/ Jul 09, 2025

TV 3.0 deve dar fôlego a publicidades na TV – 09/07/2025 – Mercado

Imagine a partida de futebol do seu time do coração transmitida pela TV. Você não quer ouvir o narrador –usa o controle remoto para silenciar a narração e acompanhar, do sofá da sua casa, o som do estádio, com os gritos dos técnicos, dos jogadores e a emoção das arquibancadas. Uma coluna com informações em tempo real, à direita da tela, identifica os principais lances do jogo, que podem ser reprisados se você precisar se ausentar da sala.

Em outro canal, está passando o seu programa de culinária favorito. Você gostou da receita, mas não tem todos os ingredientes. Com o controle remoto, aproveita o link na tela da TV para comprar o que precisa. E ainda consulta o preço da panela que a apresentadora está usando: com o cupom oferecido pelo programa, você decide comprar o utensílio também.

Estas são algumas das funcionalidades que estarão disponíveis aos telespectadores a partir da implantação da TV 3.0, a evolução da televisão digital no Brasil. A expectativa é que um decreto com as especificações e regras que vão nortear a nova tecnologia seja assinado até o fim deste mês pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e as primeiras transmissões sejam realizadas durante a próxima Copa do Mundo, em junho de 2026.

A implantação da TV 3.0 pelas emissoras de TV no Brasil não é obrigatória, como aconteceu com a migração da TV analógica para a digital, em 2007. Mas a interatividade proporcionada pela nova tecnologia, que vai trazer toda a navegação do celular para a tela da TV, está sendo esperada com ansiedade pelas redes de televisão. A partir da novidade, as emissoras esperam estancar a perda de receita publicitária, ano após ano, para a internet.

Em 2024, pela primeira vez, o meio internet ultrapassou o meio TV em verba publicitária e se tornou líder nos investimentos em propaganda no país, diz Alexandre Peralta, sócio da agência de publicidade Peralta Creatives.

De acordo com dados do Cenp (Fórum de Autorregulamentação do Mercado Publicitário), no ano passado, a TV aberta obteve 36,5% do bolo publicitário nacional, que somou R$ 26,3 bilhões –enquanto a fatia da internet foi de 40%. Para dar ideia da mudança de paradigma, em 2017, a participação da TV aberta na publicidade brasileira era de 58,7%, contra 14,8% da internet.

“Tudo aquilo que levou as pessoas a trocarem a TV pelo celular agora vai estar disponível também na TV 3.0”, diz Peralta. Para o publicitário, a nova tecnologia vai dar ao anunciante um nível de detalhamento do público que até agora foi primazia da internet. “Com o uso de inteligência artificial, será possível identificar quem está assistindo TV e entregar um conteúdo relacionado –esporte, culinária ou documentário, por exemplo”, diz. “Antes em declínio, a TV aberta passa a ser uma mídia mais estratégica.”

Para o presidente da Abert (Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão), Flávio Lara Resende, o maior trunfo da TV 3.0 é levar interatividade ao telespectador sem depender da internet. “Os novos aparelhos de TV ou os conversores que serão plugados aos atuais televisores estarão equipados com a antena ‘Mimo’, semelhante às dos aparelhos celulares. É essa antena que vai garantir a conexão e a possibilidade de interagir com a programação”, afirma.

Segundo Resende, trata-se de uma tecnologia que interessa demais às emissoras abertas, que “sofreram uma concorrência desleal” com as grandes plataformas de internet, como Google (YouTube), Meta (Facebook, Instagram) e TikTok. “Elas não produzem conteúdo. Quem produz somos nós: quase 70% do conteúdo consumido no Brasil vêm da TV aberta. Elas veiculam nossos conteúdos e vendem publicidade atrelada a eles. Não pagam pelo conteúdo, não pagam impostos e não usam agências de publicidade”, diz.

Com a possibilidade de o público interagir diretamente com o conteúdo da TV aberta, existe uma gama de oportunidades para os anunciantes, diz Raymundo Barros, principal executivo de tecnologia (CTO) da Rede Globo e presidente do Fórum SBTVD (Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre).

“Desde os primórdios da TV, em 1950, até hoje, o modelo comercial continua o mesmo”, afirma. “Mas com a TV 3.0, o público vai comprar diretamente produtos que viu no anúncio ou no programa, participar de votações ou enquetes com muito mais engajamento, porque está exposto a uma oferta contextualizada, em meio ao consumo de conteúdo”, diz.

Segundo Barros, é uma maneira mais eficiente de atingir o consumidor do que em portais da internet. Durante testes para a instalação da TV 3.0, a Globo mensurou a audiência, de forma censitária, em um grupo de 2 milhões de aparelhos que transmitiam a programação aberta, via antena ou celular (neste caso, via Globoplay).

