Desde que Trump tomou posse na Presidência, os Estados Unidos passaram a ser vistos menos favoravelmente pelo mundo. Em países como o Canadá, onde o efeito foi particularmente forte, fala-se sobre boicote a produtos fabricados nos EUA.
Essas percepções negativas sobre os Estados Unidos podem afetar significativamente a demanda por suas exportações? De modo geral, essas coisas têm efeito na economia?
A pergunta é interessante porque suas implicações vão além dos conflitos de política externa do momento.
A visão mais cínica é que as pessoas falam, gritam, protestam, mas, nas suas decisões de consumo, opiniões políticas são subjugadas pela preocupação com o dinheiro e suas preferências por produtos específicos. Executivos de empresas podem aplaudir discursos de políticos, mas não vão comprar insumos mais caros.
A visão mais romântica é que o valor que um consumidor atribui a um produto é influenciado por questões morais, políticas e religiosas. Em muitos casos, consumidores não têm preferências tão fortes sobre um determinado produto e modificam suas compras guiados por um sentimento de estar fazendo a coisa certa.
A questão é empírica.
Minha impressão da literatura é que, de modo geral, os dados concordam mais com a segunda visão. Em muitos casos, esses sentimentos afetam de modo significativo as decisões de consumo.
Alguns estudos analisam os efeitos da deterioração da imagem da França nos Estados Unidos quando foi deflagrada a Guerra do Iraque, em 2003. Naquela época, os EUA queriam um mandato da ONU para invadir o Iraque, mas a França se opôs.
Com isso, a França passou a ser vista muito menos favoravelmente nos EUA. “French fries” (batatas fritas) passaram a ser chamadas de “freedom fries” (a palavra liberdade tem um longo histórico de abuso político). Falava-se então de boicote a produtos franceses.
Não é fácil estimar o efeito desses boicotes e, assim, não surpreende que estudos diferentes cheguem a conclusões distintas. Mas minha conclusão dessa literatura é que o boicote parece mesmo ter afetado a compra de produtos franceses nos Estados Unidos.
Em um estudo publicado em 2010, Michaels e Zhi mostram que o comércio bilateral entre França e Estados Unidos caiu relativamente a outros fluxos de comércio e empresas passaram a importar menos bens intermediários da França.
Essa redução no comércio bilateral poderia ter sido resultado de outros fatores ligados à disputa entre Estados Unidos e França. Em estudo publicado em 2016, Pandya e Venkatesan endereçam essa crítica.
Os autores usam dados semanais de milhares de produtos vendidos em supermercados e mostram uma queda nas compras de marcas que parecem francesas. Produtos que nada têm a ver com a França e, portanto, não foram afetados por nenhum aspecto da disputa entre norte-americanos e franceses sofreram uma redução na demanda –especialmente em mercados frequentados por mais cidadãos dos EUA.
A conclusão para o caso atual é que as tarifas impostas pelos Estados Unidos podem ter o curioso efeito de reduzir a demanda por suas próprias exportações. A conclusão mais geral é que nossas decisões que envolvem dinheiro são sim afetadas por nossas opiniões, nossos valores e sentimentos morais.
