/ Jun 27, 2025

Crédito de PIS/Cofins sobre publicidade digital: evolução jurisprudencial e desafios para as empresas – 20/06/2025 – Que imposto é esse

A digitalização de serviços e o crescimento de empresas que operam exclusivamente em plataformas virtuais levantaram novas questões sobre a tributação da receita. Uma das principais é se os gastos com publicidade digital podem ser considerados insumos para fins de apuração de créditos de PIS/Cofins no regime não cumulativo.

Essa dúvida tem impacto direto no caixa de empresas digitais, que frequentemente investem parcelas significativas de seu orçamento em marketing online como forma de alcançar clientes, já que não operam com lojas físicas, representantes ou canais presenciais. Na prática, essas despesas deixaram de ser apenas promocionais e passaram a ser estruturais para o funcionamento do negócio.

Do ponto de vista legal, o creditamento está previsto nos artigos 3º, II, das Leis nº 10.637/2002 (PIS) e nº 10.833/2003 (Cofins). Nesses dispositivos, é permitido o desconto de créditos sobre “bens e serviços utilizados como insumo” na prestação de serviços ou na produção de bens. O problema sempre foi saber o que exatamente é um “insumo” para cada tipo de atividade econômica.

Em 2018, o STJ, no julgamento do REsp nº 1.221.170/PR, pelo rito dos recursos repetitivos, estabeleceu uma tese: o conceito de insumo deve ser aferido a partir dos critérios de essencialidade e relevância. Isso quer dizer que, para gerar crédito, o gasto deve ser imprescindível à prestação do serviço ou especialmente relevante para sua execução, considerando as particularidades do negócio.

Com base nesse entendimento, a Receita Federal editou o Parecer Normativo Cosit nº 5/2018 e, posteriormente, a Instrução Normativa nº 2.121/2022, incorporando esses critérios à interpretação oficial. Contudo, mesmo após essa orientação, a aplicação prática do conceito ainda varia conforme o tipo de empresa, e a maioria das decisões do Carf e do TRF 3 segue resistindo ao enquadramento de despesas com marketing como insumos.

Realizamos uma pesquisa sobre o tema considerando o período entre 2012 e 2025. Foram encontrados 79 acórdãos do Carf e 69 decisões do TRF3. A maioria das decisões nega o crédito quando: (i) a atividade de marketing não está prevista no objeto social da empresa; (ii) quando a atividade preponderante é comercial ou (iii) os gastos não estão diretamente ligados à execução do serviço. Essa visão se aplica principalmente a empresas de varejo ou indústria, onde o marketing costuma ser visto como um custo de apoio à venda —e não como parte essencial da atividade prestada.

Esse cenário começou a mudar com o julgamento do caso da empresa NS2.com Internet S.A. (“Netshoes”) pelo Carf, em janeiro de 2025 (Acórdão nº 3201-012.196). A empresa, que atua exclusivamente online, teve reconhecido o direito ao creditamento de PIS/Cofins sobre gastos com publicidade digital. A decisão foi baseada no fato de que a empresa não possui estrutura física e depende integralmente da publicidade online para alcançar clientes. A ausência dessas despesas, portanto, comprometeria a viabilidade do próprio serviço prestado.

Sem dúvida, trata-se de um precedente importante, pois reconhece a singularidade das empresas digitais e aplica corretamente os critérios do STJ. Entretanto, a decisão não tem efeito vinculante e tampouco passou pela Câmara Superior de Recursos Fiscais, o que significa que outras turmas do Carf podem adotar interpretações distintas.

Antes desse julgamento recente, outro precedente favorável foi o caso Visa (Acórdão nº 3201-005.668), em que se reconheceu que os gastos com marketing eram parte essencial do modelo de negócios da empresa, por estarem diretamente ligados ao uso de sua marca por emissores e credenciadores de cartões. Nesse caso, um elemento relevante foi a constatação da atividade de publicidade no objeto social da empresa. Em ambos os casos, teve peso importante a capacidade de demonstrar que as despesas estavam diretamente ligadas à geração de receita.

Para empresas que operam exclusivamente no ambiente digital, esse tipo de gasto pode e deve ser analisado sob o prisma da função estrutural que a publicidade exerce. Não se trata apenas de divulgação institucional, mas de um verdadeiro canal operacional de acesso ao mercado. Esse argumento está presente no voto vencido do caso Netflix (Acórdão nº 3302-012.005), que foi julgado antes dos casos Visa e Netshoes.

A importância desse tema ganha contornos ainda mais expressivos no contexto da Reforma Tributária do consumo, instituída pela Emenda Constitucional 132/2023 e regulamentada pela Lei Complementar nº 214/2025. A partir de 2027, o PIS e a Cofins serão substituídos pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de caráter federal. A legislação assegura que os créditos não aproveitados até essa data poderão ser utilizados com a CBS ou mesmo ressarcidos, desde que escriturados corretamente.

Ou seja, as decisões que as empresas tomarem agora terão reflexo nos próximos anos. Adotar uma estratégia de creditamento exige mais do que tese jurídica: é indispensável reunir documentação adequada, como contratos, notas fiscais, comprovantes de campanhas digitais e relatórios de performance. Em casos mais sensíveis, a elaboração de laudos técnicos pode ser determinante para comprovar a essencialidade dos gastos.

O marketing digital tem se consolidado como fator essencial para a operação de empresas nativas da internet. A jurisprudência começa a reconhecer essa realidade, ainda que timidamente. Enquanto isso, cabe às empresas organizar suas operações fiscais e contábeis com critério, de olho na transição para a CBS e na eventual consolidação de uma interpretação mais alinhada com a economia digital.


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