O TCU (Tribunal de Contas da União) deu prazo de cinco dias para a ANM (Agência Nacional de Mineração) explicar por que sua diretoria ignorou um parecer técnico interno e revisou um lance vencedor feito por uma empresa, mantendo a vitória da licitação nas mãos desta mesma companhia.
A decisão foi tomada nesta quinta-feira (29) pelo ministro do TCU Aroldo Cedraz. Relator do processo, Cedraz pediu à agência que envie informações sobre os atos praticados na condução do Leilão da 8ª Rodada de Disponibilidade de Áreas, feito no ano passado, o que poderá levar à suspensão dos contratos firmados.
O caso foi revelado pela Folha. Como mostrou a reportagem publicada em 11 de maio, a decisão da diretora, que foi tomada no fim do ano passado, favoreceu a empresa 3D Minerals, que participava de uma disputa para explorar uma área de cobre no município de Parauapebas, no Pará.
O leilão ocorreu por meio de um modelo fechado, em que o concorrente desconhece a proposta de outros. A empresa mineira 3D Minerals Ltda. registrou, no sistema da agência, uma proposta de R$ 37.576.100,00 pela área.
Uma semana depois, quando os lances foram abertos, a 3D Minerals foi declarada vencedora, mas com uma proposta dezenas de vezes superior à do segundo colocado, que havia oferecido R$ 890 mil pela área. A 3D Minerals, então, alegou que cometeu um “erro de digitação” em sua proposta, tendo digitado “um zero a mais”, o que multiplicou o valor por dez. Em vez de R$ R$ 37.576.100,00, a empresa sustentou que sua oferta, na realidade, seria de R$ 3.756.100,00.
Os técnicos da Superintendência de Ordenamento da ANM e os membros da comissão de edital analisaram o pedido e as justificativas da empresa, mas rejeitaram a mudança no lance dado e a anulação da proposta registrada. As regras do edital determinam que “a proposta financeira ofertada não poderá ser objeto de desistência ou alteração”.
Todas as empresas também tiveram cerca de uma semana de prazo, entre o registro do lance e a abertura das propostas, para fazer qualquer tipo de mudança ou revisão que entendesse necessária, o que não ocorreu.
Os argumentos não convenceram a maioria dos diretores da agência. Em seu voto sobre o caso, o diretor da ANM e relator do caso, Caio Mário Trivellato Seabra Filho, decidiu que a empresa teria, de fato, cometido um erro e digitado um zero a mais na proposta, o que lhe custaria mais de R$ 33 milhões.
Por isso, decidiu revisar o valor da nova proposta sob a justificativa de que estava “acatando a boa-fé do licitante na condução dos trabalhos”. O diretor da agência argumentou, ainda, que naquela mesma rodada de áreas os diretores já tinham revisado um caso semelhante, que envolvia a empresa Zeus Mineração. Assim, para manter a isonomia, era preciso seguir o mesmo entendimento no caso da 3D Minerals.
Em seu despacho, o ministro Aroldo Cedraz pede que a ANM faça “esclarecimentos que julgar pertinentes e necessários acerca das possíveis irregularidades” e explique os fundamentos jurídicos e técnicos que embasaram a decisão de aceitar as propostas reduzidas das empresas 3D Minerals e Zeus Mineração.
Cedraz quer saber, ainda, se há urgência ou risco de prejuízo à ANM com eventual suspensão da emissão das autorizações de pesquisa. O Tribunal alerta que poderá vir a determinar a suspensão cautelar da licitação, caso as irregularidades apontadas não sejam devidamente sanadas.
A decisão também dá o mesmo prazo de cinco dias para as empresas 3D Minerals e Zeus Mineração se manifestarem sobre o assunto, caso queiram.
Quando a mudança de preço ocorreu, os técnicos da ANM argumentaram que a revisão de lances após a abertura das propostas poderia abrir um precedente perigoso para novos casos em que o vencedor de leilões decida revisar o valor dado inicialmente.
Nos dois casos, as decisões finais foram rejeitadas pelo diretor-geral da ANM, Mauro Henrique Moreira Sousa, mas seu voto acabou vencido pelos demais diretores, que acompanharam a tese do relator. A ANM enfrenta uma fase de dificuldades financeiras, que limitam a sua capacidade de fiscalização e monitoramento do setor mineral.
O despacho de Cedraz decorre de uma representação feita pelo subprocurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Lucas Rocha Furtado, a partir da reportagem. “Entendo que se está diante de indícios de descumprimento de normas editalícias, mostrando-se necessária a atuação deste tribunal frente a tais fatos”, diz Furtado.