O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse nesta quarta-feira ter explicado aos presidentes da Câmara e do Senado que o funcionamento da máquina pública ficaria em situação delicada sem o aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) definido pelo governo.
Haddad se reuniu com Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) para discutir a alta do tributo, anunciada pelo governo na semana passada como forma de elevar a arrecadação e equilibrar as contas públicas, em conjunto com um congelamento de gastos públicos.
“São R$ 30 bilhões de cortes de despesas, sendo R$ 10 bilhões de bloqueio e R$ 20 bilhões de contingenciamento, e R$ 20 bilhões de receitas adicionais para cumprir as metas fiscais”, afirmou o ministro.
“Expliquei as consequências em caso de não aceitação da medida [do IOF], o que acarretaria em termos de contingenciamento adicional. Nós ficaremos num patamar bastante delicado do ponto de vista do funcionamento da máquina pública do Estado brasileiro.”
A declaração foi feita a jornalistas a reunião, que aconteceu na residência oficial do Senado com a participação da ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), os presidentes das duas casas e líderes do governo.
O ministro afirmou que não há discussão, por parte da Fazenda no momento, sobre revogar a medida ou outras alternativas. “Eu não vim discutir a revogação. O que está sendo discutido é a revogação pelo Congresso”, disse Haddad.
Não houve compromisso de Motta ou Alcolumbre para de pautar os mais de 20 PDLs (Projetos de Decreto Legislativo) propostos no Congresso para revogar o aumento do imposto. Eles disseram que conversariam com os líderes em reuniões nesta quinta-feira (29).
De acordo com Haddad, foi feito um pedido por parte de Motta e Davi para que o governo apresente medidas de médio e longo prazo “mais estruturantes” para o Orçamento e o gasto primário. Ficou acordado que o governo apresentará em dez dias uma proposta nesse sentido para 2026.
Antes da reunião, Motta classificou o aumento do IOF como infeliz, mas disse não achar bom revogar o decreto do governo e defendeu a adoção de medidas mais estruturantes. Ele citou o grupo de trabalho que discute a reforma administrativa como exemplo. Alcolumbre acusou o governo de usurpar poderes com a medida.
O líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), disse não esperar que os presidentes das casas pautem os PDLs na próxima semana, quando ocorrerá o Fórum Parlamentar do Brics.
Randolfe afirmou que a Fazenda recebeu sugestões dos bancos em reuniões nesta quarta, e também dos presidentes das casas do Congresso, mas não detalhou quais seriam. E que a equipe econômica vai analisá-las.
Já o líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE), disse que a conversa foi de “diálogo”.
“Nesses dois anos de governo, aprendemos que o diálogo é a principal ferramenta na relação do governo com o Congresso. Trabalhamos para construir essa relação de respeito e diálogo. Fico feliz por isso”, disse.
Implementado na semana passada, o aumento do IOF vem sendo alvo de críticas de setores empresariais e de parlamentares. Na Câmara, até mesmo partidos que integram a base aliada do governo indicaram que poderiam votar favorável ao PDL.
ENTENDA A DIFERENÇA ENTRE BLOQUEIO E CONTINGENCIAMENTO
O novo arcabouço fiscal determina que o governo observe duas regras: um limite de gastos e uma meta de resultado primário (verificada a partir da diferença entre receitas e despesas, descontado o serviço da dívida pública).
Ao longo do ano, conforme mudam as projeções para atividade econômica, inflação ou das próprias necessidades dos ministérios para honrar despesas obrigatórias, o governo pode precisar fazer ajustes para garantir o cumprimento das duas regras.
Se o cenário é de aumento das despesas obrigatórias, é necessário fazer um bloqueio.
Se as estimativas apontam uma perda de arrecadação, o instrumento adequado é o contingenciamento.
Como funciona o bloqueio
O governo segue um limite de despesas, distribuído entre gastos obrigatórios (benefícios previdenciários, salários do funcionalismo, pisos de saúde e educação) e discricionários (investimentos e custeio de atividades administrativas).
Quando a projeção de uma despesa obrigatória sobe, o governo precisa fazer um bloqueio proporcional nas discricionárias para honrar todas as obrigações sem descumprir o limite global de gastos.
Como funciona o contingenciamento
O governo segue uma meta fiscal, que mostra se há compromisso de arrecadar mais do que gastar (superávit) ou previsão de que as despesas superem as receitas (déficit). Neste ano, o governo estipulou uma meta zero, que pressupõe equilíbrio entre receitas e despesas, com margem de tolerância de 0,25% do PIB para mais ou menos.
Como a despesa não pode subir para além do limite, o principal risco ao cumprimento da meta vem das flutuações na arrecadação. Se as projeções indicam uma receita menos pujante, o governo pode repor o valor com outras medidas, desde que tecnicamente fundamentadas, ou efetuar um contingenciamento sobre as despesas.
Pode haver situação de bloqueio e contingenciamento juntos?
Sim. É possível que, numa situação de piora da arrecadação e alta nas despesas obrigatórias, o governo precise aplicar tanto o bloqueio quanto o contingenciamento. Nesse caso, o impacto sobre as despesas discricionárias é a soma dos dois valores.