/ Jul 04, 2025

Crise orçamentária expõe fragilidade da Aneel – 03/07/2025 – Mauricio Portugal Ribeiro

O corte orçamentário superior a R$ 100 milhões imposto à Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) pela JEO (Junta de Execução Orçamentária) em junho de 2025 gerou uma situação crítica, comprometendo significativamente a capacidade operacional da agência reguladora.

Segundo nota oficial divulgada pela Aneel em 18 de junho, o orçamento inicialmente aprovado para o ano era de R$ 155,64 milhões, já inferior em 35% ao valor solicitado de R$ 239,76 milhões. Com o corte adicional em maio, o orçamento caiu para apenas R$ 117,01 milhões, menos da metade do montante inicialmente requisitado pela agência.

Entre os efeitos imediatos previstos estão a suspensão do atendimento humano da Ouvidoria Setorial, essencial para a mediação de conflitos e recepção de reclamações dos consumidores, além da redução drástica nas atividades de fiscalização técnica de usinas, linhas de transmissão e distribuidoras de energia. Adicionalmente, o horário de funcionamento da sede da Aneel em Brasília será reduzido a partir de julho, operando das 8h às 14h como medida para economizar gastos com energia e segurança.

A justificativa oficial dada pelo Ministério da Economia e pela JEO para os cortes aponta para a necessidade de ajustes orçamentários gerais, a fim de manter as metas fiscais e controlar o déficit público. Contudo, especialistas destacam que a medida revela um grave problema estrutural na independência financeira das agências reguladoras brasileiras.

As agências reguladoras precisam de independência para realizar sua função, pois atuam como juízes com a missão de garantir a adequada execução dos contratos de concessão e de decidir na esfera administrativa os conflitos entre usuários, concessionários e o poder concedente.

Quando foram criadas, na década de 1990, às agências reguladoras federais não lhes foi atribuída independência financeira devido a compromissos do país com órgãos multilaterais, como FMI e Banco Mundial, que exigiam o cumprimento de metas de superávit primário. A metodologia adotada para a aferição desse superávit exigia que todos os recursos arrecadados pelas agências federais fossem direcionados para a conta única do Tesouro Nacional, com o compromisso político de lhe serem devolvidos nos anos seguintes por meio da alocação orçamentária anual. No entanto, esse compromisso vem sendo descumprido desde o início dos anos 2000.

Ao contrário do modelo federal, algumas agências reguladoras estaduais foram criadas com independência financeira, mantendo contas separadas da conta única do Tesouro Estadual para os recursos provenientes de taxas e multas, como por exemplo a Agerba, do Estado da Bahia.

O estado de São Paulo, por sua vez, aprovou recentemente lei que estabelece um mecanismo pelo qual agências superavitárias mantêm sua independência financeira, enquanto as deficitárias submetem-se aos controles financeiros normais aplicáveis às demais autarquias.

Note-se que a Aneel, especificamente, é amplamente superavitária. Para 2025, a previsão é arrecadar cerca de R$ 1,3 bilhão em taxas e multas, valor significativamente superior ao orçamento solicitado inicialmente (R$ 239,76 milhões).

O Governo Federal poderia adotar uma reforma nas agências federais para seguir o exemplo bem-sucedido de algumas agências estaduais em relação à independência financeira. Contudo, há resistência do Tesouro Nacional, porque isso reduziria ainda mais a sua discricionariedade orçamentária, que, com dados de 2024, é de apenas 8% dos recursos orçamentários, em um orçamento total de R$ 3,7 trilhões, sendo que atualmente quase metade dos gastos discricionários está sob o controle do Congresso, por meio de mecanismos como as emendas impositivas.

Se o corte persistir, a Aneel alerta que a segurança energética nacional e a confiança dos investidores no setor elétrico poderão ser gravemente prejudicadas. Além disso, a capacidade técnica e operacional da agência corre sério risco de deterioração, afetando diretamente a qualidade e continuidade dos serviços prestados aos consumidores.

Essa situação revela a necessidade urgente de revisão do modelo de governança das agências reguladoras brasileiras, garantindo sua verdadeira autonomia financeira, fundamental para que possam exercer plenamente seu papel na regulação e fiscalização dos serviços públicos essenciais.


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