A ascensão dos influenciadores digitais deveria representar, ao menos em tese, uma democratização do poder da fala e uma chance de dar voz a quem nunca teve espaço. Afinal, por meio das redes sociais, mais pessoas poderiam disputar a atenção com figuras tradicionais da mídia.
Mas essa promessa de ruptura rapidamente se transformou em uma encenação calculada. Boa parte dos influenciadores mais bem-sucedidos emerge não pela profundidade de suas ideias, mas pela capacidade de encenar vidas idealizadas, vender desejos comercializáveis e uma aparência que sugere plenitude, enquanto, no fundo, esconde-se uma performance desgastante.
A economia da influência se transformou em um mercado que premia o entretenimento fácil, a gentileza artificial e o visual publicitário. A consequência é um ambiente no qual a aparência vale mais do que o conteúdo. Os algoritmos, treinados para capturar retenção, reforçam o circo da validação em que sobrevive quem performa melhor, ainda que pense menos.
Há, evidentemente, exceções. Alguns produzem conteúdo de qualidade e tornam acessível aquilo que antes era restrito a espaços acadêmicos ou institucionais. Mas são minoria. Parte considerável dos influenciadores se destaca pela habilidade de vender fantasias maquiadas para consumo rápido. Preferem o tutorial de como parecer interessante sem, de fato, ser.
Essa lógica molda aspirações e reconfigura valores. Jovens sonham menos em resolver problemas reais do país e mais em acumular visibilidade. A relevância social passou a ser confundida com a relevância mediada pelas telas de celulares. A influência se transformou na intenção de capturar a atenção a qualquer custo. A embalagem não apenas sobrepôs ao conteúdo, ela o eliminou. E o resultado é uma cultura que aplaude, ainda mais, o vazio.
O problema não está apenas no conteúdo recheado de nada, mas em sua hegemonia. Em um país em que milhões não têm acesso a uma educação de qualidade, o conteúdo aspiracional desses influenciadores se torna uma doutrina informal sobre o que é ter sucesso. Uma doutrina que ensina a consumir, não a refletir. A parecer ser, não a agir sobre o mundo. Porque pensar dá trabalho. E romper com esse mundo de aparências exige coragem.
Enquanto a parte mais influente da internet se dedica a vender produtos, rotinas e estilos de vida, o mundo real enfrenta colapsos climáticos, retrocessos democráticos e desigualdades obscenas. Em vez de influenciar para o debate construtivo, muitos influenciam para a distração. E fazem isso com maestria e patrocínios. E fazem isso roubando o precioso tempo de sua plateia.
Talvez seja uma boa hora para repensar o que chamamos de influência. E, mais do que isso, quem de fato está influenciando um futuro diferente. Talvez seja hora de valorizar menos quem sabe posar para a câmera e mais quem tem algo a dizer quando o celular estiver fora do alcance.
Depois de conhecer a influenciadora Virginia Fonseca, acusada de lucrar alto ao promover jogos de apostas, através da CPI das Bets, decidi escrever esta coluna. O texto é uma homenagem a “Fake Plastic Trees”, de Colin Greenwood, Ed O’Brien, Jonny Greenwood, Philip Selway e Thom Yorke, interpretada por Radiohead.