcionamento, ou seja, 1,4% de quem acessou essa seção reconheceu ter autorizado os descontos.
No total, 41 entidades já foram notificadas pelo INSS por descontos irregulares. Agora, elas têm 15 dias úteis para comprovar o vínculo do beneficiário ou devolver os valores.
Segundo Waller Júnior, a plataforma do Meu INSS registra uma média mensal de 89,5 milhões de atendimentos, e da Central 135, com 6,9 milhões. Já o atendimento presencial alcança mensalmente 2,1 milhões de segurados, mas ele afirma que boa parte são pessoas que precisam ir até o posto para passar por uma perícia médica presencial.
O presidente do Dataprev, Rodrigo Assumpção, afirmou também nesta quarta que houve mais de 8 milhões de acessos ao aplicativo Meu INSS, e 738.321 desses acessos foi para a área de desconto associativo, onde a pessoa informa se autorizou ou não o débito.