Com o avanço das tecnologias emergentes, em especial a Inteligência Artificial (IA), surgiu a necessidade de regular o uso dessas ferramentas para equilibrar inovação e segurança, garantindo uma experiência positiva aos usuários. É claro que o tema envolve muitas questões, enquanto alguns temem censura à liberdade, outros veem a medida como um avanço positivo.
No Brasil, as tentativas de regulamentação iniciaram-se em 2021 e contaram com muitas reviravoltas até a criação do Projeto de Lei (PL) nº. 2.338/2023, criado para discutir a norma no país. Após novos desdobramentos, no final do último ano, o PL teve seu texto final aprovado pelo Senado Federal e segue para revisão na Câmara dos Deputados.
A versão aprovada estabelece princípios como transparência, segurança e responsabilidade, além de classificar os sistemas de IA conforme seu nível de risco. O tema ganha relevância não só pelo contexto atual, mas também pela necessidade de não passar a ideia de que a internet é “terra de ninguém”. Há uma preocupação de colocar limites dentro desse ambiente que pode, sim, ser usado tanto para o bem quanto para o mal.
Quando falamos especificamente do Brasil, a população, de maneira geral, não é letrada para o assunto, o que gera o desafio de educar a sociedade para lidar melhor com a tecnologia e evitar golpes — já que muitos absorvem conteúdos da internet como verdade absoluta sem reconhecer o uso de IA.
Sem a regulação, existem diversos riscos envolvidos, como golpes, danos à reputação, questões de segurança, privacidade, tomada de decisões com base em informações erradas e até vieses nos sistemas. Não à toa, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou uma resolução com regras para o uso da IA durante as eleições de 2024, vedando o uso de deep fakes — técnica que manipula fotos, vídeos e áudios para a criação de conteúdos falsos — além de medidas para evitar que os eleitores sejam enganados por materiais produzidos pela ferramenta.
Ao mesmo tempo, restrições excessivas podem sufocar a inovação e tornar o processo limitador. Por outro lado, se for totalmente liberado o uso da IA, abre-se espaço para os usos indevidos, que podem causar grandes impactos. O desafio está em encontrar e estabelecer o meio termo entre controle e liberdade para garantir um uso seguro e ético do recurso.
Outro ponto de atenção é o papel das big techs que desempenham um papel central nesse debate, influenciando diretamente políticas públicas e regulações. Para isso, essas companhias precisam estar alinhadas e ter responsabilidade social corporativa, assumindo a responsabilidade de mitigar riscos e coibir o uso indevido da IA, interceptar conteúdos já identificados como deep fake ou IAs com comportamentos nocivos.
Por fim, não acredito que devemos encarar essas mudanças como uma limitação, já que toda alteração cria um ambiente de abundância e restrição. Ao longo da história, diversos momentos significativos ocorreram em nossa sociedade e, embora à primeira vista parecesse algo limitador e restritivo, empresas e pessoas souberam enxergar novas possibilidades. Este é, sem dúvidas, o momento de encararmos essa nova realidade, observando quais novas oportunidades serão criadas.
O editor, Michael França, pede para que cada participante do espaço “Políticas e Justiça” da Folha de S. Paulo sugira uma música aos leitores. Nesse texto, a escolhida por Caroline Capitani foi “Asas para voar”, de Alexandre Brunetto.