Apenas 0,19% dos profissionais que ingressaram no serviço público federal entre 2014 e 2024 foram reprovados no estágio probatório, segundo dados do Ministério da Gestão e Inovação (MGI). Em média, a cada mil pessoas que entram, apenas duas são eliminadas devido a baixo desempenho durante esse período de treinamento.
Os três primeiros anos da carreira no serviço público devem ser usados para avaliar a produtividade, capacidade de iniciativa e outras características do funcionário antes que ele tenha direito à estabilidade –adquirida apenas ao fim do terceiro ano no cargo.
No entanto, a quantidade reduzida de reprovações mostra que esse recurso não tem sido adotado da forma que deveria, de acordo com Fernando Coelho, professor de administração pública da USP.
“O estágio probatório muitas vezes é uma peça de ficção, uma formalidade para se cumprir com a norma”, afirma.
Segundo o professor, um dos fatores que explicam essa taxa reduzida é a falta de capacidade gerencial dos órgãos públicos para estruturar o estágio probatório, que exige avaliações de desempenho regulares e treinamentos para gestores e servidores.
Além disso, há um receio de desligar servidores com baixo desempenho porque concursos públicos não são frequentes, o que dificulta prever quando será possível repor o profissional dispensado.
“De nada adianta, depois de fazer o concurso, começar a ter erros sucessivos a partir da tomada de posse dos funcionários, que podem ir desde a má alocação dessas pessoas até o desconhecimento de suas competências.”
A ausência de avaliação pode gerar prejuízos a longo prazo, causados pela baixa produtividade do servidor ou a falta de compatibilidade entre ele e o órgão onde atua.
Em fevereiro deste ano, o Ministério da Gestão regulamentou esse mecanismo, para padronizar a avaliação do estágio probatório e ampliar seu uso. Até então, cada órgão tinha seus próprios métodos para dar o parecer aos novos funcionários públicos.
O tempo de duração segue o mesmo (três anos), e agora haverá três avaliações, a primeira ao fim de 12 meses; a segunda, aos 24; e a última, aos 32. Os critérios são cinco: assiduidade, disciplina, capacidade de iniciativa, produtividade e responsabilidade.
A pontuação final será uma média ponderada das avaliações do chefe, dos pares e do próprio funcionário (com pesos 60%, 25% e 15%, respectivamente). Se na equipe não houver no mínimo três pessoas com estabilidade, não há avaliação dos pares.
Para ser aprovado no estágio obrigatório, o funcionário precisa ter uma pontuação de pelo menos 80, em uma escala de 0 a 100. Depois de passar por isso, o funcionário terá estabilidade no serviço público.
O diretor do Departamento de Carreiras e Desenvolvimento de Pessoas do Ministério de Gestão e Inovação, Eduardo Viana Almas, afirma que a ideia é que o servidor tenha algum retorno sobre seu desempenho de seus pares e entenda o que ele precisa melhorar.
“Entendemos que isso dá uma proteção, (a avaliação) fica mais coerente e trabalhada, porque não é uma visão de uma só pessoa, mas, sim, de um grupo”, diz.
Um sistema unificado está sendo desenvolvido para receber as informações das avaliações sobre os estágios probatórios de todos os novos funcionários que estão na administração pública federal –até hoje, não há informações gerais sobre as avaliações porque, até fevereiro, cada órgão tinha seu método de avaliação.
“Com os dados (das avaliações), vamos saber se precisaremos calibrar (os métodos de estabelecer a pontuação de quem está em estágio probatório)” diz Almas.
Haverá indicadores para entender se os objetivos do estágio estão sendo atingidos. Entre eles, a produtividade, que avalia se o novo servidor cumpre as atividades demandadas e tem a competência técnica necessária.
A capacidade de iniciativa é outro critério a ser observado, para verificar se o profissional se põe à disposição do gestor para aprender serviços e ajudar colegas da equipe.
O número de reprovados não deverá aumentar expressivamente, afirma Almas. A ideia do MGI é que esses três primeiros anos sirvam para desenvolver a percepção das pessoas a respeito da importância do que estão fazendo, e não fazer demissões.
“Também achamos que o estágio probatório tem que ser usado de uma forma a separar as pessoas que não estão produzindo, ainda que seja um percentual muito baixo”, diz ele.
O ideal seria que os novos funcionários fossem avaliados por mais critérios, como a capacidade de trabalhar em equipe, e só a partir do segundo ano, afirma Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getulio Vargas.
Durante o primeiro ano, o indivíduo ainda está em aprendizado, ela afirma, mas em dois anos já é possível saber se ele vai se sair bem ou não na máquina pública.
Costin, que foi ministra da Administração e Reforma do Estado, diz que faria sentido que o estágio probatório tivesse um programa semelhante a uma mentoria.
“É sempre bom ter uma pessoa mais experiente que vá orientar esse novo servidor”, afirma.