O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso, disse que a culpa pelo aumento das despesas com o pagamento do BPC (Benefício de Prestação Continuada) não é do Judiciário.
Pago a idosos e pessoas com deficiência, o BPC vem crescendo aceleradamente e se consolidando como uma preocupação para as contas públicas. Mantido o ritmo atual, o gasto pode ultrapassar o do Bolsa Família nos próximos anos.
“Houve um crescimento muito relevante das concessões do BPC. É um equívoco imaginar que esse crescimento tenha decorrido do Judiciário. Eu ouvi essa observação, fui verificar os dados e eles não são corretos”, afirmou Barroso, ao C-Level Entrevista, novo videocast semanal da Folha.
O ministro disse que é preciso um freio de arrumação para que não haja excessos e, menos ainda, fraudes.
A fala do presidente do STF contradiz o que tem dito o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Segundo Haddad, o programa de assistência social preocupa o governo porque tem alto índice de concessão por via judicial, o que não estaria na competência de ação exclusiva do Executivo. Haddad já disse que há uma máquina de liminares na concessão do benefício pago pelo Tesouro Nacional.
“Não vou me referir especificamente ao ministro Haddad, a quem quero bem, e acho que se empenha para fazer o melhor trabalho possível. Mas geralmente quem traz a judicialização para o Supremo é o Executivo ou o Congresso. O Supremo não vai buscar essas demandas, não”, disse Barroso ao ser perguntado sobre as críticas do ministro da Fazenda à concessão do BPC pela Justiça.
Conforme mostrou a Folha, a Justiça avançou durante o terceiro mandato do presidente Lula (PT) na concessão do BPC. Apesar de a via administrativa ainda ser dominante no estoque total de beneficiários, o crescimento nesse caso tem desacelerado de maneira significativa. Enquanto isso, o público que chega ao programa via tribunais continua em forte expansão.
Considerando o saldo de beneficiários, que aponta apenas a quantidade de novas concessões, a via judicial foi responsável por 36% dos casos nos últimos 12 meses terminados em abril de 2025 (um ano antes, esse índice era de 21%). O advogado-geral da União, Jorge Messias, está trabalhando com o CNJ para conter as concessões.
O presidente do STF ressaltou que o decreto de alta do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) pelo Congresso foi judicializado pelo governo, e muitas outras questões são judicializadas por partidos políticos.
No videocast, Barroso disse que há uma crise fiscal no país e que todo mundo tem procurando identificar onde há excessos. Mas alertou que é preciso se preocupar com a redução de gastos de uma maneira justa numa sociedade democrática que tem a justiça social como um dos seus princípios. Ele defendeu o corte de desonerações “injustificáveis”.
“Onde haja coisa errada no BPC, onde haja coisas erradas no Bolsa Família, é importantíssimo passar um pente-fino. Assim como eu acho que onde haja desonerações injustificáveis sobretudo não monitoradas para saber se trazem algum proveito para o país, também é preciso cortar”, afirmou.
Barroso ressaltou, no entanto, que é preciso ter a percepção de que a contribuição para o ajuste de contas tem que ser geral e não pode recair predominantemente sobre os mais pobres. “Onde haja coisas erradas ou excessos acho que têm que ser cortadas, não importa onde estejam.”
O ministro destacou que a Constituição de 1988 concebeu um arranjo institucional que dá ao Supremo um certo protagonismo na vida brasileira para decidir sobre diversas questões, como Previdência e temas tributários.
“Quando você traz uma matéria para a Constituição, você de certa forma, em alguma medida, a retira da política e traz para o direito, e traz para o mundo das pretensões judicializáveis. E além disso, de termos a Constituição abrangente, é muito fácil chegar ao Supremo”, ressaltou.