Um relatório parcial da Polícia Civil de São Paulo aponta que uma empresa agenciadora de jogadores de futebol, que foi acusada de ter uma suposta ligação com a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), recebeu mais de R$ 1 milhão a partir de pagamentos feitos pelo Corinthians.
Formalmente, a justificativa para os repasses de dinheiro foi a intermediação do contrato entre o clube de futebol e a casa de apostas esportivas online VaideBet.
Ao todo, R$ 1.074.150 chegaram até a conta bancária da empresa UJ Football Talent Intermediação. A empresa foi alvo da delação premiada do corretor de imóveis Antônio Vinícius Lopes Gritzbach, assassinado em novembro no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos.
Segundo a delação, a UJ Football fazia lavagem de dinheiro do tráfico na aquisição dos atletas da elite do futebol brasileiro.
O dinheiro do Corinthians teria chegado até a empresa a partir de pagamentos do clube à empresa Rede Social Media Design. Ela pertence a Alex Fernando André, o Alex Cassundé, que fez parte da equipe de comunicação do atual presidente do Corinthians, Augusto Melo, durante a campanha eleitoral na qual ele concorreu para o cargo.
A ligação entre os pagamentos do Corinthians e a UJ Football foi noticiada inicialmente pelo jornal O Estado de S.Paulo, e confirmada pela Folha. O caso começou a ser investigado pela Policia Civil a partir de informações publicadas pelo Blog do Juca Kfouri, no UOL.
Três empresas intermediárias foram usadas até que o dinheiro chegasse à UJ Football. Segundo a Polícia Civil, essas firmas usadas no esquema estão em nome de laranjas.
A Rede Social Media Design recebeu dois pagamentos de R$ 700 mil, totalizando R$ 1,4 milhão, em março do ano passado. Poucos dias depois, foram repassados R$ 1.042.000 à Neoway Soluções Integradas em Serviços.
Essa empresa tinha como sócia Edna Oliveira dos Santos, que recebe auxílios governamentais e mora numa casa precária em Peruíbe, no litoral paulista, e afirmou desconhecer que constava como dona da empresa.
Por sua vez, a Neoway repassou R$ 1 milhão à empresa Wave Intermediações e Tecnologia. Por último, a Wave repassou R$ 874 mil à UJ Football, e outros R$ 200 mil ainda chegaram através de outra empresa intermediária —a Victory Trading Intermediação de Negócios, Cobrança e Tecnologia.
Todas essas transações financeiras ocorreram num intervalo de dez dias. A investigação, conduzida pelo delegado Tiago Fernando Correia, do DPPC (Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania), apurou que algumas dessas empresas laranjas jamais tinham feito repasses de dinheiro entre si, e após essa ocasião nunca mais fizeram transações.
Com a informação de que o nome de Edna era usado como laranja na Neoway, o delegado chamou Alex Cassundé para depor. Ele afirmou que seu nome foi incluído no contrato entre a VaideBet e o Corinthians pela intermediação do contrato, mas a explicação não convenceu os investigadores e fez com que eles prosseguissem no rastro do dinheiro até chegar à UJ Football.
Segundo o relatório, os cofres do Corinthians foram alvo de furto praticado por uma associação criminosa. Há também suspeita de lavagem de dinheiro, uma vez que há indícios de uma tentativa de disfarçar a origem do dinheiro que chegou até a UF Football.
Procurada, a defesa de Alex Cassundé afirmou que ele “não tem nenhum conhecimento sobre a sequência de pagamentos” após suas transferências à Neoway, que ele desconhece as demais empresas envolvidas não tem o menor conhecimento sobre os pagamentos feitos à UJ Football.
Já o Corinthians publicou uma nota oficial em seu site afirmando que “não há qualquer demonstração de autoria relacionada aos fatos mencionados” e que “o presidente do clube reafirma seu total apoio às investigações em andamento, bem como a todas as iniciativas que visem apurar eventuais envolvimentos do crime organizado no futebol brasileiro”. A reportagem não conseguiu contato com a UJ Football e a VaideBet.
Em sua delação, Gritzbach associava a UJ Football ao nome de Danilo Lima de Oliveira, conhecido como Tripa, que vem sendo investigado pela Polícia Civil desde o início de 2022. Na época, o elo dele com o PCC já havia sido apontado pela polícia.
Oliveira é suspeito de participação em um sequestro de Gritzbach, em janeiro de 2022. Ao ser sequestrado, ele teria sido submetido a um “tribunal do crime” em que foi questionado sobre a suspeita de ter desaparecido com US$ 100 milhões (R$ 547 milhões) que pertenceriam ao traficante Anselmo Becheli Santa Fausta, o Cara Preta, chefe do PCC. Gritzbach também era acusado de ter mandado matar Cara Preta em 2021, o que ele negava.
A denúncia de que empresas laranjas teriam recebido dinheiro que veio do Corinthians motivou a rescisão do contrato da VaideBet com o clube, em junho do ano passado. O patrocínio da casa de apostas tinha sido o primeiro grande contrato firmado pela gestão de Augusto Melo.