O crédito consignado foi um grande achado para driblar as absurdas taxas de juros dos empréstimos no Brasil, mas tem estado no topo das reclamações dos consumidores. Esse crédito, então, é Dr. Jeckyll ou Mr. Hyde, solução ou fator de endividamento das famílias? Sem educação financeira nem mais transparência, é um híbrido desses dois personagens de Robert Louis Stevenson, mais conhecidos como o médico e o monstro.
No Sindec (Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor), problemas com crédito consignado estão em sexto lugar entre os mais reclamados na rede de Procons do Brasil, em 2025. O crédito consignado bateu recorde de reclamações de janeiro a maio deste ano na plataforma consumidor.gov, informa esta Folha. E o Datafolha apurou que um terço dos brasileiros CLT ou aposentados têm consignado.
Todas as tecnologias, produtos e serviços podem ser positivos ou negativos. Depende de como sejam utilizados. O smartphone facilita o contato telefônico, o envio e o recebimento de e-mails, o uso de apps para serviços como transporte e alimentação. Mas também pode se tornar um vício, a nomofobia, que é a ansiedade excessiva de não ter acesso ao celular.
O consignado faz sucesso porque tem taxas de juros bem menores do que as do mercado em geral. Como o desconto da parcela da dívida é feito diretamente na folha de pagamento de quem tem emprego formal, com registro em carteira, ou na folha de pagamento de pensões e de aposentadorias, é considerado mais seguro pelos bancos.
E essa garantia de que o tomador de crédito pagará as parcelas em dia reduz os juros. O consignado, além disso, tem vários fãs: o governo federal, porque estimula a economia; os bancos, pela segurança do crédito, e as pessoas que querem complementar sua renda ou bancar algum gasto fora do orçamento, pagando juros mais suportáveis.
Há, contudo, vários problemas. Muitas pessoas não veem o consignado como dívida. E há a indução para que façam consignados, muitas vezes com artifícios ilegais.
A educação financeira não é vista como prioridade pelos responsáveis pela educação no país. Lamentavelmente, porque é essencial para que as famílias tentem equilibrar a relação entre renda e despesas. Os elevados índices de endividamento das famílias comprovam a falta que a educação financeira faz, ainda mais em um país com grande concentração de renda e baixos salários.
Aliciar funcionários públicos, empregados CLT e aposentados a fazer consignados deveria ser passível de sanções rigorosas.
Há iniciativas para melhorar este quadro. A Febraban (Federação Brasileira de Banco) tem a cartilha Contratação de Crédito Consignado. Sugiro que patrocine uma campanha nacional para esclarecer melhor como funciona esse crédito e os riscos de endividamento.
Em maio último, ocorreu a 12ª edição da Semana Enef (Semana Nacional de Educação Financeira), organizada pelo FBEF (Fórum Brasileiro de Educação Financeira). E tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2747/2024, que torna obrigatória a inclusão da disciplina de Educação Financeira no currículo de todos os níveis de ensino das escolas públicas e particulares no território nacional.