As corretoras de investimento especializadas em ativos do exterior foram pegas de surpresa pelas mudanças no IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) na última quinta-feira (22).
Enquanto parte das altas do imposto, com a taxação de fundos multimercado, foi revogada, o governo Lula (PT) manteve oaumento das alíquotas para operações de câmbio, seguro e crédito de empresas, o que afetou fintechs como Avenue, Nomad e Wise.
Até quinta, remessas feitas para a própria conta do titular no exterior quando a finalidade é fazer investimento tinham 0,38% de tarifa. Na primeira versão do decreto, a taxa foi levada a 3,5%, mas, diante da repercussão no mercado financeiro, ficou estabelecida em 1,1%.
O custo de levar moeda estrangeira (seja em espécie ou em cartões associados a contas internacionais) também ficou maior, com a elevação do imposto de 1,1% para 3,5% por transação. As corretoras começaram a repassar as novas taxas já na sexta-feira.
A expectativa das empresas, no entanto, é que mais clientes se interessem por investir em ativos globais diante do foco recém-lançado no segmento.
A Nomad afirmou à Folha que a procura por produtos da fintech teve um “volume muito acima da média” entre quinta e sexta-feira, embora não tenha aberto números por restrições jurídicas. O mesmo aconteceu com a concorrente Avenue, cujo volume de fechamento de câmbio e de remessas para contas no exterior ficou quatro vezes maior do que a média diária.
O movimento, segundo o economista-chefe da Nomad, Caio Fasanella, revela um senso de urgência sobre as operações.
“Essa situação reforça a importância de ter uma carteira diversificada e uma parte relevante dela investida no exterior, em uma moeda forte. No final, quem já fez esse movimento se blindou em partes, e quem não fez vai pagar um pouco mais para fazer”, disse.
Para ele, no desafio de equilibrar as contas públicas, o governo tem demonstrado uma predisposição maior em aumentar as despesas em vez de cortá-las, o que, para a conta fechar, exige maior arrecadação. A consequência dessa postura é de possível aumento na pressão inflacionária e de desvalorização do real.
“Diante disso, a tese de diversificação para moedas fortes fica ainda mais reforçada. Nunca se sabe até quanto vai ficar mais caro, seja em um eventual novo aumento do IOF, seja pela desvalorização do real, que pode levar o cliente a pagar mais para comprar a mesma quantidade de dólares.”
É a mesma visão de João Arthur, CIO (chefe de investimentos) da Suno Wealth. A recomendação dele é por manter o apetite por remessas ao exterior, considerando a alíquota de 1,1%.
“Inclusive, esperamos aumento na demanda por diversificação internacional diante da insegurança gerada pela medida. Essa conjuntura reforça também a importância de planejamento robusto e visão de longo prazo.”
O anúncio atabalhoado das mudanças do IOF instalou um clima de incerteza entre os operadores do mercado. Para alguns analistas, soou como um déjà-vu de outras falhas de comunicação do governo, como os episódios dos descontos no INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), a crise do Pix e o aumento da faixa de isenção do IR (Imposto de Renda). O resultado final é de cautela, sobretudo ao se considerar que a cena fiscal do país segue pressionada.
Para as casas especializadas, os ruídos exigiram um trabalho de esclarecimento de dúvidas para os clientes. Fasanella relata que alguns clientes tiraram o pé do acelerador para entender quais são as consequências do aumento do IOF no portfólio e em eventuais remessas ao exterior.
O mesmo ocorreu na Avenue. Roberto Lee, CEO da fintech, e William Costa, sócio e estrategista-chefe, realizaram uma transmissão ao vivo na sexta-feira para esclarecer dúvidas de clientes e fazer uma análise da conjuntura.
“Esclarecemos que o aumento foi marginal, mas aumentou, e que isso só ressalta a importância de olhar no horizonte lá na frente. É melhor estar seis meses adiantado do que cinco minutos atrasado. Quem enviou remessas até quinta-feira pagou 0,38% de imposto, e quem mandar agora vai pagar 1,1%, e sabe-se lá se essa alíquota pode chegar a 3,5%”, disse Costa.
“Mas já percebemos que, quando há eventos de aversão ao risco, o interesse sobre investimentos cresce. Quando o dólar estava em R$ 6,30, muita gente viu a vantagem de ter um pouco da moeda nas carteiras.”
As fintechs não irão ofertar, por ora, novos produtos ou estratégias para atrair clientes diante do aumento de custo. Além do IOF, as carteiras costumam cobrar uma tarifa entre 1% e 2% pelo serviço de câmbio. A criação da conta global também pode incluir o pagamento de uma taxa de abertura.
Para quem quer comprar dólares, a dica é ir aos poucos, já que não há como prever as oscilações cambiais futuras. Ao parcelar as alocações, o cliente mitiga os riscos de fazer grandes compras em um momento de pico e consegue um “dólar médio”.
“Estamos em um momento extremamente volátil nos mercados globais, e no Brasil sempre acabamos surpreendidos por movimentos desse tipo do governo. Para quem está começando na jornada de diversificação de patrimônio, é importante adotar uma postura conservadora, comprando dólares de forma recorrente e espaçada para chegar a um câmbio médio e não tomar prejuízo em um aporte grande”, diz Fasanella.
Operações internacionais
Operação | Como era | Como fica |
---|---|---|
Cartões de crédito e débito internacionais | 3,38% | 3,5% |
Cartão pré-pago internacional, cheques de viagem para gastos pessoais |
3,38% | 3,5% |
Remessa de recurso para conta do contribuinte brasileiro no exterior para investimento | 0,38% | 1,1% (governo havia previsto 3,5%) |
Compra de moeda em espécie | 1,1% | 3,5% |
Empréstimo externo de curto prazo | Zero | 3,5% |
Transferências relativas a aplicações de fundos no exterior |
Zero | Zero (governo havia previsto 3,5% e recuou) |
Operações não especificadas | 0,38% |
Entrada: 0,38% Saída: 3,5% |