Em meio ao apoio declarado do governo Lula à PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que prevê o fim da escala de trabalho 6×1, entidades da indústria e comércio vêm reforçando os argumentos contrários à implementação da jornada reduzida, e prometem forte articulação contrária à aprovação da mudança no Congresso.
A proposta da deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) prevê mudar a Constituição para limitar a jornada legal de trabalho a 36 horas semanais, com não mais do que 8 horas diárias, o que beneficiaria diretamente 37% dos trabalhadores, segundo levantamento da Unicamp.
Durante as celebrações do 1º de Maio, Dia do Trabalho, o presidente Lula acenou com apoio ao projeto, e no último domingo (5) a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, afirmou em redes sociais que a redução da jornada será uma das prioridades do governo no Congresso.
Na avaliação de associações da indústria e do comércio, a implementação da proposta é quase inviável pelo forte impacto negativo sobre a produtividade e inflação. Uma das principais críticas é que a PEC ignora as particularidades de cada setor e segmento, e que a possibilidade de uma jornada reduzida de trabalho deve ser discutida somente no âmbito das convenções coletivas.
“A proposta torna os pobres mais pobres, porque o custo de produtos e serviços vai subir”, afirma Flávio Roscoe, presidente da Fiemg (Federação das Indústrias de Minas Gerais). “A implementação do limite de jornada em um momento como o atual é um abraço à pobreza”.
Na avaliação da federação, a redução da jornada de trabalho eleva o custo do trabalho em um momento em que o desemprego está no menor patamar da história —no primeiro trimestre, a taxa de desocupação foi de 7%, a menor para o período desde 2012, quando começa a série histórica do IBGE. A consequência, diz a entidade, seria mais inflação.
Segundo a FecomercioSP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo), o custo do trabalho aumentaria em quase um terço se a PEC fosse aprovada.
Thiago Carvalho, assessor econômico da federação, diz que mudar a Constituição não é a forma correta de se realizar a discussão. “A redução de jornada já é possível através de convenções coletivas, cujas negociações permitem a avaliação do que é adequado a cada setor”, diz.
O assessor econômico afirma que um estudo feito pelo economista José Pastore, especialista em mercado de trabalho, mostra que a implementação da proposta encareceria em 22% o custo da mão de obra para as empresas. “Temos preocupação principalmente com os pequenos negócios. Como absorverão os custos? Os efeitos da PEC seriam contrários aos pretendidos, com redução de contratações e aceleração da automação em algumas atividades.”
Os defensores da PEC apontam que a adoção da jornada de trabalho reduzida elevou a produtividade em outros países. A semana de quatro dias inclusive já foi testada no Brasil —em 2024, 19 empresas utilizaram a escala, em projeto-piloto que mostrou bons resultados.
Por outro lado, as entidades lembram que a PEC não leva em conta as peculiaridades das diferentes empresas, já que há áreas onde a escala reduzida só pode ser aplicada com contratação de mais profissionais.
Para Flávio Unes, diretor titular do Departamento Jurídico da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), é por isso que a negociação sobre o número de dias trabalhados deve ser feita de forma direta entre empregadores e trabalhadores nas negociações coletivas.
“Somente a negociação direta é capaz de contemplar as especificidades de cada setor, considerando fatores como o contexto local, porte das empresas e demanda dos trabalhadores, e garantir a sustentabilidade econômica dos segmentos produtivos”, afirmou.
É a mesma avaliação da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), que afirma ser necessário o fortalecimento da negociação coletiva.
“[A negociação coletiva] é um importante instrumento de ajuste entre os atores sociais, trabalhadores e empregadores, inclusive para fixação da jornada de trabalho, na medida que leva em consideração as peculiaridades e necessidades regionais dos diferentes setores da economia, inclusive do comércio de bens, serviços e turismo.”