/ Jun 15, 2025

Empresas recuam nas ações para o mês do orgulho LGBTQIA+ – 14/06/2025 – Mercado

A cantora Pepita, uma mulher trans, já chegou a fazer 17 campanhas em um mês do orgulho LGBTQIA+. Neste ano, fechou apenas um contrato. “O posicionamento que eu tenho, de ser muito militante, pode fazer com que eu não me encaixe mais nas marcas”, diz ela ao ser questionada sobre os motivos para essa redução drástica.

No último ano, na esteira da volta de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos, uma série de empresas globais anunciaram recuos em políticas de diversidade, equidade e inclusão, da Meta (dona de Facebook e Instagram) ao McDonald’s.

Mas o contexto brasileiro é diferente e pode ter começado a mudar antes do retorno trumpista à Casa Branca, apesar de também envolver questões políticas, segundo especialistas ouvidos pela Folha.

Fátima Pissarra, CEO da agência de marketing de influência Mynd, vê o disputado período eleitoral presidencial de 2022 como marco da mudança no país. Para ela, a questão da defesa de grupos como o LGBTQIA+ ficou mais polarizada e passou a provocar crises recorrentes para empresas que se posicionam nesse sentido, especialmente nas redes sociais.

“A gente vê claramente esse receio das marcas em contratarem [minorias como porta-vozes] e ficar parecendo para público que é uma contratação para tender a um lado político”, diz ela. “Aí a marca começa a ser atacada.”

A empresária calcula que a contratação de influenciadores da comunidade LGBTQIA+ para campanhas específicas caiu cerca de 90% nos últimos três anos. “Todo mundo pisou no freio. A Pabllo Vittar fazia 15, 20 campanhas em junho. Agora é uma ou duas e olhe lá”, diz ela sobre a cantora, uma das personalidades mais famosas de seu casting.

Há outros exemplos dessa redução. Ricardo Sales, CEO da consultoria Mais Diversidade, afirma ter captado, neste ano, metade do que arrecadou para realizar a Feira Diversa, evento de empregabilidade e cultura LGBTQIA+ que chegou à 11ª edição neste sábado (14). Isso apesar de ter obtido o dobro de inscritos.

Para Sales, muitas empresas fazem uma “leitura precária de contexto”, importando questões internacionais para o Brasil sem a tradução adequada. Ele cita, por exemplo, pesquisas que indicam apoio ao casamento homoafetivo no país.

“A gente conquistou, nos últimos anos, uma visibilidade grande, nas famílias, na mídia, em todos os espaços”, afirma ele.

Fátima, da Mynd, diz que a maior parte das campanhas do mês do orgulho fica restrita agora à Parada do Orgulho LGBT+ de São Paulo, que acontece no próximo domingo (22). Talvez por isso o evento não tenha sentido o baque. Nelson Matias Pereira, presidente da parada, afirma que houve saídas naturais de patrocinadores, substituídos por outros.

O evento e a feira que acontece na quinta-feira (19) custam cerca de R$ 7 milhões para a associação organizadora, fora o dinheiro gasto pela Prefeitura de São Paulo, e a expectativa é fechar as contas.

“A sensação é que a gente está sempre pedindo migalhas”, afirma ele. “Você vê as empresas investindo muita grana em outros eventos, e quando chega na parada, é sempre uma verba que eu considero muito pequena pelo tamanho do evento.”

As cotas de patrocínio variam de R$ 800 mil a R$ 3 milhões, mas a de valor mais alto quase nunca é alcançada. Em geral, os contratos costumam ficar próximos de R$ 1,5 milhão.

Pereira afirma que isso acontece porque, em geral, grandes companhias querem usar na parada as verbas reservadas a ações de diversidade, que são geralmente muito inferiores às destinadas ao marketing e sofrem com desmonte.

Algumas ações de marca que fizeram muito sucesso no mês do orgulho já não existem mais. É o caso do Doritos Rainbow, que embalava salgadinhos com cores do arco-íris em edição especial para a ocasião. A Doritos deixou de patrocinar a parada e não produz o snack colorido desde 2022. Questionada se suspendeu as ações para evitar polêmicas com politização da pauta em ano eleitoral, a empresa nega.