“De todos os aparelhos conectados em que oferecemos uma experiência de interatividade –’Vote no craque do jogo’–, 16% interagiram. Na internet é metade disso, fica em um dígito”, afirma, referindo-se a portais do grupo, como G1 e GShow.

Outra inovação importante para o mercado publicitário é a regionalização das inserções. “A TV 3.0 vai permitir o anúncio do pequeno comerciante, que ficou de fora da TV aberta”, diz Barros. Em uma cidade como São Paulo, por exemplo, é possível fazer propaganda do negócio da zona oeste ou da zona norte, ou mesmo de bairros de cada uma dessas regiões.

“Isso significa que o dono do açougue, do mercadinho, da padaria não precisa ir no TikTok ou ao Instagram, procurar o nanoinfluencer para divulgar sua marca. Ele pode pagar um anúncio na Globo que vai ao ar apenas no bairro dele”, afirma.

TELESPECTADOR VAI ACESSAR SERVIÇOS DO GOVERNO, DIZ MINISTRO

As discussões para instalação da TV digital interativa no Brasil já acontecem há pelo menos cinco anos. Em 2023, um decreto do governo Lula estabeleceu as diretrizes para a nova geração tecnológica da TV aberta no país, a TV 3.0, chamada de Digital Television + (DTV+).

Essas diretrizes passaram a ser discutidas no Fórum do Sistema Brasileiro de TV Digital, que reúne emissoras de TV, fabricantes de equipamentos de recepção e transmissão, indústria de software, entidades de ensino e pesquisa e do governo federal, como o Ministério das Comunicações e a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações). Até que, no final do ano passado, ficou definida a arquitetura tecnológica que vai suportar a nova TV aberta brasileira, o sistema ATSC 3.0.

A nova tecnologia, que promete qualidade de imagem de altíssima definição (8K) e som de cinema, vai ser transmitida pelo ar. Os fabricantes de aparelhos também aguardam o novo decreto presidencial para saber das especificações. Não será preciso comprar um novo televisor para ter acesso à TV 3.0: é possível manter o aparelho atual e ter melhor qualidade de imagem (4K) e som. Mas com um conversor, é possível usufruir de todo o potencial da TV 3.0, como os recursos de interatividade. Mesmo as atuais smart TVs vão precisar de conversor para acessarem esses recursos, via controle remoto.

O preço do conversor não está definido, mas há quem estime entre R$ 400 e R$ 500.

“Uma vez que a migração de tecnologia não é obrigatória, as emissoras de TV são obrigadas a manter a programação aberta convencional no ar”, disse à Folha o ministro das Comunicações, Frederico de Siqueira Filho.

Para ele, um dos diferenciais será a possibilidade de acessar serviços públicos, como o aplicativo Gov.Br, por meio da tela da TV. “Será possível acessar o eSocial, os Detrans e demais serviços do governo digital. Tudo por meio da TV aberta, sem custo para o cidadão”, afirma Siqueira Filho, ressaltando que o Brasil será o primeiro país do hemisfério sul a adotar a TV digital interativa.

Quanto à publicidade, diz o ministro, mesmo sem o decreto presidencial assinado, é possível garantir que não haverá interrupção da transmissão para veiculação de propaganda –uma das principais queixas de usuários de vídeos abertos no YouTube.

Os dados de navegação dos consumidores, por sua vez, segundo o ministro, estarão protegidos pela LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), que estabelece regras para a coleta, uso, armazenamento e compartilhamento de dados pessoais, tanto no meio físico quanto no digital.

Para o anunciante, será possível fazer uma campanha muito mais direcionada, graças ao uso de inteligência artificial, diz Fabia Juliasz, conselheira da Abap, associação de agências de publicidade (que agora se apresenta como Espaço de Articulação Coletiva do Ecossistema Publicitário).

“A mudança mais revolucionária está justamente na combinação do alto alcance somado à capacidade de personalização e interação em tempo real”, afirma. “Não é mais um único anúncio para milhões de pessoas: teoricamente, vai ser possível entregar mensagens publicitárias diferentes para lares diferentes, ou até mesmo para indivíduos dentro do mesmo lar.”

João Oliver, professor de mídia do curso de Comunicação e Publicidade da ESPM, concorda. “A TV vai se tornar um hub de conteúdos para o público”, diz. “É como se a tela da sala se tornasse o celular”. O especialista, porém, tem dúvidas se a verba publicitária entrará para o meio TV aberta: com a TV 3.0, o meio pode evoluir para outra mídia, mais específica.

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