/ Jun 29, 2025

STF mirou nas big techs e acertou na internet inteira – 29/06/2025 – Ronaldo Lemos

Com a decisão do STF sobre o Marco Civil da Internet o Brasil passa a ter um regime de responsabilidade confuso. São 4 tipos de responsabilidade que o Supremo definiu. Como diz a oração da serenidade: “Dai-nos a sabedoria para distinguir” qual será o regime aplicável em cada caso concreto.

A decisão aplica-se tanto às big techs quanto a pequenos e microprovedores de aplicação. Do Google ao Reclame Aqui, passando por fóruns e caixas de comentários dos jornais, todos estão abrangidos. Lembrando que na lei europeia, que inspirou o Supremo, o regime de responsabilização aplica-se sobretudo às plataformas com mais 45 milhões de usuários mensais. No Brasil será para tudo. Mirou nas big techs e acertou toda a internet.

Há muitas incertezas. Por exemplo, qual é o regime dos marketplaces (Mercado Livre, OLX e outros)? A decisão apenas diz que se aplicará o Código de Defesa do Consumidor, o que não esclarece nada.

A decisão abrange também “chatbots”, que dizem respeito a inteligência artificial. O que é estranho. Chatbots são tecnologias de inteligência artificial, diferentes de redes sociais. Isso cria imprevisibilidade. Textos normativos não são narrativas nem descrições. São prescrições. Têm impacto na vida de milhões de pessoas. Não dá para ser imprudente nos conceitos.

O STF diz que as novas regras afastam a “responsabilidade objetiva”. No entanto, criam um regime de “presunção de responsabilidade” que parece ser a mesma coisa. Quais as diferenças? Não está claro.

A decisão pode também levar à remoção massiva de conteúdos, bastando uma simples notificação. Foi o que aconteceu na Europa. Só em 2024, foram 9,4 bilhões de justificativas de remoção reportadas. 87,5% dos conteúdos removidos eram totalmente legítimos, como apontou estudo da Universidade Vanderbilt. Em 2025 já são 9 bilhões de justificativas de remoções nos 6 primeiros meses do ano.

No Brasil poderá ser pior. Há obrigação de remover todos os conteúdos iguais, o que não existe na lei europeia. E se o conteúdo estiver sendo postado para ser criticado, o que é legítimo, vai ser removido também?

No regime anterior, se alguém reclamava de um conteúdo, ele ficava no ar até a decisão judicial. Era um regime de “na dúvida, pró-liberdade de expressão”. Agora isso se inverte em três dos quatro regimes. O conteúdo será primeiro tirado do ar. Caberá a quem fez o post acionar o judiciário para colocá-lo de volta. O regime é “na dúvida, pró-remoção”.

Quantos dos leitores já tiveram a experiência de ter um conteúdo postado removido? Dá uma sensação de revolta. Muitas pessoas passarão por isso agora. Cada uma receberá uma mensagem da plataforma explicando que a justificativa para a remoção é o novo regime do STF. Discursos que são suprimidos não desaparecem. Com frequência eles se radicalizam.

Outra preocupação é que uma intervenção dessa envergadura requer uma lei. Não sou eu que digo isso, mas o Pacto dos Direitos Civis e Políticos, tratado de direitos humanos que o Brasil assinou que tem força supralegal no país desde 1992.

Ele diz claramente: “O exercício do direito da liberdade de expressão poderá estar sujeito a certas restrições, que devem, entretanto, ser expressamente previstas em lei”. Vai ser difícil sustentar, à luz do Pacto, que as abrangentes mudanças feitas pelo STF foram feitas “em lei”.


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