O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso, defendeu a limitação dos supersalários e informou que já conversou com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), afirmando que seria bom aprovar o projeto que trata do tema.
“Estou totalmente a favor de limitar o que se chama de indenizações para os juízes de uma maneira geral, que é o que a gente chama de extrateto, que está em discussão no Senado. Eu mesmo já falei com o presidente Alcolumbre que seria muito bom aprovar”, disse Barroso, ao C-Level Entrevista, novo videocast semanal da Folha.
O ministro defendeu, no entanto, que há extras no salário dos juízes que são justificáveis e necessários para não haver, segundo ele, desfalque na prestação do serviço jurisdicional. Barroso citou o adicional de férias que fica fora do teto do funcionalismo, que é pago aos juízes quando substituem as férias dos colegas. “Se ele vai trabalhar mais, ele tem direito a um extra.”
O presidente do STF disse que é a favor de o Congresso dizer quais verbas podem ultrapassar o teto de forma legítima, e acabar com penduricalhos indevidos. “Sou totalmente a favor dessa limitação [dos penduricalhos]”, disse.
Os chamados penduricalhos são os pagamentos adicionais, como auxílios e verbas indenizatórias, recebidos por servidores públicos, como juízes e membros do Ministério Público, além de seus salários regulares. Esses valores, por vezes, não são considerados parte da remuneração principal e podem não ser contabilizados no teto salarial constitucional do funcionalismo público, que é o salário de ministro do STF –hoje, em R$ 46.366,19.
O presidente do STF ressaltou que não há nenhuma decisão sua que tenha contribuído para o aumento dos penduricalhos. “A única decisão que eu tenho até hoje foi exatamente para cortar os penduricalhos para o futuro, porque para o passado eu não tenho competência para retirar, e só judicialmente”, disse o ministro ao ser perguntado sobre o fato de o Judiciário ter hoje mais privilégios do que em 2023, quando ele assumiu a presidência do STF.
Barroso argumentou que tomou uma decisão administrativa, com apoio do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), proibindo que os tribunais concedam os benefícios. Segundo ele, o aumento dos penduricalhos não “pode entrar na sua conta”.
“Fiz o que eu podia fazer, resolvi o problema para frente. Na minha gestão, não tem absolutamente nenhuma medida que tenha aumentado penduricalhos. A única medida minha que, em alguma medida, repercutiu sobre qualquer área de direitos e vantagens foi dizer, repetindo o que está na Constituição, que juízes e membros do Ministério Público têm igualdade de situação. Na minha conta não entra”, justificou.
Ele admitiu, no entanto, que, nos estados, é possível terem ocorrido abusos “aqui e ali”. ” O que eu fiz foi exigir que, como os benefícios não podem mais ser dados por decisão administrativa, só se o Poder Judiciário, atuando jurisdicionalmente com recurso até o Supremo, autorizar, é que é possível.”
O projeto dos supersalários já tramita no Congresso desde 2016, mas sofre resistência do funcionalismo público, sobretudo dos juízes e dos procuradores do Ministério Público. O texto lista quais tipos de pagamentos podem ficar de fora do teto.
A proposta foi aprovada pelo Senado em 2016 e só foi votada pela Câmara em 2021. Desde então, está parada à espera de que os senadores analisem as alterações feitas pelos deputados.
O assunto ganhou nova força em dezembro, quando o governo Lula tentou limitar as verbas indenizatórias recebidas por agentes públicos por meio de uma PEC (proposta de emenda à Constituição). Esse texto propunha que só poderiam ultrapassar o teto salarial do funcionalismo os benefícios autorizados expressamente em lei complementar de caráter nacional. Do contrário, seriam declarados ilegais.
O Congresso, contudo, alterou o projeto diante da pressão. Pela nova redação, as verbas existentes foram liberadas até a aprovação de lei ordinária sobre o tema. Esse projeto de lei está desde novembro de 2023 sob a relatoria do senador Eduardo Gomes (PL-TO), ex-líder do governo de Jair Bolsonaro (PL).
Na entrevista, o presidente do STF fez questão de ressaltar que o Judiciário, nos últimos 22 anos, se tornou mais relevante na vida brasileira. “Houve um aumento expressivo da judicialização no Brasil de uma maneira geral, tanto no Supremo como nas instâncias inferiores. O Judiciário passou a ser, portanto, um Poder mais relevante na vida brasileira, que desagrada mais gente. E que, portanto, virou alvo de mais críticas e insatisfações”, disse.
Para ele, algumas das críticas são injustas, mas ponderou que o Judiciário precisa melhorar sua atuação. “Algumas são justas e a gente precisa consertar. E outras são injustas e vêm como consequência de uma certa má vontade dos interesses que são contrariados”, afirmou.
Barroso disse que não se impressiona muito com pesquisas de opinião pública que mostram críticas ao Judiciário. “A importância de um tribunal não pode ser aferida mesmo em pesquisas de opinião pública. A gente interpreta a Constituição e com frequência desagrada muita gente. Quando eu mesmo determinei a desintrusão de uma terra indígena que tinha sido invadida, tinha 5.000 invasores e 1.000 indígenas. Se fizerem uma pesquisa na região, vou perder de 5 a 1 em termos de prestígio, mas a vida não pode ser aferida assim”.