O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticou o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, após a ameaça do republicano de aplicar tarifas a países do Brics, nesta segunda-feira (7).
“O mundo mudou, não queremos imperador. Nós somos países soberanos. Se ele achar que ele pode taxar, os países têm o direito de taxar também. Existe a lei da reciprocidade. Eu achei muito equivocado e muito irresponsável um presidente ficar ameaçando os outros em redes digitais”, afirmou Lula, em entrevista a jornalistas na cúpula de líderes do Brics, no Rio de Janeiro.
Na noite de domingo (6), Trump disse numa rede social que qualquer país que “se alinhe às políticas antiamericanas do Brics” será afetado por uma tarifa adicional de 10%. “Não haverá exceção a essa política. Obrigado por sua atenção”, escreveu Trump.
Paralelamente ao anúncio do americano, o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, disse que os EUA aplicarão em 1º de agosto tarifas aos parceiros comerciais com os quais não tenha alcançado acordos, seja Taiwan ou a União Europeia.
As chamadas tarifas recíprocas anunciadas em 2 de abril –hoje suspensas temporariamente– afetaram os membros do Brics de forma diferente. Enquanto o Brasil ficou com a sobretaxa mais baixa, de 10%, a China chegou a ser tarifada em mais de 140% (os dois países chegaram a um acordo para reduzir o índice).
No comunicado da cúpula de líderes, o Brics criticou, sem citar nominalmente Trump ou os Estados Unidos, o “aumento indiscriminado de tarifas” como ameaça à redução do comércio global e condenou a imposição de “medidas coercitivas unilaterais contrárias ao direito internacional”.
Os países manifestaram também no texto ter “sérias preocupações” com o aumento de medidas tarifárias e não tarifárias unilaterais “que distorcem o comércio e são inconsistentes com as regras da OMC [Organização Mundial do Comércio]”.
Lula defendeu o grupo.
“O Brics, que não nasceu para afrontar ninguém, é apenas um outro modelo, um outro modo de fazer política. Uma coisa mais solidária. Que o banco [do Brics] esteja muito mais preocupado em ajudar os países em desenvolvimento a se desenvolver, os países mais pobres”, disse Lula.
O brasileiro rejeitou a ideia de que a ameaça de Trump tenha atrapalhado discussões da cúpula de líderes do Brics e disse que o grupo não deu “nenhuma importância para isso”.
“Eu só estou falando disso porque você me perguntou. Na reunião do Brics ninguém tocou no assunto, ou seja, como se não ninguém tivesse falado. Não demos nenhuma importância para isso”, afirmou em resposta a uma terceira pergunta sobre o tema durante a entrevista coletiva.
Durante a declaração à imprensa, Lula também voltou a defender que os países reduzam o uso do dólar no comércio internacional. “Eu acho que o mundo precisa encontrar um jeito que a nossa relação comercial não precise passar pelo dólar”, disse.
“Quando for com os Estados Unidos ela passa pelo dólar. Mas quando for com a Argentina não precisa passar. Quando for com a China não precisa. Quando for com a Índia não precisa passar. Quando for com a Europa, discute-se em euro. Ninguém determinou que o dólar é a moeda padrão. Em que fórum foi determinado?”, disse.
“Obviamente que temos toda a responsabilidade de fazer isso com muito cuidado. O nosso Banco Central precisa discutir isso com os bancos centrais dos outros países, mas é uma coisa que não tem volta. Isso vai acontecendo aos poucos, e vai acontecendo até que seja consolidado”.
Apesar da fala do presidente, o Brics evitou compromissos firmes com sistemas de pagamento alternativos na declaração da cúpula do bloco.
Antes de sua fala à imprensa, Lula afirmou em nota que a defesa do Brasil compete aos brasileiros e que o país não aceita interferência de quem quer que seja —uma resposta não à ameaça tarifária, mas à publicação de Trump defendendo Jair Bolsonaro (PL) e chamando o julgamento do ex-presidente de “caça às bruxas”.
“A defesa da democracia no Brasil é um tema que compete aos brasileiros. Somos um país soberano. Não aceitamos interferência ou tutela de quem quer que seja. Possuímos instituições sólidas e independentes. Ninguém está acima da lei. Sobretudo, os que atentam contra a liberdade e o estado de direito”, afirmou o petista.
Pouco depois, durante a coletiva de imprensa, Lula foi perguntado sobre a publicação do presidente americano, mas disse que tinha “coisa mais importante para comentar”.
“Eu não vou comentar essa coisa do Trump e do Bolsonaro. Eu tenho coisa mais importante para comentar do que isso. Este [Brasil] país tem lei, tem regra. Este país tem um dono, chamado povo brasileiro. Portanto, [Trump]: ‘dê palpite na sua vida e não na nossa'”.