O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) tem maioria em julgamento virtual para unificar as regras da perícia para concessão do BPC (Benefício de Prestação Continuada) a pessoas com deficiência no INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) e na Justiça.
O BPC é um benefício assistencial no valor de um salário mínimo pago pela Previdência Social a idosos acima de 65 anos e pessoas com deficiência que fazem parte de famílias consideradas de baixa renda.
Para recebê-lo, além de comprovar renda per capita —por pessoa da família— igual ou inferior a um quarto do salário mínimo, o beneficiário com deficiência precisa passar por perícia médica. No INSS, essa perícia é mais ampla, considerando também as condições sociais, e chamada de perícia biopsicossocial.
A proposta de unificação da perícia biopsicossocial é do ministro Luís Roberto Barroso, presidente do CNJ. A intenção é que normas sejam as mesmas nos dois órgãos, diminuindo a judicialização, que tem sido apontada pelo Ministério da Fazendo do governo Lula como um fator de pressão das contas públicas.
A Justiça vem avançando nas decisões favoráveis aos segurados que entram com ação para a concessão do BPC e tem concedido a renda mesmo nos casos em que a perícia não considera haver deficiência nem incapacidade para a vida social e laboral.
“É recomendável a adoção de instrumento de avaliação comum entre as esferas judicial e administrativa, até para facilitar a identificação de eventuais divergências”, diz o relatório de Barroso, que tem como base trabalho realizado por grupo formado em 2024 para avaliar a concessão do BPC.
O voto de Barroso foi seguido por 11 ministros do CNJ. Faltam manifestação de apenas três deles. O julgamento deve terminar na segunda-feira (30).
O ministro contesta, no entanto, a afirmação de que a Justiça tem sido condescendente nas concessões. “Dados extraídos do portal Justiça em Números confirmam que as concessões judiciais de BPC a PCDs aumentaram no período de 2020 a 2024, mas não indiscriminadamente, e sim de forma consentânea com o ritmo de crescimento das concessões administrativas”, diz em seu relatório.
O problema seria o aumento no número de pedidos a partir de 2020.
Os números mostram que o total de casos judiciais novos quase quadruplicou entre 2020, com 153.049 ações, e 2024, com 587.775. “O número de julgamentos também quadruplicou, conforme o aumento da demanda: 121.536 em 2020 contra 485.529 em 2024”, afirma no documento.
O percentual de pedidos considerados procedentes caiu de 29%, em 2020, para 23%, em 2024. Se aprovada, a unificação deve começar a valer em 2 de março de 2026. No caso do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), que já tem sistema próprio de perícia unificada, a mudança deveria ocorrer em 60 dias após a decisão.
Para a professora da FGV (Fundação Getulio Vargas) e advogada Tonia Galetti, do escritório Tonia Galetti Advocacia, a medida tem dois lados. “Por um lado , traz mais segurança jurídica para a sociedade como um todo, ainda que o segurado receba ao final, um ‘não’. Mas há também a possibilidade de ‘sim’ após ter tido uma negativa do INSS”, diz.
“Agora, se a gente pensar nos erros que são cometidos de forma geral na perícia e o juiz só olhar para esse recorte [de que as regras da perícia são as mesmas], fica difícil”, afirma ela, lembrando que o juiz não precisa necessariamente se basear na perícia médica para conceder a renda. Assim como no INSS, ele também pode olhar para a questão social.
Segundo a lei do BPC, deve ser considerada pessoa com deficiência “aquela cuja deficiência a incapacita para a vida independente e para o trabalho”, e incapacidade é “fenômeno multidimensional que abrange limitação do desempenho de atividade e restrição da participação, com redução efetiva e acentuada da capacidade de inclusão social”.
Em seu relatório, o ministro Barroso considera a definição da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência para indicar o que a perícia judicial deve considerar.
Seu texto diz que pessoas com deficiência são “aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas”.
Dados da Previdência mostram que, em 2024, o BPC foi pago a 6,4 milhões de pessoas —um crescimento de 10% contra um ano antes, quando já havia registrado avanço de 11% frente ao ano anterior.