O desempenho tantas vezes estelar do carioca João Fonseca nos últimos meses em diferentes etapas do circuito profissional de tênis trouxe ainda mais visibilidade para a marca esportiva que o patrocina, a suíça On.
Na próxima segunda (30), quando começa o torneio de Winbledon, a sensação brasileira deve ganhar ainda mais “buzz” para a marca. O campeonato de Londres é o mais tradicional e talvez o mais importante do mundo.
Surgida em 2010, a On é a “new kid” num negócio global de altíssima visibilidade, cujos players têm suas marcas e logotipos imediatamente reconhecidos nos cinco continentes. Mas, mesmo nesse segmento —em que Nike, Adidas, Puma, New Balance e Asics são protagonistas e a ascendente chinesa 361º assina vínculo com Nikola Jokic, uma das maiores estrelas do basquete norte-americano—, a On vem mudando alguns paradigmas do negócio.
Na Olimpíada do ano passado, por exemplo, a empresa suíça mostrou in loco a tecnologia LightSpray que utiliza em seus tênis: levou a Paris um braço mecânico que asperge, como spray, 1,5 km de filamento, suficiente para fabricar o cabedal (a parte que envolve o pé) de um pé do calçado. O processo dura apenas três minutos.
O show tecnológico tem impactos profundos, pois possibilita dispensar várias etapas na linha de produção e, segundo a fabricante, reduzir em 75% a emissão de CO2 em relação aos processos convencionais de produção dos tênis.
Além disso, o robô é móvel, e o equipamento visto em Paris pode agora itinerar por alguns grandes palcos do esporte, como a maratona de Nova York.
Foi com o Lightspray que a corredora queniana Hellen Obiri, medalhista olímpica e duas vezes campeã mundial dos 5.000 metros, tornou-se ano passado bicampeã da muito badalada maratona de Boston.
Perto disso, patrocinar João Fonseca e outros nomes vitoriosos do tênis —como a polonesa Iga Swiatek, atual número 8 do mundo e cinco vezes vencedora de torneios do Grand Slam (os mais importantes do circuito), ou o também jovem estadunidense Ben Shelton, 10º melhor jogador do ranking mundial, que proporcionou uma das partidas mais memoráveis do recente torneio de Roland Garros na derrota para Carlos Alcaraz—, é quase default, uma estratégia de marketing esperada.
Para Alexandre Martinez, diretor de marketing da On no Brasil, a atriz Zendaya, outra embaixadora da marca, encarna ainda mais as ambições da empresa.
“Zendaya é uma celebridade que se comunica muito com a geração Z. Ela ultrapassa o esporte, expande esse universo”, diz o executivo. “Não apenas estabelece uma conexão com o tênis, com o calçado, mas com o look completo. Em abril lançamos uma linha de tênis, a Cloudzone, e de vestuário autenticados por ela.”
A atriz protagonizou, entre outros, o filme “Rivais”, do italiano Luca Guadagnino, interpretando ali uma tenista que se envolve num triângulo amoroso com outros dois tenistas. E, com efeito, para promover “Rivais” a atriz fez uso do que hoje é conhecido como “method dressing”, em que os looks do personagem são usados largamente na “vida real”.
No Brasil, a Zendaya da vez é o ator Humberto Carrão, novo embaixador da marca, que na novela Vale Tudo vive Afonso Roitman, filho da megera-mor Odete Roitman. Recentemente, na trama, Afonso disputou uma prova de triatlo –desmaiando no fim. Para se preparar, o ator passou a correr regularmente. Resta saber como Carrão vai equilibrar a nova rotina esportiva com suas já famosas aparições em rodas de samba e ensaios de Carnaval.
ROGER FEDERER É ACIONISTA MINORITÁRIO
Iga, João Fonseca, Ben Shelton, Humberto Carrão e Zendaya formam parte do elenco de elite da On, mas ainda no segmento do tênis é difícil compará-los ao também suíço Roger Federer, um dos maiores nomes da história do esporte. Recentemente aposentado das quadras, ele trocou sua imagem por ações da companhia, tornando-se um acionista minoritário da marca –”Roger” também virou nome de modelo da linha de tênis da On.
Uma das mais recentes aparições de Roger, a pessoa, em nome da On, foi impactante. Há cerca de um mês, estrelou no intervalo da final estadunidense de Super Bowl, provavelmente o espaço mais disputado e caro da publicidade global, o lançamento de uma campanha mundial da marca.
Na peça, ele conversa com Elmo, personagem de “Vila Sésamo”, programa que teve papel importante na alfabetização de crianças dos Estados Unidos.
A campanha explicita a vulnerabilidade e as preocupações da marca em relação ao design de seu logotipo –e o quanto isso é importante nesse “game”: Federer tenta —sem sucesso— convencer Elmo de que as letras o e n, estampadas em seu tênis, não são Q e C, como parecem quando vistas na horizontal.
