A Latache Capital, acionista da BRF, solicitou à CVM (Comissão de Valores Mobiliários) o adiamento da assembleia geral da companhia, convocada para 18 de junho, em que será votada a proposta de incorporação total por sua controladora, a Marfrig.
Ambas as empresas estão em processo de fusão. Em maio, a Marfrig informou que vai incorporar todas as ações de emissão da BRF ainda não detidas pela companhia. O negócio dará origem à MBRF, um negócio global do setor de carnes e alimentos processados com receita de R$ 152 bilhões ao ano.
Na petição, protocolada pela Latache, a gestora também pede a interrupção da convocação por até 15 dias e a apuração de eventuais ilegalidades no processo.
No centro dessa discussão, está o movimento acionário feito por Marcos Molina, sua mulher e uma empresa supostamente vinculada a eles. Fundador da Marfrig, Molina é hoje presidente do conselho.
Desde que as negociações pela fusão começaram após uma compra agressiva de ações da BRF pela Marfrig, esse grupo também passou a adquirir mais papéis da própria Marfrig, segundo a reclamação da gestora.
O valor estimado, de cerca de R$ 400 milhões, compreende a compra de 21,1 milhões de ações somente entre o quarto trimestre de 2024 e o primeiro trimestre deste ano.
Embora Molina tenha elevado pouco sua participação acionária nesse período —ele comprou somente 16 mil ações—, sua mulher, Márcia Marçal Molina dos Santos, passou de 39,6 milhões de ações para 59,4 milhões no período e a empresa MMS, outros 1,4 milhão de papéis.
O Painel S.A. apurou que a CVM já acionou a companhia e o empresário.
O movimento de compra de ações de Molina, no entanto, é público. Desde o ano passado, o empresário anunciou que ampliaria sua participação. Em janeiro de 2023, ele já detinha 65% das ações.
Nos bastidores, executivos envolvidos nessas discussões, consultados sob anonimato, afirmam que a Latache lança dúvidas sobre um movimento já conhecido tendo virado acionista após o anúncio da incorporação dos papéis da BRF.
Danos aos minoritários
Ainda segundo a Latache, a fusão, da forma como está sendo planejada, pode representar significativa transferência de valor dos acionistas minoritários da BRF para o controlador da Marfrig.
Isso porque a relação de troca de ações proposta (0,8521 ação da Marfrig para cada ação da BRF), é considerada desproporcional frente a um laudo realizado, que indicaria relação superior a 2,26 ações. Ou seja: as ações da Marfrig estariam superestimadas no momento em que Molina amplia sua fatia no negócio.
Outro ponto destacado é a proposta de distribuição de dividendos apenas aos acionistas que permanecerem na BRF após a operação, o que, segundo os autores, fere o princípio de isonomia entre acionistas.
Vínculos
A petição também aponta omissão na divulgação de documentos relevantes, como um parecer elaborado pelo JP Morgan para a Marfrig, e questiona a independência dos comitês responsáveis pela negociação, citando vínculos societários entre seus membros e o controlador.
A Latache alega que a falta de transparência e os potenciais conflitos de interesse comprometem a legalidade da assembleia e solicitou que a CVM tome providências antes da deliberação.
A CVM ainda não se pronunciou sobre o caso e não comenta casos específicos. A Latache confirmou a reclamação à CVM, mas não quis se manifestar.
Consultados, Molina e a Marfrig disseram que não comentam processos da CVM em andamento.
Com Stéfanie Rigamonti