Em teoria, um mercado de trabalho funciona de forma equilibrada quando a quantidade de trabalhadores disponíveis é mais ou menos equivalente à demanda por esses profissionais. De acordo com o Censo Escolar, em 2024, o Brasil contava com 2,4 milhões de professores na educação básica, considerando todas as etapas, tanto do setor público quanto do privado. Podemos, portanto, inferir que há cerca de 2,4 milhões de vagas (demanda) para a profissão docente no país. Mas quantos são os recém-formados que estão entrando nesse mercado e oferecendo sua força de trabalho?
Segundo dados do IBGE, seguindo uma tendência mundial, o Brasil tem hoje a menor taxa histórica de filhos por mulher. Isso significa que o número de pessoas em idade escolar já está diminuindo, e continuará caindo, em todas as etapas da educação. Ainda assim, vamos considerar, para efeito de análise, que o número de vagas para professores permanecerá em 2,4 milhões, embora seja razoável imaginar que esse total comece a encolher em breve.
De acordo com a Previdência brasileira, mulheres, que representam cerca de 80% da categoria docente, se aposentam aos 57 anos, com 25 anos de contribuição. Se temos 2,4 milhões de professores em atividade e uma carreira média de 25 anos, será necessário repor aproximadamente 96 mil profissionais por ano. Ou seja, a cada ano, surgem em média cerca de 96 mil novas vagas para docentes.
Ainda segundo o Censo da Educação Superior, há 1,7 milhão de alunos matriculados em cursos de pedagogia ou licenciatura, e, em 2023, 847 mil novos estudantes ingressaram nesses cursos. Estamos, portanto, colocando 847 mil aspirantes à docência no caminho da formação, enquanto o mercado provavelmente absorverá apenas cerca de 96 mil deles.
O mesmo censo indica que, em 2023, 224 mil alunos concluíram cursos de pedagogia ou licenciatura. Num cenário em que o número de crianças diminui ano após ano, mesmo considerando a abertura de 96 mil vagas, estamos formando mais que o dobro de professores do que o mercado pode absorver. O que será da carreira desses recém-formados?
Outro dado preocupante: desses 224 mil concluintes, 63% cursaram ensino a distância. Uma pesquisa publicada em 2022, da pesquisadora Vivian Jacobsohn Serebrinic, estimou o impacto da formação inicial docente via EaD. Ao analisar os resultados do Enade (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes) entre estudantes com perfis semelhantes, mas que cursaram pedagogia em modalidades diferentes, a autora identificou que alunos do EaD apresentaram desempenho 0,20 desvios-padrão inferior ao dos colegas do ensino presencial.
Considerando que é amplamente aceito —tanto pelo senso comum quanto pela literatura científica— que a qualidade do professor tem enorme impacto na aprendizagem dos alunos, torna-se urgente cuidar melhor da formação docente. A maioria dos formandos hoje estuda em cursos a distância, em ambientes bastante diferentes da sala de aula —justamente o espaço onde o aprendizado ocorre. O Brasil demora a repensar estratégias eficazes para formar e qualificar aquele que é, talvez, seu maior investimento no futuro: o professor.