/ Jun 08, 2025

STF: empresas vão à corte contra decisões trabalhistas – 07/06/2025 – Mercado

O STF (Supremo Tribunal Federal) tem ampliado o espaço para empresas pularem o itinerário tradicional de uma ação e irem direto à corte derrubar decisões da Justiça do Trabalho. Por meio de casos pontuais, a corte tem reduzido a atuação dos tribunais especializados ao mesmo tempo em que afrouxa a legislação trabalhista.

Um dos pontos-chave para isso foi a liberação da terceirização da atividade-fim em 2018. Mas o fenômeno tem se intensificado com outros temas, como o da pejotização —quando empresas contratam funcionários como pessoa jurídica para não arcar com encargos trabalhistas— e o da relação com plataformas digitais de transporte e de entregas.

A flexibilização no STF tem ocorrido por meio das reclamações, um tipo de ação criada para preservar os precedentes da corte quando um tema pacificado é desrespeitado por juízes ou tribunais pelo país. Por essa via, chega-se ao Supremo sem ter de enfrentar cada etapa da Justiça.

Parte da nova jurisprudência trabalhista tem sido, assim, construída dessa maneira. Para isso, o STF tem flexibilizado a aceitação desse tipo de ação nessa área: enquanto apenas 28% das reclamações gerais foram consideradas procedentes, 38% das trabalhistas tiveram essa resposta, considerando dados reunidos pelo STF desde o ano 2000.

Muitas decisões autorizam o modelo da pejotização com base no entendimento de 2018 que liberou a terceirização, ainda que sejam distintos.

Agora, o tema da pejotização aguarda uma posição definitiva do STF depois de Gilmar Mendes ter suspendido a tramitação de todos os casos no país. Em vários momentos o ministro já fez críticas à Justiça do Trabalho e defendeu maior liberalização das regras trabalhistas.

Mesmo com a suspensão, algumas decisões seguem sendo tomadas. Em 29 de abril, por exemplo, Cristiano Zanin derrubou o reconhecimento de vínculo de uma advogada que prestava serviços a uma empresa em 2021, antes de a profissional ser formalmente contratada.

O ministro afirma que a Justiça do Trabalho desrespeitou o entendimento do STF quanto à validade de modelos contratuais alternativos. Para ele, ainda, é legítima a contratação como PJ, especialmente quando não há vulnerabilidade.

Como a Folha mostrou, Gilmar tem atuado na área. O decano articula com parlamentares e com o setor financeiro um projeto de lei para a volta da homologação das rescisões de contratos de trabalho nos sindicatos. O objetivo é estimular a tentativa de conciliação prévia e diminuir o volume de litígios que chegam ao Judiciário.

A movimentação no STF é observada enquanto as ações trabalhistas batem recorde em anos recentes. Em 2023, foram 4,19 milhões de novos processos na Justiça do Trabalho, alta de 28,7% em relação ao ano anterior, segundo o CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

Em 2024, o STF recebeu o maior número de reclamações já registrado pela corte, ultrapassando 10 mil pela primeira vez. Desse total, as trabalhistas representam 6.160.

O STF tem três requisitos para aceitar a reclamação. O primeiro é a aderência entre a decisão contestada e o precedente que teria sido violado. Ela não pode, também, ser usada como recurso contra a decisão anterior.

Em segundo lugar, para respeitar o devido processo legal, contraditório e ampla defesa, a reclamação não pode provocar um salto de instâncias. Por fim, ela não seria aceita para reexame de fatos e provas. Assim, esse tipo de ação deveria comprovar o descumprimento de uma decisão específica do STF.

Esse mecanismo tem sido muito acionado pelas plataformas digitais. Uma das reclamações foi apresentada pela empresa Cabify, que administra um aplicativo para motoristas (semelhante ao Uber), contra uma decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Nela, Gilmar derrubou a decisão de segundo grau, aceitando a argumentação da empresa contra o vínculo empregatício.

Mas diferentes tipos de ocupações têm surgido nas reclamações. André Mendonça cassou a decisão de segunda instância que reconheceu o vínculo de um entregador de pizza no Rio de Janeiro. O estabelecimento tinha outros entregadores com carteira assinada.

Há garis, entregadores, trabalhadores de salão de beleza, transportadores de cargas e corretores de imóveis em situações semelhantes. Em alguns casos, os ministros determinam o retorno do processo à origem para nova análise, mas há julgamentos refeitos e concluídos da mesma forma, pelo reconhecimento do vínculo, e aí derrubados pelo STF.

Mirella Franco, do Bonelli Advocacia, credita esse volume maior de decisões do tipo no Supremo à própria Justiça do Trabalho. Para ela, esse ramo do Judiciário tende a entender situações em que há ordens como relação de subordinação, mas isso poderia significar apenas estruturação organizacional.

“Uma das razões para essa supressão de instâncias, ou até de justiça especializada, é a Justiça do Trabalho hoje ser muito paternalista. O que não é nenhuma novidade para os empresários nem para ninguém. Ao julgar ações que envolvem vínculo de emprego, geralmente os juízes têm uma visão muito mais relacionada à CLT e se apegam muito à questão da subordinação”, diz.

Professor e ex-presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), Guilherme Feliciano defende, de outro lado, o protagonismo do próprio STF ao alimentar essa dinâmica.

“O Supremo, paulatinamente, está se transformando num balcão de causas trabalhistas. Não por uma rebeldia da Justiça do Trabalho. Mas por ser flexível demais na admissão dessas reclamações”, afirma.

Para ele, o fenômeno movimentou inclusive a advocacia, que percebe o potencial de ter resultados mais rápidos e baratos com essa via. “Involuntariamente, o Supremo terminou criando até um novo nicho de advocacia trabalhista especializada, especialmente a patronal”, diz.

Feliciano também avalia ser equivocada a visão de que a Justiça do Trabalho ou o TST (Tribunal Superior do Trabalho) são parciais.

“O TST hoje é dividido em três blocos: um grupo de ministros que enfatiza mais o lado da proteção da parte mais fraca do contrato, outro com uma percepção muito mais próxima da liberdade econômica e um centro oscilante. Esse grupo central acaba definindo as coisas”, afirma.

Professor de direito constitucional e procurador do Trabalho, Cássio Casagrande afirma que a corte transmite hoje uma mensagem de liberalização. “O Supremo erra ao comparar terceirização com pejotização, que são completamente diferentes. Há essa avalanche de processo porque os advogados de empresas perceberam que o Supremo abriu a porteira não só para a terceirização, que o legislador autorizou, mas também para a pejotização”, diz.

Quanto às críticas à Justiça do Trabalho, ele também as considera infundadas. “Não é que ela não cumpre as decisões do Supremo. Ela está fazendo a distinção e dizendo quando não se trata de terceirização, que foi efetivamente julgado, mas de pejotização”, afirma Casagrande.

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