Com tudo isso, corrida de rua e corrida de aventura seguem como carros-chefes da On. A empresa difunde a narrativa de que o cofundador Olivier Bernhard, um ex-campeão mundial de triatlo, buscava criar um tênis “perfeito”, que oferecesse largas doses de conforto e desempenho –ou o que o mercado chama de responsividade: a capacidade de gerar energia a partir do impulso, a partir de cada contato da sola com o chão.
O nome “On”, a propósito, vem de “on cloud”, ou “correr sobre as nuvens”, que alude a conforto, às altitudes dos Alpes suíços tão familiares a Bernhard e, mais importante, alude à maciez da entressola do tênis.
Na divulgação dos resultados de 2024, a marca celebrou um aumento global de vendas da ordem de 30% em relação ao ano anterior e de 40% por meio dos canais de venda direta. Roupas e acessórios tiveram desempenho superior ao dos calçados, crescendo, respectivamente, 46,7% e 49,5% nesse período.
No fechamento do primeiro trimestre deste ano, o aumento global de vendas foi ainda maior, de 40%, quando comparado ao mesmo período do ano anterior, atingindo receita bruta de US$ 869 mi. Uma longa reportagem da emissora estadunidense CNBC, veiculada em maio, apontou a On como a grande novidade do setor esportivo.
A matéria indicou que 59% do faturamento da marca em 2024 veio dos Estados Unidos e que a On demorou 1/8 do tempo da Nike para atingir o mesmo patamar bilionário de vendas. Com tudo isso, a suíça participa de apenas 3% do mercado global segundo a empresa de dados financeiros FactSet.
No Brasil, Alexandre Martinez não divulga números, mas mantém a promessa de abertura de uma loja física, algo que já havia revelado a esta Folha no ano passado. Na loja, a marca deverá oferecer uma experiência de consumo bem melhor do que hoje proporcionam comércio eletrônico e redes varejistas multimarcas. Também seguem as “ativações” da marca na maratona de inverno de São Paulo, a SPCity, e em evento proprietário de setembro também em São Paulo, uma corrida indoor, de curta duração, feita por equipes.
Manter conexão com grupos amadores de corrida, algo que está também muito no radar da Nike e da brasileira Olympikus, é outro vetor. Mas talvez com bem mais ênfase do que essas concorrentes, a On investe fortemente na associação de corrida e prazer.
Isso é evidente em campanha global que também se serve do Elmo, de “Vila Sésamo”, e que aborda a ideia da corrida “leve”. “Como uma marca movida pela performance, nós queríamos desafiar a ideia de que o sucesso na corrida é definido apenas pela intensidade”, disse Alex Griffin, CMO global da On, no lançamento da campanha.
Pode parecer um contrassenso que uma empresa que tem entre suas fortalezas justamente a tecnologia –como exuberantemente visto em Paris com o LightSpray– abdique da associação clara desse ativo com intensidade/performance, uma ideia canônica no universo da corrida. Para Martinez, a “inovação está em vários lugares, como o design, e ela não favorece apenas o corredor dedicado, mas todos os corredores”.
A tecnologia também é justificativa para o preço mais elevado dos produtos da On. A maioria esmagadora dos modelos de entrada da On custa R$ 999 no Brasil, bem mais que alguns lançamentos da Olympikus, por exemplo. Martinez não indica nem prognostica qualquer mudança nesse posicionamento “premium” da empresa.
Por razões logísticas, os consumidores brasileiros também seguem excluídos do Cyclon, outro modelo emblemático da marca, nesse caso em função de sua sustentabilidade. As novas edições do Cyclon são produzidas a partir do material utilizado nas pregressas, o que reduz o uso de matérias-primas e, talvez mais importante, suprime dramaticamente o problema do descarte.
Mas, para que o ciclo efetivamente se complete, o comprador, agora chamado de assinante, tem necessariamente de enviar à On seu Cyclon antigo para receber o modelo atualizado.
A fidelização à marca neste caso vem de brinde.
RAIO-X | ON
- Ano de fundação: 2010, em Zurique, Suíça
- Fundadores: Olivier Bernhard, David Allemann e Caspar Coppetti
- Principais acionistas: Roger Federer (desde 2019), Stripes Group, Point Break Capital e Carlos Sicupira (família Lemann)
- Receita (2024): 2,3 bilhões de francos suíços (US$ 2,8 bilhões), alta de 29,4%
- Lucro líquido (2024): 242,3 milhões de francos suíços (US$ 302 milhões), alta de 204,5%
- Funcionários: 3.254 no mundo
- Principais concorrentes: Nike, Adidas, ASICS, Brooks, Hoka One One, New Balance, Lululemon e Patagonia.