Os Correios vão receber R$ 4,03 milhões pelo atendimento prestado a beneficiários do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) que sofreram descontos indevidos de mensalidades associativas.
O contrato prevê o pagamento de R$ 7,90 por atendimento e foi pactuado sob a justificativa de agilizar o serviço para a população prejudicada pelas fraudes, mas também representa uma receita adicional para os Correios num momento em que a estatal enfrenta dificuldades financeiras.
Segundo o INSS, 510 mil contestações foram feitas por meio do serviço postal. O número total de atendimentos, por sua vez, é maior (mais de 900 mil), mas a remuneração será devida apenas nos casos ligados aos descontos associativos indevidos.
A decisão do INSS de terceirizar parte do atendimento aos beneficiários enfrenta críticas internas. Representantes do órgão avaliam que o próprio instituto deveria fazer uma força-tarefa e abrir as agências em horário estendido para prestar o serviço à população.
Hoje, no entanto, parcela significativa dos servidores do órgão trabalha de forma remota e resiste a retomar as tarefas presenciais. Por isso, integrantes do governo defensores da solução via Correios afirmam que forçar o atendimento presencial nas agências próprias do INSS poderia ampliar a crise e levar até mesmo a uma greve.
Procurados, INSS e Correios responderam à Folha com um comunicado idêntico. A nota confirma que o atendimento vem sendo prestado por meio de um contrato no âmbito do programa Balcão do Cidadão (que também aceita pedidos de auxílio-doença via Atestmed), mas não informa os valores envolvidos.
“O contrato prevê repasses do INSS aos Correios para viabilizar a prestação do serviço, conforme as condições previamente estabelecidas. A implantação do novo atendimento foi realizada com base na infraestrutura já existente, sem gerar custos adicionais para os Correios”, diz o comunicado.
Os Correios estão sob pressão diante da sequência de prejuízos crescentes acumulados pela empresa. A estatal saiu de um resultado negativo de R$ 633,5 milhões em 2023 para um prejuízo de R$ 2,6 bilhões no ano passado.
Apenas nos três primeiros meses de 2025, os Correios já tiveram um saldo negativo de R$ 1,7 bilhão, mais que o dobro do acumulado no primeiro trimestre de 2024 (R$ 801,2 milhões).
A empresa enfrenta um cenário de queda brusca de receitas, sem que consiga ajustar suas despesas na mesma velocidade.
Segundo as demonstrações contábeis da companhia, o recuo em seu faturamento é puxado pelos serviços de postagem internacional, cujas receitas caíram 12% no ano passado. No primeiro trimestre de 2025, a queda se acentuou e foi de 58,4% em relação a igual período de 2024.
Desde o lançamento do Remessa Conforme, programa da Receita Federal que facilita o desembaraço aduaneiro de mercadorias importadas via empresas de comércio eletrônico que aderem ao programa, os Correios deixaram de ser a porta de entrada de pequenas encomendas, o que impactou suas receitas.
A implementação da medida surtiu efeitos fiscais positivos para o governo, que passou a arrecadar mais com a chamada “taxa das blusinhas” ao extinguir a isenção sobre mercadorias de até US$ 50 adquiridas por pessoas físicas. No entanto, para os Correios, o saldo foi a perda repentina de receitas.
Por outro lado, a estatal tem tido aumento de despesas. Em 2024, seus custos de operação subiram 4,7%, puxados pelos gastos com pessoal, que tiveram alta de 8,1%. O balanço do primeiro trimestre deste ano mostra que a tendência permanece, com aumento de 9,1% nas despesas com pessoal e de 3,2% nos custos em geral.
Em maio deste ano, ao anunciar os resultados de 2024, os Correios anunciaram um plano para reduzir R$ 1,5 bilhão em despesas ainda em 2025. A estatal lançou um PDV (Programa de Desligamento Voluntário) e determinou que todos os funcionários devem retornar ao trabalho presencial a partir de 23 de junho.
A empresa também otimizou sua malha aérea para transportes, com redução de cinco linhas e quatro trechos. Segundo a estatal, a medida gera uma economia de R$ 1 milhão por dia, “sem prejuízo à qualidade e à eficiência das operações”.
Os Correios também estão em tratativas com o NDB (Novo Banco de Desenvolvimento), conhecido como Banco do Brics, para obter um financiamento de R$ 3,8 bilhões para seu projeto de modernização. O recurso, a ser liberado ao longo de cinco anos, tende a ser um fôlego importante para a empresa neste momento.
Membros do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também têm se engajado na discussão de alternativas para melhorar a situação de caixa dos Correios. No início do ano, a secretária de Coordenação e Governança das Empresas Estatais, Elisa Leonel, disse que a situação da empresa demandava atenção do Executivo.
O principal temor, no governo e na companhia, é que os Correios continuem perdendo receitas e caiam numa situação de dependência do Tesouro Nacional, quando a empresa precisa recorrer a recursos de seu controlador (no caso, a União) para arcar com despesas correntes (como pagamento de pessoal).
Neste caso, a empresa seria incorporada ao Orçamento Federal e passaria a conviver com limites de remuneração para empregados e também para realizar investimentos.
Hoje, os Correios são uma empresa independente, mas interlocutores reconhecem que é preciso agir para evitar o risco de uma situação mais adversa. A Telebras, por exemplo, se tornou dependente no passado e agora esbarra na falta de espaço no Orçamento para realizar investimentos.