Fabio Giambiagi publicou no final do ano passado o livro “A Vingança de Tocqueville”. Trata-se de uma história da economia e da economia política brasileira desde a redemocratização. Após 40 anos, é bem difícil culparmos o imperialismo ou o capitalismo pelos nossos problemas.
O livro se inicia argumentando que não é possível continuarmos sequestrados pela estratégia de substituição de importações e pela ideia de desenvolvimento para dentro. Se ela funcionou em algum momento, foi em circunstâncias muito diversas. Não funciona mais.
No livro, Fabio apresenta todos os avanços que tivemos nas últimas quatro décadas. Houve o esforço da estabilização com o Plano Real e a superação da restrição externa, com a forte acumulação de reservas nos dois primeiros mandatos do presidente Lula. Tivemos também algum avanço na área social.
Não conseguimos construir um equilíbrio macroeconômico com juros civilizados sem pressão inflacionária permanente. Tudo sugere que Lula não conseguirá avançar na queda dos juros reais no seu terceiro mandato. Será tarefa para o próximo governo, seja o quarto mandato de Lula, seja da oposição ao atual governo.
Uma dificuldade de nossa economia política é o forte “curto-prazismo” induzido por ela. Nos últimos 40 anos, tivemos muito pouco tempo para discutirmos a baixa taxa de crescimento da produtividade.
Fabio, um especialista em contas públicas, documenta que, por um lado, houve forte aumento da carga tributária, e, por outro, que o aumento não foi para financiar a máquina pública. Não houve grandes aumentos do gasto com funcionalismo público. O grande aumento de carga tributária foi integralmente para financiar as diversas rubricas do gasto social.
O livro se beneficia da grande erudição de Fabio. Um compilador quase que compulsivo de citações e de casos da política. Com verve e propriedade, ele consegue assentar sua descrição de nossa história econômica em inúmeros episódios da política e da literatura recente.
Aparece no livro um ponto de vista de Fabio menos conhecido. Ele nasceu no Brasil, de pais argentinos que estavam de passagem por aqui. Viveu na Argentina até a adolescência, quando a família emigrou para cá, nos anos 1970, fugindo da ditadura argentina. Fabio consegue olhar para o Brasil como estrangeiro e como brasileiro. O contraponto com nosso vizinho ao sul é permanente.
O livro repassa a disputa entre tucanos e petistas. O saldo do período em que os dois partidos se alternaram no poder é moderadamente positivo e deveria servir de ponto de partida para ganhos futuros. Uma oportunidade foi perdida, segundo Fabio, com o terceiro mandato de Lula. Um governo que poderia expressar uma frente ampla acabou, na economia, expressando a hegemonia petista. Como documentado no quinto capítulo, o déficit público, após grande elevação em 2015, se reduz até 2022, quando volta a se elevar.
A conclusão no último capítulo, que tem o mesmo título do livro, é melancólica. Um país que não anda, amarrado em um equilíbrio ruim com juros elevados e pressão inflacionária permanente, que só toca o curto prazo e no qual a demografia piora rapidamente. A agenda social puramente compensatória, em que o país é incapaz de pensar o longo prazo, nos deixa amarrado na armadilha da renda média com a possibilidade de crises fiscais recorrentes. Será que a próxima será na virada de 2026 para 2027?