Outro patrocinador tradicional, o Burger King, que tem um grande restaurante localizado no trajeto do desfile na avenida Paulista, havia decidido não patrocinar o evento neste ano, pela primeira vez desde 2017. Procurada pela Folha no início da semana, a empresa disse, a princípio, que estava fora do patrocínio à parada de 2025, mas enviou um novo comunicado, na sexta (13), informando que fechou acordo de patrocínio à corrida do Orgulho, que vai acontecer no dia 21, e apoio à associação da parada.

Já a Uber, que também já chamou a atenção de seus passageiros com os caminhos coloridos no mapa do aplicativo nesta época do ano, afirma em nota que “até o momento não tem ações previstas para o Mês do Orgulho”. A concorrente 99 está pintando com as cores do arco-íris os carrinhos que aparecem na tela para o usuário.

Eduardo Paiva, diretor de diversidade do grupo L’Oréal no Brasil, reconhece que houve um enxugamento no compromisso do setor empresarial com o tema, mas diz que a companhia de beleza decidiu ir na contramão dessa onda de recuo.

Para o executivo, o nível de envolvimento das marcas no desfile é uma prova desse comprometimento. Além de expor o nome corporativo do grupo L’Oréal, a empresa vai levar ao evento a sua maior marca, L’Oréal Paris, e ainda vai lançar uma nova marca profissional para cabelos, a Matrix, com distribuição de amostras.

Além da presença na parada, a companhia também vai patrocinar a Feira do Orgulho LGBTQIAPN+, no dia 19, com apresentação das influenciadoras Pepita e Gabi Loran promovidas pela marca L’Oréal Paris para a conscientização sobre o combate ao assédio nas ruas, entre outras atividades.

Paiva afirma que o compromisso genuíno das marcas requer profundidade e consistência nas ações das empresas em relação ao tema. Se isso for bem feito, diz ele, o risco de ruídos ou polêmicas se dilui e, quando acontecem, são superficiais.

“O Mês do Orgulho é importante e o domingo é um dia emblemático, mas o compromisso precisa acontecer o ano todo. A agenda da diversidade é uma prioridade estratégica para o grupo. A diversidade não é pensada só como uma área, mas como uma forma de operar. Ela não é apartada do negócio. Tem que estar no centro”, diz Paiva.

Outras marcas tradicionais na data permanecem com presença no desfile principal e em eventos paralelos, como a Smirnoff, que também será uma das patrocinadoras do Castro Festival, no Vale do Anhangabaú. “A relação de Smirnoff com a parada é de longa data. A marca está entre as primeiras a apoiar oficialmente o evento, com patrocínio já em 2007. A presença em 2025 reforça esse compromisso histórico com a comunidade LGBTQIAPN+”, diz a marca em nota.

A Zurich será, pelo terceiro ano seguido, a seguradora oficial do desfile, fornecendo cobertura de responsabilidade civil, com proteção a possíveis danos a terceiros durante a programação oficial.

Patrocinadora desde 2018, a Amstel defende que é preciso manter a constância e afirma “que é essencial uma parceria duradoura para dialogar com a comunidade e ser reconhecida por ela de forma genuína”.

Sales afirma que, “apesar de o arco-íris estar um pouco mais desidratado neste ano, o orgulho não vai passar em branco”. “Continuam acontecendo coisas muito importantes, muito pulsantes, nos nossos movimentos sociais. Vamos ter, seguramente, uma parada imensa.”

Na lista de patrocinadores deste ano também estão nomes como Sephora, Philip Morris, Team Eventos, GSK, Accor, Sympla, Banco do Brasil, Roche, World Tennis/Fila, Hapvida e Shopping SP Market.

Revolta de Stonewall deu origem à comemoração

Junho foi escolhido como mês do orgulho em referência à revolta de Stonewall. Em 28 de junho de 1969, policiais fizeram uma batida no bar Stonewall Inn, em Nova York, frequentado pela comunidade LGBTQIA+. Um grupo resistiu e deu início a uma rebelião que durou cinco dias.

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