/ May 07, 2025

Estado é um dos negócios mais rentáveis das elites – 05/05/2025 – Michael França

Os filhos dos amigos viram estagiários, os estagiários viram assessores, os assessores viram secretários. E, no final, todos se orgulham de suas difíceis trajetórias de superação. No setor público e fora dele, grande parte dos cargos são preenchidos pelas elites que se autorreproduzem com espantosa eficiência.

A linha entre o público e o privado é turva, quando não inexistente. Cargos públicos são distribuídos como favores, orçamentos são tratados como extensões de interesses pessoais e alianças políticas funcionam menos como projetos de Estado e mais como pactos de conveniência para a manutenção de nossa aristocracia.

O patrimonialismo brasileiro é um sistema adaptativo que sobreviveu a monarquias, repúblicas, ditaduras e redemocratizações. Camufla-se sob novas vestimentas, mas sua essência permanece intacta, com o Estado sendo utilizado como uma extensão dos interesses privados. Uma aceitação tácita de que certas famílias, partidos ou setores econômicos têm direito adquirido sobre recursos públicos.

Esse arranjo gera uma economia política peculiar. As reformas são anunciadas com certa pompa, mas desenhadas para preservar as castas. Programas de inclusão social coexistem com regimes tributários regressivos. Políticas públicas são utilizadas para beneficiar os insiders e deixar os outsiders na fila de espera.

Por sua vez, os partidos políticos, que deveriam funcionar como instrumentos de representação coletiva, tornaram-se negócios privados com interesses próprios. A proliferação de legendas, frequentemente desprovidas de identidade programática, é menos uma expressão de pluralismo democrático e mais uma estratégia de captura dos recursos públicos.

A lógica empresarial que rege muitos partidos é a de maximizar seus lucros. Como qualquer negócio, busca-se a rentabilidade, seja através de alianças oportunistas, seja pela ocupação de cargos públicos. Em muitos casos, as campanhas eleitorais tornaram-se meros investimentos, com expectativa de retorno garantido por meio de emendas parlamentares, nomeações estratégicas e contratos estatais.

O preço desse arranjo é alto. Ao reduzir a política a uma operação comercial, esvazia-se o debate público, deteriora-se a confiança nas instituições e corrompe-se a própria ideia de representação. O eleitor, transformado em consumidor cativo de promessas vazias, é chamado a escolher entre marcas quase indistinguíveis, mais preocupadas em defender seus interesses internos do que em oferecer visões de futuro ao país.

As reformas eleitorais, invariavelmente vendidas como avanços democráticos, apenas redesenham o modelo de negócios. Entretanto, essas nossas ineficiências sobrevivem não porque são impostas. Sobrevivem porque são aceitas, de forma reiterada, por aqueles mesmos que se dizem vítimas.

E, enquanto essa aceitação persistir, o Brasil seguirá administrando modernizações de superfície em estruturas de fundo arcaico, reformando fachadas enquanto preserva os velhos salões das aristocracias.

Esta coluna representa uma continuação da série que tenho feito sobre os desafios das elites. O texto é uma homenagem à música “No agreement”, de Fela Kuti.


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