Após dois dias de negociações tensas, Estados Unidos e China parecem ter recuado da beira de um conflito econômico devastador —ao menos por enquanto.
Autoridades dos dois países chegaram a um acordo informal nas primeiras horas da quarta-feira (11), em Londres, para retirar algumas das medidas prejudiciais que vinham adotando, em um confronto que se intensificou rapidamente nos últimos meses.
Ainda não está claro se a trégua vai se sustentar ou desmoronar como a que foi firmada em maio. Mesmo que o acordo se prove duradouro, seu principal feito parece ser apenas restaurar o cenário de alguns meses atrás, antes de Trump elevar as tarifas sobre produtos chineses em abril, aumentando as tensões.
“Parece que estamos negociando em círculos”, diz Myron Brilliant, conselheiro do DGA-Albright Stonebridge Group e ex-vice-presidente executivo da Câmara de Comércio dos EUA.
“Você escala, depois recua”, acrescenta. “No fim das contas, não avançamos de fato.”
Com as negociações desta semana, as tarifas permanecem nos níveis atuais. Poucos detalhes foram divulgados, além da provável reversão de políticas agressivas adotadas desde maio.
A expectativa é que a China afrouxe restrições à exportação de minerais essenciais para fabricantes norte-americanos. Em troca, os EUA devem aliviar limites impostos às suas próprias exportações de tecnologia e produtos, além de recuar em ameaças de cancelar vistos de estudantes chineses.
As conversas não avançaram em outros temas comerciais, que devem ficar para discussões futuras, segundo autoridades americanas.
Para muitos analistas, as reuniões em Londres levantaram dúvidas sobre os ganhos reais da estratégia agressiva adotada por Trump nos últimos meses —e se ela acabou saindo pela culatra.
“O que estamos conseguindo agora que já não conseguíamos antes?”, questiona Veronique de Rugy, pesquisadora do Mercatus Center, um centro de estudos libertário. “Esse acordo sugere que nunca houve um plano real.”
Funcionários da administração Trump argumentam que os EUA saíram fortalecidos da escalada recente, com medidas punitivas em resposta às restrições chinesas sobre exportações de terras raras. Nas últimas semanas, os EUA limitaram o acesso chinês a softwares, produtos químicos e tecnologias importantes, como os usados na fabricação de chips avançados e motores a jato.
O governo também tem apontado a força da economia americana e a inflação controlada para sustentar que até tarifas elevadas tiveram pouco efeito negativo.
Outros analistas são menos otimistas. Em relatório recente, o Banco Mundial afirmou que as tarifas dos EUA criam as bases para a década de menor crescimento global desde os anos 1960.
Trump afirmou nas redes sociais, na manhã de quarta, que o acordo com a China está feito e que o “relacionamento está excelente”, embora tenha reconhecido que o pacto ainda precisa de aprovação final dele e de Xi Jinping.
“Todos os ímãs e quaisquer terras raras necessárias serão fornecidos, antecipadamente, pela China”, escreveu, em letras maiúsculas. “Da mesma forma, nós forneceremos o que foi acordado, inclusive o uso de nossas universidades por estudantes chineses (sempre achei isso ótimo!).”
As discussões em Londres se estenderam por dois dias e noites intensas, e foram marcadas por momentos de tensão, segundo fontes com conhecimento das reuniões —um sinal da profunda desconfiança entre os dois governos.
Howard Lutnick, secretário de Comércio dos EUA que participou das negociações, afirmou que o objetivo principal do presidente em relação à China é “reduzir o déficit comercial e ampliar as trocas”.
“Mas primeiro era preciso tirar a parte negativa do caminho”, disse ao fim das conversas. “Agora podemos tentar construir um comércio positivo, em crescimento e benéfico para os dois países.”
Analistas afirmam que os acontecimentos recentes mostram que os EUA podem ter exagerado nas apostas contra a China. A economia americana tem necessidade urgente dos minerais e ímãs fornecidos por Pequim, e as restrições chinesas forçaram montadoras e outras indústrias a pressionar a Casa Branca, diante da ameaça de escassez até em equipamentos militares.
As limitações impostas pelos EUA também prejudicam a economia chinesa. Mas, segundo especialistas, também afetam os próprios americanos.
Philip Luck, do CSIS (Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais), diz que o controle dos EUA sobre exportações de etano para a China foi particularmente desastroso: grandes empresas de energia tiveram de interromper bilhões em exportações planejadas, enquanto as fábricas chinesas passaram a usar combustíveis alternativos, mais caros, mas ainda viáveis.
“Essas medidas não passam nem pelo critério mínimo de uma arma econômica eficaz”, escreve. “Além de prejudicar mais os produtores americanos que os chineses, enfraquecem a própria agenda energética dos EUA e sinalizam aos aliados que o país não é confiável nem nos mercados mais neutros.”
Ilaria Mazzocco, também do CSIS, diz que a abordagem americana partiu da ideia de que “a China cederia rapidamente à pressão”, já que sua economia voltada à exportação dava sinais de fraqueza.
“O que a China provou é que, na verdade, está numa posição bastante forte e pode aguentar muita dor — talvez até mais que os EUA”, afirma. Segundo ela, o país também demonstrou capacidade de usar o controle de exportações para pressionar os EUA como nunca antes.
Jin Canrong, professor da Universidade Renmin, escreve que as terras raras são “um trunfo nas mãos da China”.
“Trump deveria entender que pressão e ameaças não são o caminho certo para lidar com a China”, diz.