Os investimentos das empresas brasileiras em novas máquinas e equipamentos registraram forte aumento nos últimos 12 meses, na esteira da recuperação nas vendas de bens industriais para consumidores a partir de meados de 2024.
Mas, assim como grande parte dos produtos saídos de fábricas comercializados no Brasil tem vindo do exterior, foi a compra de máquinas e equipamentos importados que puxou os investimentos das empresas.
No acumulado em 12 meses até o final do primeiro trimestre, o consumo de maquinário novo pelas indústrias teve alta de 13,2%. Como comparação, o IBC-Br do Banco Central, considerado uma prévia do PIB, mostrou a economia crescendo 4,1% em 12 meses até fevereiro.
O consumo de máquinas e equipamentos nacionais, porém, aumentou só 4,9%. Mas os importados saltaram 30%, segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
Há anos as empresas que fabricam maquinário no Brasil perdem espaço para empresas estrangeiras, sobretudo da China. Há uma década, equipamentos importados respondiam por 30% do mercado; hoje, são 48,3%, segundo a Abimaq, que reúne os fabricantes do setor.
No caso dos bens industriais finais consumidos pelos brasileiros, a tendência é a mesma. Enquanto a demanda por esses artigos nos últimos 12 meses teve alta acumulada de 6,1%, a produção industrial nacional dedicada ao mercado doméstico cresceu 2,6%. A diferença foi coberta por importados.
A queda na participação da indústria de máquinas e equipamentos e de bens de consumo nacionais no Brasil deve-se à falta de competitividade —tanto do maquinário quanto de produtos acabados— em relação ao que vem de outros países.
A guerra comercial deflagrada pelo presidente dos EUA, Donald Trump, contra a China vai acelerar isso, pois o gigante asiático adotará políticas agressivas para desovar sua produção em outros mercados, em especial os maiores, como o brasileiro. No primeiro trimestre, a China respondeu por 34,1% das importações de máquinas do Brasil.
No mesmo período, a indústria nacional cresceu 15,2% e obteve receitas líquidas de R$ 24 bilhões em março. Com a recente recuperação dos negócios e após três anos de resultados ruins, o setor procura ampliar investimentos para tentar enfrentar a concorrência externa.
“Mas é difícil enxergar uma reversão na tendência de aumento da participação dos importados. O custo de capital [juros altos] e a tributação no Brasil tornam as empresas pouco competitivas em relação às estrangeiras”, afirma Cristina Zanella, diretora de Competitividade da Abimaq.
O custo de capital é alto no Brasil principalmente porque o governo é deficitário e tem dívida crescente, o que o torna o maior tomador de empréstimos no país, forçando as taxas de juros para cima.
O Brasil tem cerca de 9.000 fabricantes de máquinas e equipamentos, mas 70% são micro ou pequenos. Ao contrário de companhias maiores, essas empresas não têm acesso a financiamento a juros competitivos, o que limita sua capacidade de expansão.
Os grandes e médios fabricantes planejam aumentar investimentos neste ano em cerca de 7,8% em relação a 2024 —mas as pequenas aplicarão 5,3% menos. Dos aportes previstos pelo setor, 31,8% serão para ampliação da capacidade, 38,2% para tecnologia e 22% para atualização de máquinas.
A recuperação em curso no setor, porém, está ameaçada. Para o economista-chefe da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Igor Rocha, os efeitos da política de juros altos do Banco Central serão sentidos com mais força a partir de agora. Após crescimento de 3,6% da manufatura em 2024, a expectativa é de 1,1% positivo neste ano.
“No ano passado, houve aumento importante nas vendas de produtos da linha branca [geladeiras, fogões] e de bens de capital [máquinas e equipamentos], o que não deve se repetir.”
Rocha argumenta que há anos o Brasil perde espaço nos segmentos de bens industriais de média e alta tecnologia, assim como no de máquinas e equipamentos, enquanto ampliou e sofisticou a produção de produtos primários, como commodities agrícolas, minerais e petróleo.
“O agronegócio tem vantagens de financiamento que a indústria não tem, além de vivermos sob um sistema tributário paleolítico e um custo de capital elevadíssimo. Não há atualização de maquinário, daí a perda de competitividade”, diz.
Para Leonardo Mello de Carvalho, técnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea, o crescimento real da renda do trabalho (7,1% acima da inflação em 2024, segundo a FGV Social) sustentou o aumento do consumo de bens industriais e de máquinas e equipamentos a partir da metade do ano passado.
“Mas essa recuperação acabou revelando um quadro industrial mais dependente das importações do que em outras ocasiões. Isso não seria um problema porque, ao importar máquinas, incorporamos muitas vezes tecnologias mais avançadas. Por outro lado, o país não quer ver sua indústria não suprir boa parte dos bens que consome”, afirma.
Nesse contexto, Carvalho diz que o cenário à frente é “preocupante”, pois se espera uma desaceleração da economia. Isso pode levar ao recuo nas intenções de investimento e deixar o país mais dependente das importações, tanto de produtos acabados quanto de maquinário —sobretudo com a China agora ansiosa por mais espaço ao redor do mundo.