Acaba de ser publicado o The Future of Jobs Report 2025, do Fórum Econômico Mundial (WEF). O relatório mapeia riscos e transformações do mercado de trabalho global, com base em mais de mil entrevistas com representantes de empresas de 22 setores, em 55 países que somam 88% do PIB mundial. Juntas, essas empresas empregam mais de 14 milhões de pessoas.
Dentre as macrotendências identificadas, a transição verde se destaca como uma geradora líquida de empregos, mesmo diante do avanço da digitalização e da inteligência artificial generativa. O setor de energia, aliás, está entre os que mais adotam —ou pretendem adotar— essas novas tecnologias.
E o Brasil? Nosso país aparece em posição relativamente favorável. Há reconhecimento da necessidade de capacitar a força de trabalho (upskilling e reskilling) frente a essas transformações, que incluem mudanças demográficas e geopolíticas com impacto no comércio global. Mas reconhecer o problema, por si só, não gera empregos.
Mais do que um diagnóstico, é essencial perguntar: que empregos queremos gerar na transição energética? Quais políticas podem priorizar trabalho decente e oportunidades de qualidade? A resposta exige coordenação de políticas e ação.
Mas há também exemplos que ilustram os desafios —como Santa Catarina, estado líder na atividade carvoeira do país. Apesar de representar apenas 2% da geração de eletricidade nacional, o carvão conta com forte apoio político e segue sustentado por subsídios. O problema vai além da resistência à mudança, renovada a cada novo projeto no Congresso: falta uma estratégia clara de transição para trabalhadores e comunidades locais. Um paradoxo notável, considerando que o estado abriga a WEG, referência global em tecnologias para a transição energética. Uma transição justa exige articular esforços para requalificar essa força de trabalho e, assim, viabilizar o fim dos subsídios ao carvão.
Outros lugares mostram que alternativas são possíveis. Lembro-me de uma missão técnica aos Estados Unidos para conhecer a indústria eólica offshore. Em Virgínia Beach, onde há uma importante base naval, chamou-me a atenção o esforço para aproveitar o capital humano local —militares altamente qualificados prestes a se aposentar— em atividades futuras da cadeia eólica. O porto, antes voltado ao carvão, passava a operar como base logística da cadeia eólica. A qualificação de pessoas era tratada como ativo estratégico para atrair investimentos verdes, engajando faculdades comunitárias e centros de pesquisa.
Pensei imediatamente no Porto de Pecém, no Ceará —um dos candidatos a hub de hidrogênio de baixo carbono no Brasil. A analogia sugere que é possível planejar uma transição em que trabalhadores sejam parte da solução, e não vítimas do processo. Há novos esforços nessa direção: o Senai instalou um centro de capacitação em energias renováveis na Barra do Ceará, e o governo estadual lançou o programa H-TEC, com meta de qualificar 12 mil profissionais para o setor. São sementes promissoras de uma transição energética com inclusão.
O relatório do WEF mostra que setores verdes enfrentam gargalos de qualificação e que a requalificação da força de trabalho é prioridade para empresas que lideram essa transição. Esses achados reforçam um ponto crucial: transformar potencial em empregos exigirá foco nas pessoas, com estratégias de qualificação conectadas à realidade do mercado. A falta de coordenação entre essas esferas gera inércia institucional —justamente quando o Brasil poderia se destacar como destino atrativo de capital num cenário global conturbado.
Às vésperas da COP30, o Brasil se vê diante de uma confluência rara de desafios e oportunidades: sediar a principal conferência climática do mundo, reformar seu setor elétrico (com a MP 1300) e atrair investimentos em atividades intensivas em dados e energia —como os data centers. Como anfitriões, temos a chance —e o dever— de mostrar como uma transição justa começa pelas pessoas, com trabalho digno no centro da agenda.