A MP (medida provisória) que aumentou a tributação em debêntures (títulos de dívida emitidos por empresas para captar recursos) de infraestrutura abriu uma crise silenciosa em ministérios do governo Lula.
Proposta pelo Ministério da Fazenda como alternativa à alta do IOF (Imposto de Operações Financeiras), a MP eleva de 15% para 25% a tributação das empresas sobre os rendimentos obtidos por meio desses títulos de renda fixa, que estão diretamente vinculados à captação de recursos nas áreas de logística, energia, saneamento, mobilidade urbana e telecomunicações.
A avaliação entre os técnicos dos ministérios é que a medida vai causar insegurança jurídica e alterar a viabilidade dos investimentos financiados por meio da emissão de debêntures incentivadas. Alguns técnicos já falam que esse tipo de fonte de financiamento pode secar ou encarecer o crédito de atividades que geram empregos e renda, caso a medida seja mantida do jeito que está no Congresso.
Como o governo trava uma guerra política com o Congresso, após a derrubada do decreto do IOF, a orientação aos gestores dos ministérios tem sido não colocar o dedo na ferida publicamente para não dar munição aos parlamentares contra o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Há um constrangimento por causa da tentativa da equipe de Haddad em resolver o buraco do Orçamento. Além disso, um eventual congelamento maior de despesas também afetaria os investimentos dos ministérios no último ano do governo.
Haddad está puxando a estratégia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de expor o Congresso como defensor dos ricos, enquanto o governo petista estaria a favor dos mais pobres no combate aos privilégios tributários.
Até agora, a MP tinha chamado a atenção pelo fim da isenção do Imposto de Renda para as pessoas físicas que aplicam em títulos incentivados, como as LCAs, LCIs, CRAs, CRIs e as debêntures de infraestrutura.
Documento que circula na Esplanada dos Ministérios mostra que, com a perda do incentivo tributário, o custo financeiro das debêntures incentivadas para as empresas subirá aproximadamente dois pontos percentuais.
Numa debênture incentivada, por exemplo, com remuneração de IPCA mais 7%, a perda do incentivo representa um aumento de aproximadamente 28%. Nesse cenário, o custo total do financiamento poderá subir para IPCA mais 9%.
O documento mostra dados para mostrar que as debêntures incentivadas não podem ser comparadas às LCAs, CRAs, LCIs e CRAs —títulos voltados para o agronegócio e o setor imobiliários
Um dos argumentos é que os projetos financiados por debêntures incentivadas costumam envolver cronogramas plurianuais, riscos de engenharia e retorno diluído ao longo de décadas, o que demanda capital estável, comprometido e institucionalizado. As debêntures incentivadas foram criadas há 15 anos, mas só nos últimos anos começaram a crescer.
O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) é um dos prejudicados pela medida, que, se aprovada pelo Congresso, entrará em vigor em janeiro do ano que vem. O banco do governo possui cerca de R$ 21 bilhões de debêntures a serem integralizadas (quando o investidor efetivamente paga o valor correspondente ao título) a partir de 2026.
A mudança pode gerar uma redução de 2,1 pontos percentuais na rentabilidade média da carteira, o que representa um valor presente líquido negativo equivalente a R$ 4,2 bilhões. As instituições financeiras responderam por 55% da demanda nas ofertas públicas de debêntures incentivadas.
Os ministérios sugerem que a Fazenda proponha um prazo de transição de pelo menos dois a três anos para a alta entrar em vigor, mitigando o impacto e sem criar insegurança jurídica para os projetos que foram planejados e financiados contando com o incentivo.