Imagine dirigir à noite por uma estrada sinuosa, sem faróis, com chuva no para-brisa e nenhuma placa indicando a próxima curva. É assim que muitos brasileiros investem: com base em “achismos”, manchetes soltas ou “sensações” de mercado.
Sempre que escrevo aqui que é preciso projetar inflação, juros, câmbio ou crescimento do PIB, recebo a mesma pergunta: “Mas onde encontro essas projeções? Em quem confiar?”. A resposta está em um documento robusto, gratuito e atualizado a cada três meses: o Relatório de Política Monetária, publicado pelo Banco Central.
Poucos pequenos investidores sabem, mas esse relatório é uma das melhores fontes públicas para entender o que o próprio Banco Central está vendo, projetando e ponderando ao definir a taxa Selic. Mais do que isso: ele funciona como uma bússola para quem quer se antecipar aos movimentos da economia. O que você encontra lá?
Primeiro, um raio-X da economia global e brasileira: atividade, inflação, mercado de trabalho, crédito, setor externo e fiscal. Segundo, as projeções do BC: onde deve estar a inflação em 2026? E o PIB, o câmbio, a taxa Selic? Está tudo ali, trimestralmente atualizado. Terceiro, o balanço de riscos: o que pode sair melhor ou pior que o esperado? E como isso impacta a decisão de política monetária?
O texto é longo e alguns podem se perder. Então, explico como aproveitar esse conteúdo sem ser economista.
Comece pelo Sumário Executivo, que resume os principais pontos em poucas páginas. Depois, vá à seção de projeções e condução da política monetária, onde o BC explica suas decisões e expectativas futuras. Se quiser entender o momento atual, leia o trecho sobre atividade econômica e inflação. E se tiver curiosidade sobre o que o próprio presidente do Banco Central pensa, saiba que ele comenta o relatório em uma apresentação pública transmitida no canal do BC no YouTube — e ainda responde perguntas da imprensa. É um conteúdo acessível e gratuito, direto da fonte.
Quer um exemplo prático de como isso pode te ajudar a investir melhor?
Em junho de 2024, o Banco Central projetava que a inflação convergiria para a meta de 3% já em 2025. A Selic estava em 10,5%, e o tom era de cortes suaves à frente. Um ano depois, em junho de 2025, a história mudou. O relatório passou a prever inflação só voltando à meta no fim de 2026. A Selic subiu para 15%, e o discurso do BC ficou mais duro. Para quem acompanhou os relatórios, essa guinada não foi uma surpresa — foi um sinal de alerta claro para ajustar a carteira antes da virada.
Quem entendeu esse movimento pode decidir sobre reduzir exposição em setores mais sensíveis a juros altos, rever a alocação entre renda fixa e variável e buscar alternativas protegidas da inflação.
Investir bem não é sobre seguir palpites ou ter sorte. É sobre saber ler o cenário e ajustar a vela antes da tempestade. O Relatório de Política Monetária está disponível gratuitamente no site do Banco Central: clique aqui para acessar. E a apresentação com o presidente Galípolo está no YouTube, pronta para quem quiser escutar direto da fonte.
A sorte pode até ajudar, mas quem investe com visão clara sempre chega mais longe. Afinal, quem dirige à noite liga os faróis. Quem investe deveria, no mínimo, saber onde está pisando.
Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor.
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