A resistência dos investidores globais contra a dívida pública de longo prazo está transformando o que normalmente seria um leilão rotineiro de títulos dos Estados Unidos em um dos eventos mais aguardados em Wall Street nesta semana.
O Tesouro dos EUA deve vender US$ 22 bilhões (R$ 122,52 bilhões) em títulos do governo de 30 anos na quinta-feira (12), parte de suas captações regulares. Os resultados, no entanto, receberão atenção especial, pois oferecerão uma leitura instantânea da amplitude da demanda do mercado em um momento em que o apetite dos investidores por dívida de 30 anos dos EUA azedou.
“Todos os leilões serão vistos pela lente de um teste de sentimento do mercado”, avaliou Jack McIntyre, gestor na Brandywine Global Investment Management. “Parece que os Treasuries de 30 anos dos EUA são os menos apreciados de todos.”
Os rendimentos da dívida global de longo prazo dispararam nas últimas semanas, conforme a preocupação com o aumento da dívida e dos déficits levou alguns investidores a evitar os títulos e outros a exigir um prêmio mais alto pelo risco de emprestar aos governos.
Os rendimentos dos títulos de 30 anos dos EUA atingiram uma máxima de quase duas décadas, de 5,15%, no mês passado. E mesmo a 4,97% na sexta-feira (6), ainda estavam mais de 0,5 ponto percentual acima dos níveis observados em março.
Rendimentos mais altos significam pressão de financiamento em um momento em que os EUA estão tomando mais empréstimos e os gastos do governo continuam desenfreados. A versão aprovada pela Câmara do projeto de lei de impostos e despesas do presidente Donald Trump, segundo algumas previsões, adicionará trilhões de dólares aos déficits orçamentários dos EUA nos próximos anos. A Moody’s Ratings rebaixou sua nota de crédito para os EUA no mês passado.
“Estamos em uma tendência fiscal preocupante”, disse Fred Hoffman, ex-gestor de fundos que se voltou para a academia há cerca de sete anos e agora é professor de finanças na Rutgers Business School.
Hoffman afirmou que monitorará os resultados do leilão nesta semana, enquanto estiver em sua casa de férias em Martha’s Vineyard. Detalhes como o “tail” do leilão —em que os rendimentos se estabilizam em relação ao nível de emissão— e a extensão em que as ordens excedem o montante da dívida à venda vão oferecer pistas sobre a demanda. A participação estrangeira também estará sob os holofotes.
“Se este leilão e os próximos leilões continuarem a fracassar com tails ruins e proporções horríveis de oferta/cobertura, então teremos um problema”, avaliou Hoffman.
A fraca demanda por um leilão de títulos de 20 anos em 21 de maio —não um dos favoritos dos investidores— foi suficiente para fazer os rendimentos dispararem naquele dia. Um desempenho semelhante para o título de 30 anos, uma referência global, seria ainda mais preocupante.
O Tesouro também leiloará US$ 39 bilhões em dívida de 10 anos nesta quarta-feira (11).
Para deixar claro, ninguém está levantando a possibilidade de um chamado leilão fracassado, e há mecanismos de apoio incorporados no processo para ajudar a evitar grandes disfunções. Uma rede de cerca de duas dezenas de corretores primários é obrigada a participar em todos os leilões.
“DESCONECTANDO-SE”
Para muitos, porém, o panorama geral é de rendimentos de longo prazo elevados no futuro próximo, mesmo que a perspectiva para títulos de curto prazo melhore à medida que o Fed (Federal Reserve, o BC dos EUA) se aproxima de cortar as taxas de juros.
Greg Peters, codiretor de investimentos da PGIM Fixed Income, afirmou que é mais seguro evitar Treasuries de longo prazo, visto que eles estão cada vez mais vinculados a forças políticas do que à política monetária.
“Veja o que está acontecendo no mercado de títulos de longo prazo: ele está se tornando desconectado”, disse Peters, que supervisiona US$ 862 bilhões em ativos, em entrevista à Bloomberg TV na sexta-feira (6). “Está sendo impulsionado pelo prêmio de risco, pela política e por todos esses outros fatores.”
Os rendimentos recuaram “à medida que as preocupações com o crescimento ressurgiram, mas o panorama geral é que eles estão em uma trajetória ascendente de longo prazo enquanto a contenção fiscal continuar sendo uma noção antiquada, como parece ser em países ao redor do mundo”, disse Simon White, estrategista macro da Bloomberg.