A Rússia vai continuar insistindo na discussão a respeito de sistemas de pagamento alternativos ao dólar no âmbito do Brics apesar da resistência de outros membros do grupo, de acordo com o ministro das Finanças do país, Anton Siluanov.
“Até o momento os membros do Brics não concordaram completamente, mas é uma discussão em andamento, e nós vamos perseguir esse caminho com países interessados nisso”, afirmou o ministro, que está no Rio de Janeiro para a cúpula do grupo.
“Temos visto que não precisamos de um consenso completo ao buscar essa ou aquela decisão financeira. Estabelecer pontes entre sistemas de depósito ou adquirir instrumentos financeiros em um formato bilateral ou trilateral, isto é algo que pode ser feito a partir de um consenso mais amplo”, afirmou Siluanov.
O ministro disse ainda que, uma vez que esses mecanismos sejam lançados, outros membros podem se juntar a eles. “É um trabalho em andamento. Em algumas questões nos movemos mais rápido, em outras, mais devagar, mas há progresso”, afirmou.
A Rússia e a ex-presidente Dilma Rousseff, à frente do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) como indicada de Moscou para o banco do Brics, são os principais defensores do que chamam de “plataforma de investimentos”, liderada pelo NDB, que fortaleça instrumentos e moedas locais em transações internacionais em detrimento do dólar americano.
O grupo, no entanto, tem resistido à ideia, inclusive a presidência brasileira do Brics neste ano. A Índia foi um dos países que se opôs, dizendo em reuniões que isso desvirtuaria o mandato do banco do Brics. O governo brasileiro tampouco se empolgou com a proposta e vê limitações para o uso de moedas locais em comércio.
Os países do grupo evitaram se comprometer com a criação de um sistema de pagamento alternativo, como mostrou a Folha. Na declaração de ministros das Finanças, que se reuniram neste sábado no Rio, houve apenas uma menção branda aos avanços na discussão em busca de soluções que facilitem operações financeiras internacionais, com custo mais baixo, e impulsionem fluxos de comércio e investimentos entre os países.
Eles dizem reconhecer o progresso feito pela força-tarefa de pagamentos na identificação de “possíveis caminhos para apoiar a continuação das discussões sobre o potencial de maior interoperabilidade dos sistemas de pagamento do Brics” e citam um relatório técnico que compila os sistemas já existentes hoje.
Não está claro o que é exatamente a plataforma defendida pela Rússia. Mas Putin e outros líderes do país fizeram declarações sobre o tema nos últimos meses, dando indicações de que ela envolveria uso de ativos digitais, como bitcoins, criação de sistemas de pagamentos alternativos e maior independência do Ocidente.
“Propomos a criação de uma nova plataforma de investimentos do Brics usando ativos digitais”, disse Putin em Sochi, outubro do ano passado. Na cúpula em Kazan, Putin afirmou que “é importante construir mecanismos financeiros multilaterais alternativos, confiáveis e livres”.
Já Siluanov, o ministro das Finanças, foi além, na ocasião: “Estamos definindo o rumo para a futura infraestrutura financeira do Brics. Os países do Brics precisam de medidas de proteção e mecanismos alternativos. Planejamos criar soluções de pagamento e liquidação que serão aceitáveis para todos os participantes dentro de um ano” —o que até o momento não se concretizou.
A ideia de criar sistemas alternativos de pagamentos e comércio em moeda local é vista pelos Estados Unidos e União Europeia como tentativas da Rússia de escapar das sanções financeiras que enfrenta desde que invadiu a Ucrânia, em 2022, e sua exclusão do sistema Swift de informações e transações financeiras internacionais.
Logo após assumir, em janeiro deste ano, o presidente Donald Trump advertiu que haveria retaliações caso os membros do Brics tentassem substituir o dólar americano como moeda de reserva.
“Vamos exigir um compromisso desses países aparentemente hostis de que eles não criarão uma nova moeda do Brics, nem apoiarão qualquer outra moeda para substituir o poderoso dólar americano ou enfrentarão tarifas de 100%”, disse Trump.