Há males que vêm para um mal menor, deve estar pensando Fernando Haddad. Se tiverem noção do perigo e algum senso de realidade político-econômica, assim deveriam estar pensando o restante do governo Lula e o PT, que faz uns dois anos se dedicam a fritar o ministro da Fazenda e seus planos moderados de consertar as contas públicas.
A revolta contra o IOF ofereceu a oportunidade de o governo fazer remendão mais duradouro no déficit. Se der certo, o governo poderia empurrar com a barriga um tumulto fiscal ou também político até 2027, quando a pindaíba será certa.
Difícil é acreditar que passe alguma medida “estruturante”, esse palavrão com que o mundo político ora enche a boca. Cortar isenção de imposto, Fundeb, o que seja, nunca esteve na pauta do mundo político.
Sim, empurrar com a barriga. Dificuldades sérias começaram a aparecer antes do previsto. Se não fosse assim, o governo não aumentaria um imposto ruim, o IOF, a fim de arrumar R$ 40 bilhões por ano (afora a contenção considerável de despesa).
Em resumo, a revisão bimestral de gastos de maio deixou muito claro que o governo corre o risco de não cumprir a meta fiscal, em 2025 ou em 2026, ou pode vir com a ideia de alterar de novo o arcabouço fiscal, o que seria ainda pior.
Qual o problema? Convém lembrar de meados de 2024, quando o governo mexeu na meta recém-nascida e viu o início da revolta contra impostos. As condições financeiras (dólar, juros etc.) começaram a mergulhar no vinagre. Considerem novembro de 2024, quando Lula, ministros próximos e o PT deceparam o plano Haddad, o que contribuiu para o pânico financeiro de dezembro.
“Então”, como se diz em São Paulo para começar conversa desconfortável ou desagradável ou para “dar a real” para alguém. Um novo sururu fiscal poderia dar em mais besteira. A situação ficaria ainda mais difícil em ambiente de campanha eleitoral.
O prestígio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva continua nas profundas, diz a pesquisa Quaest-Genial. É tão temerário tentar explicar os motivos da baixa quanto especular o que daria um lustro na avaliação presidencial. Sabe-se que, entre dezembro e janeiro, a nota de Lula caiu muito e para níveis inéditos neste século luliano. Foi depois da revolta das mentiras do Pix, do pânico de dezembro e de novo pico da inflação de alimentos. Se foi por causa disso, difícil dizer.
Para 48%, a economia piorou (para 30%, está na mesma). É menos do que os 56% de março, mas mau humor maior do que o de todas as outras pesquisas sob Lula 3. A economia, seja lá o que se entenda por isso, não piorou: emprego, salário médio, pobreza, valor e extensão de benefícios sociais, crescimento, tudo melhorou. É a melhor situação em 14 anos.
Para 48%, Lula não é “bem-intencionado” (ante a mínima de 37% em agosto de 2023). Para 61%, o país está na “direção errada”. Algo se quebrou. Dá para consertar? Se não sabemos explicar a piora, difícil especular sobre melhora. Talvez a isenção do IR cole, quem sabe mais um ou outro ponto de prestígio se possa recupere com vale-gás, conta de luz grátis ou outro programa luliano qualquer.
Na contramão, há o risco de a economia e emprego perderem ritmo daqui até o fim de 2026, com inflação ainda desconfortável. O perigo aumentaria com um tumulto causado por problemas fiscais. Última chamada para o governo tentar fazer um seguro. Se o Congresso deixar.