O artigo masculino seguido do substantivo professor antes do nome Ruy Carlos Ostermann é a marca do jornalista de 90 anos que morreu nesta sexta-feira (27). No Rio Grande do Sul e na imprensa esportiva brasileira, “o professor” é um personagem único de muitas facetas.
Foi jornalista, deputado estadual, secretário da Educação e, claro, professor de filosofia, origem da alcunha que o definiu ao longo da carreira consagrada na crônica esportiva.
Durante mais de quatro décadas, assistir a partidas de futebol na televisão ou no estádio e ouvir a narração no rádio eram quase irrelevantes. É que o jogo no Rio Grande do Sul só terminava e podia ser realmente entendido após o comentário “do professor”, que atuou primeiro na rádio Guaíba e, desde os anos 1970, na Gaúcha.
Muito antes de os treinadores virarem as figuras centrais e midiáticas que são hoje, Ruy entendeu a importância daqueles personagens solitários que armam, comandam, erram, acertam e explicam derrotas e vitórias no futebol.
Ele se ateve como ninguém à análise de estratégias, não sem ignorar o imponderável e o protagonismo dos jogadores em campo. Como relata o jornalista Carlos Guimarães na biografia “Ruy Carlos Ostermann – Um Encontro com o Professor”, o cronista gaúcho inventou a planilha do comentarista.
“Antes, não se fazia uma relação dos dados e dos scouts [análise] dos jogos, o que ele criou no seu trabalho na Copa de 1966”, afirma Guimarães.
Os levantamentos passaram a embasar as análises de Ostermann. Sem gritar ou entrar em falsas polêmicas, marcou posições que muitas vezes iam contra o status quo na imprensa.
“Dunga levantou a taça Fifa e, se quisessem, teria levantado Bebeto e Romário com ela, como muitas vezes aconteceu no campo”, escreveu em coluna publicada no jornal Zero Hora após a conquista do tetracampeonato pela seleção brasileira nos EUA.
“É uma vitória do técnico Parreira e de seus jogadores”, opinou, quando muitos celebravam o título com o aposto “apesar” do treinador e do capitão daquela seleção.
Ao longo de sua carreira, o professor ganhou respeito e reverência dos técnicos ao analisar com classe e uma linguagem própria, muitas vezes rebuscada, o que via em campo. Foi escolhido por Luiz Felipe Scolari para escrever o livro de memórias do treinador na conquista da Copa de 2002.
Antes disso, na Copa de 1982, ganhou destaque nacional ao participar do programa Bate-Bola, comandado por Armando Nogueira na TV Globo. Convidado depois do Mundial para trabalhar na emissora líder do país preferiu seguir no Sul e se candidatar a deputado estadual.
No rádio, comandou por mais de três décadas o programa Sala de Redação, a versão gaúcha mais consagrada do que se convencionou chamar de mesa redonda.
Os debates sob a tutela de Ostermann começavam no futebol, derivavam para política, filosofia, sem deixar de passar pelas rivalidades pessoais dos participantes. Terminavam muitas vezes em brigas, que ele apartava ao mesmo tempo em que era também personagem daquelas rivalidades e discussões. Replicava no jornalismo um lema que trazia da época de professor e gestor público.
“Não se faz educação com homogeneidade. Se faz educação com divergências”.
O professor Ruy Carlos Ostermann deixa os filhos Cristiane, Fernanda e Felipe e cinco netos. Sua esposa, Nilce, com quem foi casado por 58 anos, morreu em 2021.
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