Sob ameaça da guerra comercial global, os fabricantes de brinquedos estão em busca de consumidores à prova de tarifas. Colecionadores adultos com bolsos fundos podem ser a resposta.

Para atraí-los, as empresas estão se unindo a artistas para criar brinquedos exclusivos e caros, como bonecas Barbie de US$ 350 (R$ 1.920) e conjuntos Lego de US$ 8.000 (R$ 43 mil). Estes são geralmente apresentados como obras de arte destinadas à exposição, em vez de produtos produzidos em massa para brincar. Hasbro, Lego, Mattel e outras criaram sites dedicados para vender essas versões de alto padrão aos colecionadores.

As tarifas pairam sobre a indústria de brinquedos. Quase 80% dos brinquedos vendidos nos Estados Unidos são fabricados na China, que enfrenta a ameaça de tarifas mais altas por Donald Trump.

O presidente chegou a minimizar o efeito potencial das tarifas, dizendo que as crianças “terão duas bonecas em vez de 30”, acrescentando que essas duas bonecas “custarão alguns dólares a mais do que normalmente custariam”.

As vendas globais de brinquedos caíram 0,6% no ano passado, um segundo declínio anual consecutivo, de acordo com a empresa de pesquisa de mercado Circana. E isso foi antes das tarifas de Trump, que interlocutores do setor preveem que podem levar à escassez de produtos e preços mais altos durante a crucial temporada de festas.

Mas os brinquedos que atraem compradores adultos —ou “kidults”, como a Circana os descreve— têm sido um ponto positivo: as vendas de franquias como Barbie e Lego e colecionáveis como cards estão crescendo muito mais rápido do que a média do mercado.

“Isso realmente começou a acelerar durante a Covid, quando estávamos presos em casa”, disse Frédérique Tutt, analista da Circana. “Esse é um tipo diferente de consumidor.”

Os fabricantes de brinquedos sabem que colecionadores adultos dispostos a pagar, digamos, US$ 70 (R$ 384) por um carrinho Hot Wheels são menos sensíveis a mudanças nos preços causadas por tarifas.

“Eles estão tentando encontrar aqueles consumidores de nicho que estão preparados para pagar muito dinheiro por sua paixão”, disse Tutt.

Teddy Biaselli, produtor da Netflix em Los Angeles, é um fã de longa data de He-Man. Então, quando a Mattel lançou brinquedos projetados por Madsaki, um artista japonês conhecido por seus trabalhos em acrílico e tinta spray, Biaselli, 49, prontamente pagou US$ 400 (R$ 2.200) por um He-Man fluorescente montado em seu tigre blindado, o Gato Guerreiro.

“Eu queria uma obra de arte”, disse, acrescentando que estava procurando algo que representasse seu amor por esses personagens, mas de “uma maneira elevada”.

A peça de Madsaki, que tem cerca de meio metro de altura, fica em um pedestal na sala de estar dele. “Você quer que seja como uma peça de conversa”, disse. “As pessoas ficam tipo, ‘o que é isso?'”

A colaboração foi uma das primeiras para a fabricante de brinquedos depois que ela lançou um site em 2020 chamado Mattel Creations, voltado para colecionadores adultos. Chris Down, diretor de design da Mattel, chamou-o de “plataforma de experimentação” destinada a estimular a criatividade.

A empresa trabalhou com uma variedade de artistas, incluindo Virgil Abloh para He-Man; Daniel Arsham e Kenny Scharf para Hot Wheels; e Mark Ryden, que criou uma coleção de bonecas Barbie surreais que variavam de US$ 150 a US$ 500 (R$ 2.745) e esgotaram em segundos.

Um dos maiores sucessos tem sido o jogo de cartas Uno, que atraiu uma ampla gama de artistas, incluindo Gary Baseman, Shantell Martin e Takashi Murakami. “Cada carta é uma pequena tela”, disse Down.

“Não tenho vergonha de trabalhar em qualquer meio possível”, disse Baseman, que acrescentou que o projeto lhe deu a chance de projetar um boneco de pelúcia baseado em um mascote vintage da Mattel. “Foi minha maneira de homenagear o trabalho do passado e criar arte no futuro, mas entre arte comercial e belas artes”, disse.

A colaboração ajudou a marcar o 80º aniversário da Mattel em uma exposição na Galeria Corey Helford em Los Angeles, com interpretações dos brinquedos da Mattel por dezenas de artistas.

Michael Lacerte, 50, um assistente jurídico de Costa Mesa, Califórnia, participou da exposição e comprou um baralho de cartas Uno projetado e assinado por Baseman.

Para ele, foi uma maneira de reviver “preciosas memórias de infância crescendo com esses brinquedos”. “Você pode revisitá-los com uma estética diferente.”

A Hasbro também fez incursões em “colaborações” de pequenos lotes com artistas como Baseman, Peach Momoko e Jay Howell para seu jogo de cartas Magic the Gathering, criando um site chamado Secret Lair para vender as cartas aos colecionadores. Outro benefício para a empresa é que as cartas Magic são fabricadas principalmente nos Estados Unidos, evitando tarifas.

Por sua vez, a Lego se uniu a artistas como Ekow Nimako, que explora a identidade africana através da escultura. A arte de parede de Nimako construída com blocos Lego é vendida por até US$ 8.000. E a linha “Botanicals” da Lego, mais acessível, que inclui arranjos florais elaborados feitos com os blocos de brinquedo, provou ser popular entre compradores mais velhos, de acordo com a Circana.

“Um dos grandes impulsionadores para nós”, disse Julia Goldin, diretora de produtos e marketing da Lego, “foi expandir o portfólio para incluir mais produtos para adultos.”