O governo Trump suspendeu parte das exportações de tecnologias críticas dos Estados Unidos para a China —incluindo motores a jato, semicondutores, produtos químicos e maquinários— em resposta às restrições impostas por Pequim à venda de minerais raros aos EUA. Segundo duas fontes com conhecimento do assunto, a decisão chinesa ameaçava paralisar cadeias de suprimentos de empresas americanas.
As novas restrições aproximam as duas maiores economias do mundo de uma guerra declarada de cadeias produtivas, com Washington e Pequim tentando usar seu poder sobre insumos essenciais como arma em uma escalada do conflito comercial.
O impasse crescente pode impactar profundamente setores que dependem de tecnologias estrangeiras, como o de aviões, veículos autônomos e chips.
A medida também pode atrapalhar os esforços para encerrar a disputa tarifária entre os dois países. No dia 12 de maio, negociadores concordaram em reduzir as tarifas aplicadas mutuamente por 90 dias, enquanto buscavam um acordo mais duradouro.
Na época, o secretário do Tesouro, Scott Bessent, disse que “ambas as delegações concordaram que nenhum dos lados queria um rompimento completo”. Ainda assim, a Casa Branca continua aplicando sanções contra Pequim.
Nesta quarta-feira (28), o secretário de Estado Marco Rubio anunciou que os EUA vão “revogar agressivamente” vistos de estudantes chineses que atuam em áreas sensíveis ou tenham vínculos com o Partido Comunista Chinês.
Desde o acordo tarifário de maio, Washington esperava que Pequim aliviasse suas restrições à exportação de minerais críticos. Mas o governo Trump avalia que os avanços foram limitados.
Nos últimos dias, segundo uma das fontes, Pequim retomou parcialmente os embarques de terras raras e ímãs industriais, mas de forma controlada. Empresas americanas seguem preocupadas com o acesso a esses insumos.
Troca de embargos
Em abril, a China havia suspendido a exportação de minerais e ímãs usados por montadoras, fabricantes aeroespaciais, empresas de semicondutores e contratadas do setor de defesa. O governo chinês justificou a medida como parte da criação de um novo marco regulatório.
A iniciativa foi uma resposta direta ao aumento das tarifas americanas em abril, quando Trump elevou as taxas sobre produtos chineses para um mínimo de 145%, após represálias de Pequim a tarifas anteriores. O então presidente já havia imposto barreiras a dezenas de países, sob o argumento de práticas comerciais desleais.
As novas restrições dos EUA fazem parte de uma revisão mais ampla do Departamento de Comércio sobre exportações estratégicas para a China. A análise é conduzida pelo Bureau of Industry and Security, responsável por conceder licenças para vendas de produtos com valor militar ou estratégico.
Segundo uma fonte com conhecimento direto do tema, que pediu anonimato, o departamento suspendeu algumas licenças que permitiam a venda de componentes para a COMAC, estatal aeroespacial chinesa que fabrica o jato C919.
O Departamento de Comércio não comentou o caso.
Peças americanas são cruciais
Lançado em 2023, o C919 é comparável ao Boeing 737 e ao Airbus A320. Muitos de seus sistemas —como motores e equipamentos de controle— são fornecidos por empresas dos EUA e da Europa.
Analistas apontam que a China ainda levará anos para produzir aviões em escala suficiente, e continuará dependente de fabricantes como Boeing, Airbus e GE Aerospace.
O governo Trump também parece ter interrompido exportações de softwares usados no design de chips, fornecidos por empresas como Cadence, Synopsys e Siemens.
Apesar do clima de hostilidade, a China ainda figura entre os principais parceiros comerciais dos EUA. Mas ambos os lados passaram a ver o outro como fonte instável de produtos estratégicos.
Os EUA vêm expandindo suas restrições ao compartilhamento de tecnologias avançadas com a China e limitaram os investimentos americanos em empresas chinesas de tecnologia. Recentemente, Trump bloqueou mais vendas de chips de inteligência artificial e estuda ampliar a lista de empresas chinesas proibidas.
Pequim, por sua vez, tenta reduzir sua dependência de insumos estrangeiros, para resistir a sanções, conflitos armados ou outras ameaças. O país investe fortemente para dominar setores como veículos elétricos, refino de minerais e turbinas eólicas — e sua enxurrada de exportações baratas derrubou concorrentes nos EUA e em outros países.
O bloqueio chinês às terras raras acendeu um alerta entre políticos e empresários sobre a vulnerabilidade dos EUA diante da China. Embora Pequim já tenha usado seu domínio sobre cadeias produtivas em disputas anteriores —como o embargo às exportações para o Japão em 2010—, esta é a primeira vez que impõe uma restrição tão severa aos Estados Unidos.
A China critica as sanções americanas e tenta se posicionar como defensora das regras do comércio internacional. Nesta terça, o governo chinês reuniu empresas do setor de chips da China e da Europa para discutir parcerias e explicar como obter licenças para importar terras raras, segundo a imprensa estatal.
Em nota, o Ministério do Comércio chinês afirmou que a cadeia global de suprimentos de chips enfrenta “desafios severos” e que Pequim “rejeita firmemente o unilateralismo e o bullying”.