Reforma da Previdência dos militares, limitação aos supersalários, punição a devedores contumazes e o novo marco das PPPs (parcerias público-privadas) e concessões são alguns dos projetos listados como prioritários na agenda econômica do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e que acabaram travados na Câmara dos Deputados ou no Senado em um semestre marcado pela rebelião de partidos da base e pela escala na tensão entre os Poderes.
O pico do conflito foi a derrubada dos decretos que mexeram no IOF, mas antes disso projetos de interesse do governo já andavam de lado no Parlamento.
A reforma da Previdência dos militares, anunciada em 2024 no pacote de corte de gastos, chegou à Câmara dos Deputados em dezembro, mas ainda não começou a andar.
A distribuição para comissões depende de decisão do presidente da Câmara, deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB), que disse recentemente ter pedido que sua assessoria levantasse a situação do projeto, pois pretende colocar o assunto em discussão.
A principal oposição deve vir de parlamentares oriundos das Forças Armadas. O deputado General Girão (PL-RN) defende que não há déficit no sistema de pagamentos de aposentadoria e pensões dos militares e que cabe ao governo cortar suas próprias despesas. O PL, à frente da oposição à Lula, é um dos que reivindica a relatoria do texto.
A limitação aos supersalários vinha andando de lado no Parlamento. Na tentativa mais recente, o governo não conseguiu passar pela Câmara uma proposta de apertar a regra de pagamento.
O supersalário é aquele que ultrapassa o teto constitucional, valor que equivale, neste ano, a R$ 46.366,19. Para burlar esse limite, membros do Judiciário e Ministério Público se valem de benefícios indenizatórios, os chamados penduricalhos.
No ano passado, o lobby dessas carreiras pressionou e conseguiu evitar que as verbas indenizatórias tivessem de ser previstas em lei.
Antes disso, outro projeto ainda em tramitação no Senado incluiu tantas exceções à limitação que, na avaliação do deputado federal Pedro Paulo (PSD-RJ), “aumentou em vez de racionalizar o gasto”. O parlamentar é relator do grupo de trabalho da reforma administrativa na Câmara.
Para ele, a discussão sobre a situação fiscal do governo, que se vê buscando receitas para fechar o ano do azul, tornou o momento favorável ao aperto na regra. Outro indicativo dessa janela veio da oposição ao governo.
Na semana passada, o senador Ciro Nogueira (PP-PI) cobrou no plenário a votação do projeto que trata da limitação.
As prioridades do governo Lula na área econômica foram apresentadas pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) em janeiro, durante reunião ministerial. A lista considera os anos de 2025 e 2026 e foi dividida em três frentes: estabilidade macroeconômica, melhoria do ambiente de negócios e implantação de um plano de transformação ecológica.
A pasta foi procurada para comentar o andamento das propostas, mas não respondeu até a publicação desta reportagem.
Dentre as medidas, a modernização do marco legal de preços de medicamentos esteve sob consulta pública da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) até a última semana.
O segundo leilão do Eco Invest, por meio do qual o governo empresta recursos do Fundo Clima a bancos privados para projetos de restauração de áreas degradadas, foi anunciado em abril e o envio de propostas termina no dia 21 de julho.
Já a implantação da reforma tributária sobre o consumo só começa em 2026. A regulamentação do Comitê Gestor do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), imposto criado na reforma, está na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado e só será votada no segundo semestre.
O relator, senador Eduardo Braga (MDB-AM), adiou a apresentação do relatório a pedido da Fazenda, que se vê em meio a uma disputa entre a FNP (Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos) e a CNM (Confederação Nacional dos Municípios) sobre a participação das cidades no comitê gestor.
Do lado das vitórias, o governo conseguiu evitar que o projeto de lei que leva a faixa de isenção do Imposto de Renda a R$ 5.000 fosse contaminado por trechos de outro texto, o da MP (medida provisória) de aumento de impostos.
O texto da MP foi incluído entre as prioridades do governo Lula na Câmara após a derrubada do decreto do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras).
Partidos da oposição e do centrão tentaram incluir trechos dessa medida, que cria o IR de 5% para papéis de renda fixa hoje isentos, para o PL do IR, o que aumentaria a complexidade do texto e esvaziaria o projeto batizado pelo governo de MP do ajuste fiscal.
A comissão especial com senadores e deputados que analisará a medida será instalada nesta terça-feira (15), mas as reuniões devem ficar para agosto.
A expectativa da base do governo no Congresso é a de que é possível negociar o texto. Depois da derrubada do decreto e do mal-estar entre Motta e governo, líderes da base dizem que o assunto é passado e que, se não houvesse chance de a medida avançar, a comissão especial não seria nem ser instalada.
Bancadas volumosas, como a FPA (Frente Parlamentar do Agronegócio), já fecharam posição contra o texto, que mexe em fontes de financiamento do setor.
Os rendimentos de papéis como LCA (Letras de Crédito do Agronegócio) e CRA (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) passam a ter a cobrança de 5% do Imposto de Renda a partir de 2026 caso o governo consiga fazer passar a proposta, que também inclui mais impostos para empresas de apostas.
Já o projeto do IR será votado em comissão especial nesta quarta (16), quando deve ter o relatório final aprovado. O teste de fogo, porém, será a votação no plenário, no qual o texto só deverá ser analisado em agosto.
No início deste mês, o governo Lula contabilizou outras duas vitórias, uma delas da relação de prioridades. Câmara e Senado aprovaram duas medidas provisórias, uma que criou o empréstimo consignado para trabalhadores formais e outra que ampliou as possibilidades de uso do Fundo Social do Pré-Sal e incluiu autorização para vender excedente de petróleo, o que deve gerar receita de R$ 35 bilhões à União.
Como estão algumas das propostas prioritárias de Lula para a economia
Reforma tributária sobre a renda com isenção para quem ganha até R$ 5.000 e tributação sobre o milionários PL 1.087/2025
- O que prevê: isenção do IR para renda até R$ 5.000 e criação de imposto mínimo de 10% para renda mensal superior a R$ 50 mil
- Qual a situação: relatório do deputado Arthur Lira (PP-AP) deve ser aprovado em comissão especial no dia 16; vai ao plenário em agosto
Projeto de lei da conformidade tributária e aduaneira, com valorização do bom contribuinte e responsabilização do devedor contumaz PL 15/2024
- O que prevê: punição a CNPJs criados para sonegar impostos e lavar dinheiro e que desequilibram a concorrência de mercado
- Qual a situação: o governo desistiu desse projeto e hoje apoia o andamento do PLP 125/2022, relatado pelo senador Efraim Filho (União Brasil-PB), e que trata da caracterização do devedor contumaz; precisa ser incluído na pauta do Senado
Reforma da Previdência dos militares PL 4920/2024
- O que prevê: idade mínima de 55 anos para reserva, regra de transição até 2032 e fim de pensão a militares expulsos por condenações
- Qual a situação: chegou à Câmara em dezembro e ainda não foi distribuída a um relator
Modernização do regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos e PPPs PL 2892/2011
- O que prevê: libera compartilhamento de riscos e incorpora práticas adotadas pelo mercado, mas que não eram previstas em lei
- Qual a situação: foi aprovada na Câmara em maio e aguarda distribuição no Senado
Nova Lei das Falências PL 3/24
- O que prevê: dá mais poder aos credores em recuperações judicias e falências e cria a figura do gestor fiduciário, que substitui o administrador judicial
- Qual a situação: foi aprovada na Câmara, mas versão final é alvo de críticas; no Senado, ainda aguarda distribuição